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Sindicatos com mais direitos, novos mecanismos de inspeção

Para garantir o direito à atividade sindical em todas as empresas, Bloco e PCP propunham a inclusão de “direções das associações sindicais”, eliminando o exclusivo de representantes eleitos na empresa - “delegados sindicais, comissões sindicais e comissões intersindicais” - o que implica a existência de filiados do sindicato na empresa. Ficou uma alteração, através de um novo número, que garante que “o disposto nos artigos 461.º [reuniões de trabalhadores], 464.º [direito a instalações da empresa para exercício de funções sindicais] e 465.º [direito a afixar e distribuir informação sindical] aplica-se igualmente a empresas onde não existam trabalhadores filiados em associações sindicais, com as necessárias adaptações”. A proposta do PS, apresentada na sequência das críticas da esquerda e dos sindicatos à proposta inicial do Governo, acabou aprovada, contando apenas com a oposição da direita. Esta é uma velha causa de Arménio Carlos, que enquanto secretário-geral da CGTP se bateu por este esclarecimento. Em 2020, levou o tema à abertura do Congresso da central. Até agora, a lei estabelecia que o desenvolvimento da atividade sindical na empresa é feito "nomeadamente" através de delegados sindicais, comissões sindicais e comissões intersindicais. Arménio Carlos questionou “o que acontece quando não há sindicalizados e delegados sindicais na empresa”, havendo uma interpretação da ACT sobre este artigo que tem travado a entrada de dirigentes sindicais nas empresas sem representantes eleitos pelos seus trabalhadores. Com esta alteração, a polémica interpretativa fica sanada a favor dos sindicatos.
Outra alteração é a que passa a permitir que um delegado sindical possa convocar uma reunião sindical em empresas com menos de 50 trabalhadores. Até agora, a convocação de reuniões só podia ser feita por um terço dos trabalhadores, por 50 trabalhadores ou pela comissão sindical ou intersindical. PCP e Bloco não limitavam esta possibilidade a empresas com menos de 50 trabalhadores, abrangendo também as grandes empresas. Trata-se, em todo o caso, de um progresso.
Relatório Único: continuam os boicotes na informação às Comissões de Trabalhadores
Por outro lado, o Bloco apresentou uma proposta para impedir que, sob o pretexto da “proteção de dados”, as entidades patronais soneguem a informação do Relatório Único às Comissões de Trabalhadores e sindicatos. No debate, o Bloco utilizou o exemplo da RTP, que entrega à CT o Relatório Único com todas as linhas de informação (sobre remunerações, por exemplo) passadas com corretor branco, num extenso documento de dezenas e dezenas de páginas em que não há uma única informação acessível. Trata-se de um verdadeiro boicote a um direito das organizações representativas dos trabalhadores. O Bloco propôs que se incluísse explicitamente o Relatório sobre a “atividade social da empresa” no conteúdo do direito à informação (reforçando o previsto na Lei n.º 105/2009, de 14 de setembro), e que a lei passasse a explicitar que “a legislação relativa à proteção de dados pessoais não constitui óbice ao cumprimento, pelo empregador, da disponibilização da informação prevista no número anterior”. A proposta do Bloco foi apoiada pelo PCP, mas chumbada pelo voto do PS e do PSD.
ORT sem acesso ao email profissional dos trabalhadores
Ainda no que diz respeito aos direitos dos sindicatos e CT poderem desenvolver a sua atividade, o Bloco propôs que “o endereço de correio eletrónico profissional” dos trabalhadores tivesse de ser facultado obrigatoriamente às organizações representativas dos trabalhadores. Na realidade, o que estava previsto na lei não funciona para a era digital, na medida em que a informação sindical apenas pode ser exposta no “placard sindical”, o que não é eficaz em contextos em que haja trabalhadores em teletrabalho. Apesar de em 2021 o Bloco já ter conseguido incluir o direito de os sindicatos poderem utilizar a “lista de distribuição de correio eletrónico” para este efeito (alteração feita no quadro da lei sobre teletrabalho), o facto é que as empresas tendem a interpretar essa norma de forma a serem elas, entidades empregadoras, a controlarem essas lista de distribuição, fazendo uma espécie de intermediação entre a informação sindical e os trabalhadores, o que limita a autonomia do trabalho sindical e de CT. A proposta do Bloco foi chumbada pelo PS e pelo PSD, tendo o apoio do PCP.
Alarga-se direito a reunião às que se realizem online
Foi aprovada uma alteração proposta pelo Bloco que, no artigo sobre as reuniões no local de trabalho alarga o âmbito desse direito de reunião também às que sejam “convocadas e realizadas com recurso a tecnologias de informação e comunicação”, protegendo legalmente estas reuniões convocadas pelas Comissões de Trabalhadores durante o horário de trabalho, até um período máximo de 15 horas por ano. Trata-se de dar às organizações dos trabalhadores novos mecanismos para a organização coletiva em contextos de digitalização e em que milhares de trabalhadores não têm trabalho exclusivamente presencial.
Certificação de Atas é dispensada
Nos processos de constituição e de eleições em CT houve alterações, propostas pelo PS, para substituir a necessidade de “cópias certificadas das atas” por “cópias das atas”, para facilitar o processo (salvaguardando-se a possibilidade de exigir os originais ou de cópias autenticadas), aprovadas por unanimidade.
ACT, Autoridade Tributária e Segurança Social passam a poder cruzar dados para combate à precariedade
Foi aprovada uma proposta, que tinha constado da versão inicial da “Agenda do Trabalho Digno”, que depois foi retirada da proposta de lei do Governo, e foi retomada por insistência do Bloco (e posteriormente apresentada também pelo PS), relativa à interconexão de dados para a prossecução das competências da Autoridade para as Condições de Trabalho. Essa norma estabelece a interconexão dos dados da Segurança Social, Autoridade para as Condições de Trabalho, Autoridade Tributária e Instituto dos Registos e Notariado e pode ser útil no combate à precariedade, no impulso da ação especial de reconhecimento do contrato de trabalho (os dados tributários ajudam a identificar indícios de falsos recibos verdes) ou no combate às desigualdades de género. Foi aprovada por unanimidade.
Agricultura e construção: empresas têm de fazer registo semanal de trabalhadores
Foi aprovada a obrigatoriedade do registo semanal de trabalhadores em explorações agrícolas, e estaleiros temporários ou móveis de construção civil por parte da empresa utilizadora ou beneficiária final. São estas as empresas que, na prática, beneficiam do trabalho dos trabalhadores subcontratados a outras empresas e por isso faz sentido atribuir-lhes a elas, também, esta responsabilidade, para que não aleguem desconhecimento quando recorrem à terceirização/ outsourcing de serviços e a empresas prestadoras que se constituem como verdadeiros biombos na atuação da inspeção de trabalho e no controlo do trabalho forçado e clandestino nestes setores. A proposta foi aprovada com os votos a favor do PS, Bloco e PCP e a abstenção do PSD. O Bloco propôs que se retomasse a proposta original do governo, de outubro de 2021, que determinava um registo diário, e não apenas semanal, destes trabalhadores. Foi por pressão dos patrões, designadamente da Confederação da Agricultura, que o Governo alterou de diário para semanal, sempre com o pretexto da não "sobrecarga administrativa” das entidades empregadoras. A proposta do Bloco foi todavia chumbada com os votos contra do PS e PSD e com o voto a favor do Bloco e PCP.
ACT e Ministério Público podem suspender despedimentos ilícitos
No Estatuto da Inspecção Geral do Trabalho soma-se um novo poder: sempre que um inspetor de trabalho verifique a existência de indícios de um despedimento ilícito deve notificar a entidade patronal para regularizar a situação e, caso esta não o faça, comunica ao Ministério Público para que este suspenda o despedimento através de um procedimento cautelar. Esta norma resulta de um mecanismo excepcional criado durante a pandemia, que não foi muito utilizado, e que agora toma a forma de procedimento suspensivo via Ministério Público, replicando o que o Bloco havia conseguido incluir na lei sobre a ação especial de reconhecimento do contrato do trabalho (para combate a falsos recibos verdes e outras formas de dissimulação dos contratos de trabalho). O mecanismo proposto pelo governo foi aprovado com os votos favoráveis do PS, PCP e Bloco e o voto contra do PSD.
Quem não declare os trabalhadores incorre em crime até três anos de prisão
No que diz respeito ao Código dos Regimes Contributivos para a Segurança Social foram feitas algumas alterações que mereceram a concordância de PS, Bloco e PCP e, regra geral, o voto contra da direita. Por exemplo, alargou-se para 12 o número de meses (eram 6) que se presume que o trabalhador já exerceu para a entidade empregadora quando não haja comunicação da admissão de trabalhadores. Ou seja, quando não haja registo do início da atividade, o empregador é responsável por pagar as contribuições 12 meses para trás. Além disso, passou a prever-se, no Regime Geral das Infracções Tributárias (Lei n.º 15/2001, de 5 de junho) que as entidades patronais que não comuniquem à segurança social a admissão de trabalhadores no prazo de seis meses subsequentes ao termo do prazo legalmente previsto são punidas com pena até três anos de prisão, o que eleva à categoria de crime esta prática de recrutamento clandestino de trabalho.
Chumbada a responsabilização direta da cadeia de contratação
A propósito do “sujeito responsável por contra-ordenação laboral”, as propostas do Bloco para uma responsabilização direta de toda a cadeia de subcontratação pelo cumprimento da lei e dos direitos dos trabalhadores foram chumbadas. Atualmente, a lei já prevê a responsabilização solidária e subsidiária, mas os responsáveis da Autoridade para as Condições de Trabalho, nomeadamente aqueles mais diretamente envolvidos no combate ao trabalho forçado nas explorações agrícolas do Alentejo, já chamaram a atenção para a necessidade de ir ainda mais longe, considerando sempre e imediatamente o dono da obra ou da exploração agrícola diretamente responsável pela violação de direitos que possa ocorrer na sua exploração ou obra, contribuindo assim para acabar com a impunidade que persiste.
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