Trabalho digno? Mudanças importantes sobre fundo de estagnação

Ao longo de cinco meses e mais de vinte reuniões, o Parlamento debateu a alteração às leis laborais. As confederações patronais mostram-se zangadas com o resultado e ameaçam romper o acordo que António Costa lhes ofereceu, embrulhado numa inédita borla fiscal, em outubro passado. O governo andou aos ziguezagues entre a pressão dos patrões e as exigências da esquerda. O resultado final é agora conhecido.

08 de fevereiro 2023 - 13:13
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O pano de fundo, marcado pelos enormes retrocessos das últimas décadas, fica muito longe de ser remendado - ou, como refere Henrique Sousa, que a lei não tenha sido mudada para pior já é “histórico” só por si. Neste dossier, damos a conhecer as mudanças positivas alcançadas pela persistência de José Soeiro, deputado do Bloco de Esquerda que apresenta um balanço crítico deste processo. Ele representou o Bloco no grupo de deputados que trabalhou, não só sobre a proposta de lei que o governo designou como “Agenda do Trabalho Digno”, mas também sobre nove projetos de lei do Bloco de Esquerda, dois do Livre e três do PAN, além de centenas de propostas de alteração ao diploma inicial, vindas de todos os partidos, exceto o Chega (que faltou a quase todas as reuniões). No final, foram alteradas onze leis, além do próprio Código do Trabalho. 

Progressos na nova lei

Neste dossier, percorremos as principais mudanças alcançadas: no regime de faltas; nos direitos dos cuidadores informais; nas regras do trabalho temporário; na limitação aos contratos a prazo e no aumento do valor das compensações por cessação de contrato a prazo; na inclusão de recibos verdes e outsourcing na contratação coletiva; na correção de discriminações no serviço doméstico; nos mecanismos de fiscalização laboral e punição de abusos; na proteção social dos estagiários; em medidas de relativa proteção das convenções coletivas; no direito dos sindicatos intervirem em empresas sem filiados e na criminalização do trabalho não declarado.

O Bloco viu aprovadas as suas propostas em matérias como plataformas digitais e transparência dos algoritmos; pagamento de despesas em teletrabalho; proibição do mecanismo que, no final dos contratos, coloca os trabalhadores sob pressão para abdicarem dos seus direitos. 

Ao todo, foram aprovadas 105 alterações de sentido positivo, com os votos do PS, Bloco e PCP. Em contrapartida, o PS votou ao lado do PSD para chumbar 111 medidas propostas pelos partidos de esquerda.

Desequilíbrios de fundo ficaram intactos

O PS e a direita juntaram-se para chumbar propostas fundamentais. Foi o caso da reposição do tratamento mais favorável; da eliminação da caducidade das convenções coletivas de trabalho; da revogação dos cortes da troika no trabalho suplementar, nos dias de férias e no descanso compensatório; da redução do período normal de trabalho para as 35 horas semanais; da proteção dos trabalhadores por turnos e noturnos; da reposição das regras do despedimento, seja no valor (foi recusada a reposição dos trinta dias pré-troika), seja na manutenção da norma amordaçante que impede o trabalhador indemnizado de contestar despedimentos ilícitos.

Noutras matérias, apesar de algumas melhorias, foram chumbadas propostas que permitiriam ir mais longe, designadamente nos direitos dos cuidadores informais que trabalham; nas regras das licenças parentais; na responsabilização direta das empresas utilizadoras de mão de obra pelos abusos cometidos por empresas angariadoras, como vem sucedendo na região do Alentejo com imigrantes; numa real alteração do enquadramento legal do serviço doméstico.

O Bloco deu a conhecer a todas as organizações sindicais de representação dos trabalhadores um relatório em que sintetiza a informação deste dossier: presta contas do intenso trabalho desenvolvido nos últimos meses e traça uma breve história dos debates ocorridos, apresentando os resultados. 

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