As legislativas de março em Itália deram a vitória ao Movimento 5 Estrelas, seguido da Liga Norte. Na sequência deste terramoto eleitoral, os dois partidos aliaram-se para formar governo, com o líder xenófobo Matteo Salvini a assumir a pasta do Interior.
“Acabou a festa para os imigrantes clandestinos. Preparem-se para fazer as malas”, afirmou Salvini ao anunciar a sua aliança com o chefe de governo húngaro Viktor Orbán, figura importante do PPE, para “mudar as regras da União Europeia”.
Os meses de verão foram marcados pela recusa de Salvini em receber os barcos com migrantes resgatados na costa italiana e maltesa. Num dos casos, os mais de 600 migrantes tiveram de desembarcar em Valencia, após o primeiro-ministro espanhol Pedro Sánchez ter desbloqueado o impasse. Noutro caso, mais de 200 migrantes ficaram retidos durante vários dias a bordo do barco em pleno Mediterrâneo por falta de autorização para aportar em Itália. Em agosto, um destes navios de resgate operados por ONG ficou dez dias num porto italiano com 169 migrantes a bordo.
Outro dos alvos do governo italiano foi o autarca de Riace, Domenico Lucano, premiado internacionalmente pela sua ação na integração de refugiados e migrantes que deram nova vida ao seu município envelhecido e desertificado. Lucano foi preso e acusado de favorecimento à imigração clandestina, o que motivou protestos e manifestações de solidariedade.
Entretanto, a cimeira europeia para tratar do tema da imigração saldou-se por uma vitória dos governos xenófobos, ao aprovar a proposta de criar campos de detenção nos países magrebinos. “Uma resposta cínica e hipócrita”, apontou Marisa Matias.
Salvini reuniu em seguida com os ministros do Interior da Áustria e Alemanha sobre a alteração das regras europeias de asilo. E cantou vitória no final por ter conseguido transformar as "propostas italianas em europeias”. Itália e Áustria foram justamente os países visados no primeiro discurso da alta-comissária da ONU para os Direitos Humanos, Michelle Bachelet, que anunciou uma investigação aos ataques a migrantes.
Em novembro, Salvini fez aprovar o seu decreto para restringir a concessão de asilo por razões humanitárias e facilitar as expulsões e migrantes. Milhares de pessoas voltaram a sair à rua em dezembro para protestar contra este decreto.
A aliança entre a Itália e os países do Grupo de Visegrado para pressionar a mudança nas leis europeias de acolhimento aproveitou a fragilidade do governo de Angela Merkel, a enfrentar um ciclo eleitoral marcado pela emergência do partido xenófobo AfD.
Na Hungria, onde a percentagem de migrantes na população é residual, Viktor Orbán prosseguiu a sua política xenófoba, criminalizando os sem-abrigo e as organizações que apoiam migrantes. Em seguida, abandonou o pacto da ONU sobre migração, no que foi seguido pela Áustria, e foi alvo de um processo de sanções por parte do Parlamento Europeu. Mas foi a proposta de reforma das leis laborais que fez eclodir os protestos nas ruas, já em dezembro, com milhares de pessoas a manifestarem-se por vários dias consegutivos contra o que apelidam de “lei da escravatura”.
A emergência da extrema-direita e a normalização do seu discurso no seio das instituições europeias é também assunto de debate à esquerda em Portugal. A responsabilidade das políticas de austeridade na Europa na emergência da xenofobia foi apontada por Luís Fazenda na abertura do Fórum Socialismo 2018. Intervindo na Universidade de Verão do Podemos, Catarina Martins afirmou que “foi a Europa de Merkel que criou a Europa de Salvini”.