OE'2021: Responder à crise exige uma “bazuca social”

20 de outubro 2020 - 21:38

Numa reunião pública com ativistas e especialistas da área do trabalho, Catarina Martins afirmou que o Orçamento do Estado para 2021 tem de responder à vaga de despedimentos e proteger o emprego, o salário e todos os que perderam rendimento com a crise.

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Se o país precisa de um Orçamento capaz de responder à crise, não basta falar da “bazuca europeia”. “Vai ser necessária uma “bazuca social”.
Se o país precisa de um Orçamento capaz de responder à crise, não basta falar da “bazuca europeia”. “Vai ser necessária uma “bazuca social”. Foto de José Sena Goução, Lusa.

Numa reunião organizada pelo Bloco de Esquerda com vários responsáveis, especialistas e representantes de vários setores do trabalho, entre os quais se encontravam Manuel Carvalho da Silva, Maria da Paz Lima e João Leal Amado, Catarina Martins sintetizou as três ideias principais do encontro e as propostas do Bloco para “garantirmos um Orçamento do Estado que responda à crise que estamos a atravessar”. O encontro contou ainda com a participação de Sofia Branco, presidente do Sindicaro de Jornalistas, Daniel Carapau dos Precários Inflexíveis, Pedro Estevão da Comissão Executiva da CGTP, José Feliciano Costa, presidnte do SPGL e do Conselho Nacional da CGTP, Sérgio Monte da UGT, Romana Sousa, Diana Póvoas e Henrique de Sousa. 

Catarina Martins sublinhou a “enorme preocupação por chegarmos a esta crise com a legislação laboral em boa medida ainda do tempo da troika”. Ou seja, “uma legislação que facilita o despedimento e não permite aos trabalhadores combater os abusos que aparecem a coberto da crise”.

Para lá das questões de perda de atividade económica e dificuldade das empresas próprias de uma crise, “o facto de o despedimento ser tão barato e fácil em Portugal, e da contratação coletiva estar tão fragilizada, faz com que, no momento de crise, esta mesma crise seja utilizada como desculpa patronal para desequilibrar ainda mais as relações entre o trabalho e o capital”, referiu a coordenadora do Bloco de Esquerda.

E relembrou que, durante a troika, “vimos a forma como os salários perderam no PIB do país. Passaram a ser uma fatia cada vez mais pequena”. O que, na prática, significa que quem vive do seu trabalho fica com uma parte cada vez mais reduzida da riqueza que o país produz.

“Esse é o problema que todos vemos, por exemplo, quando a subida do Salário Mínimo Nacional não chega para subir os salários médios em Portugal, e as pessoas sentem que vivem cada vez pior porque os seus salários não progridem. Se essa legislação da troika se mantiver durante este período, significa que durante esta crise, mesmo nos setores que não forem afetados por ela, vamos observar mais uma vez uma compressão dos salários e dos direitos dos trabalhadores”, reforçou.

Em segundo lugar, Catarina alertou que, tal como está desenhada a proposta atual de Orçamento do Estado para 2021, esta não garante “uma repartição do esforço da crise que seja justa. Ou seja, os apoios à economia estão desenhados de uma forma que não pede as necessárias contrapartidas às empresas”.

Isso verifica-se, por exemplo, “quando mecanismos como o lay-off não protegem os trabalhadores precários. O que quer dizer, em última análise, que em alguns apoios públicos, de forma perversa, está a existir um apoio público ao despedimento dos trabalhadores precários. Porque, na verdade, o dinheiro do apoio serve para despedir, e não para manter emprego durante a crise”, explica.

Em terceiro lugar, alerta ainda ainda para o problema de que “os apoios sociais previstos, não recuperando o subsídio de desemprego e o subsídio social de desemprego, são apoios sociais que penalizam quem tem carreiras contributivas”.

“Não só os apoios extraordinários não chegam à generalidade dos trabalhadores, como, não havendo reconstituição dos valores e períodos de concessão das prestações como o subsídio de desemprego ou subsídio social de desemprego, está-se a desvalorizar pessoas que têm carreiras contributivas, que trabalharam e contribuíram e que neste momento de crise devem ter apoio, e não o abandono”, critica.

Estas três preocupações - que a crise não seja o momento do abuso para baixar ainda mais os salários mesmo nos setores não afetados; que se peça contrapartidas às empresas para que o apoio público não sirva para o despedimento mas, pelo contrário, uma garantia de emprego e de salário; e a ideia de que não se pode deixar desprotegido quem trabalha e contribui e se viu afetado pela crise -, “são ideias fundamentais pelas quais o Bloco de Esquerda continuará a lutar no âmbito do Orçamento do Estado, e são essenciais para uma viabilização do OE'2021 pelo Bloco de Esquerda”, diz ainda.

"O país precisa de um Orçamento capaz de responder à crise sem abandonar as pessoas"

Para Catarina Martins, se o país precisa de um Orçamento capaz de responder à crise, não basta falar da “bazuca europeia”. “Vai ser necessária uma “bazuca social”, de respeito por quem trabalha para podermos ultrapassar esta crise. O país precisa de um Orçamento capaz de responder à crise sem abandonar as pessoas, sem abandonar quem trabalha e constrói este país”.

E detalhou as propostas da área do trabalho que o Bloco de Esquerda mantém para o OE2021 nas negociações com o governo, mantendo a disponibilidade “para contrapropostas”.

Desde logo, o partido pretende que “a contratação coletiva não seja apenas uma moratória mas sim um mecanismo que efetivamente acabasse com a caducidade unilateral e repusesse a hierarquia das leis”, garantindo que não há um contrato de trabalho com condições que são piores do que a lei geral do trabalho, ou um contrato coletivo pior do que o código laboral.

Depois, Catarina Martins pretende que sejam repostas “as compensações por despedimento e caducidade por contrato de trabalho que existiam antes da troika, para que despedir não seja sempre mais fácil e barato”.

“Não deixar que, nas novas matérias onde é necessário haver regulação, que exista uma espécie de chantagem do trabalhador, seja no teletrabalho, no direito ao descanso, onde os trabalhadores são isolados e, por acordo individual, os direitos do trabalhador sejam diminuídos”, conclui.