Legislativas 2025

“Montenegrização da política foi a subida imparável do preço das casas e o desastre da saúde”

16 de abril 2025 - 22:24

No debate televisivo entre Joana Mortágua e Nuno Melo, esgrimiram-se diferenças e fez-se o balanço da governação da direita na habitação, saúde e política de imigração.

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Joana Mortágua e Nuno Melo
Joana Mortágua e Nuno Melo

Com a recusa de Luís Montenegro em debater com Mariana Mortágua na televisão nestas eleições, o lugar do primeiro-ministro foi ocupado por Nuno Melo, enquanto o Bloco esteve representado por Joana Mortágua. Como seria de esperar, o debate foi esclarecedor sobre as diferenças que separam os dois projetos políticos.

Após deixar uma nota de pesar pela morte de João Cravinho, que “dialogou muito com o Bloco de Esquerda sobre os temas de corrupção”, Joana Mortágua avançou para o primeiro tema proposto pelo moderador, acusando Nuno Melo de nunca ser capaz de fazer um balanço da governação no que toca à habitação, isto no dia em que se soube que os pedidos de ajuda para pagar renda disparou 67%. A razão é simples, prosseguiu a candidata bloquista por Setúbal: “o balanço é casas que os salários não podem pagar”, uma vez que “todas as medidas que a AD tomou aumentaram o preço das casas”.

Nuno Melo respondeu que o problema da habitação “é a falta de oferta, isso tem de ser resolvido com construção”. E atacou a proposta do Bloco de criar um teto às rendas consoante a tipologia, localização e características de cada imóvel, à semelhança do que existe em outros países europeus, tentando confundi-la com o congelamento das rendas aprovado no tempo de Salazar. Com os tetos, argumentou Nuno Melo, “os investidores deixam de poder pagar as casas e de as reabilitar”, o que levaria à “degradação dos centros das cidades” e à fuga dos moradores para as periferias.

Na sua réplica, Joana Mortágua insistiu que é necessária a construção, mas “as pessoas não podem estar à espera de um milagre”, pois a construção demora muitos anos e a crise da habitação “está a condenar gerações inteiras à pobreza”. E se a proposta dos tetos às rendas tem marcado os debates da campanha eleitoral é porque “é a única medida que pode baixar as rendas agora”. Lembrou ainda que 17 países da OCDE têm controlo de rendas e que até na Alemanha, o acordo de governo liderado pelo “partido da família de Nuno Melo acabou de prolongar o controlo de rendas”.

“Nuno Melo sonha com Salazar, mas a medida dos tetos às rendas é do mais moderno que se faz na Europa”, prosseguiu a deputada bloquista, considerando uma “arrogância e cobardia face aos interesses da especulação dizer que a Europa inteira está errada e quem está certo é Portugal, onde milhões de pessoas estão a sofrer por não ter acesso a casa”.

Questionada pelo moderador sobre se encontra uma “montenegrização” da política, referindo-se à expressão usada por Montenegro para evocar uma suposta influência do seu pensamento político nas propostas dos restantes partidos, Joana Mortágua respondeu que “a montenegrização da política portuguesa é a subida imparável do preço das casas e o desastre da saúde”, com 16 urgências fechadas no próximo fim de semana, entre elas as do Garcia de Orta e Amadora Sintra, ou o caos no INEM, onde “ainda estamos para perceber quem assume a responsabilidade pelos 11 mortos” durante a greve do ano passado que a secretaria-geral do Ministério da Saúde não soube prevenir com a indicação de serviços mínimos.

Sobre a Saúde, Nuno Melo saiu em defesa de Ana Paula Martins, afirmando que com a sua governação há hoje mais médicos contratados e mais linhas de apoio e melhorias na cirurgia oncológica. Em seguida, atribuiu responsabilidades ao Bloco pelo estado da saúde após a maioria absoluta do PS, com o habitual refrão de que os problemas da saúde “não se resolvem atirando ideologia para cima dos problemas”. E deu o exemplo do fim das PPP nos hospitais, defendendo os grupos privados que as geriam e depois não voltaram a candidatar-se porque o contrato não era suficientemente lucrativo.  

Na resposta, Joana Mortágua concordou que a saúde “foi uma das áreas em que a maioria absoluta falhou”, mas exatamente por isso bastava o atual Governo fazer “um bocadinho melhor” do que o anterior. Mas “prometeram salvar o SNS em 60 dias e afundaram o SNS. Toda a gente que se dirige a uma urgência sabe que o que Nuno Melo disse é propaganda”, concluiu.

O debate prosseguiu para o tema da imigração e a chamada “via verde” que o Governo criou para as grandes empresas poderem contratar imigrantes. Joana Mortágua acusou o executivo de ter escolhido “imitar a extrema-direita na imigração” e de ter mentido ao país ao fazer de conta que ia limitar a entrada de imigrantes para depois abrir uma via verde “para entrarem mais 100 mil para a construção civil”. “Portugal precisa de imigração regularizada. Não se pode criar uma via em que os imigrantes vêm por encomenda dos empresários deixando para todos os outros o trabalho ilegal e a miséria”, afirmou a candidata do Bloco.

Nuno Melo voltou a acusar o Bloco de pensar “que pode vir toda a gente”, invocando o “humanismo” do fim da manifestação de interesse face a muitas pessoas que “vieram atrás de uma ilusão e vivem na rua ou amontoadas em casas”. E recusou o nome de “via verde” para a medida, considerando-o “um disparate”.

“Não sei quem é que o Nuno Melo pensa que vai construir os milhares de casas que a AD promete. O mínimo que se pode fazer é tratar esses trabalhadores com respeito”, replicou Joana Mortágua.

Também quando o tema passou à política de defesa e ao rearmamento europeu no quadro da NATO, Nuno Melo voltou a acusar o Bloco de “irresponsabilidade” por querer acabar com a NATO. E procurou justificar o aumento da despesa militar com as “missões fundamentais que só as nossas Forças Armadas fazem” ou com o investimento em “indústrias de defesa que dão lucro”.

Joana Mortágua respondeu que “Nuno Melo está ema negação. A NATO é controlada pelo melhor aliado de Putin, só Nuno Melo não percebeu que se aliaram para pilhar a Ucrânia”. Quanto à alternativa europeia, defendeu que não pode ser construída em cima de mentiras, como a de que a Europa tem falta de armas face à Rússia. Lembrou também que o Secretário-Geral da NATO “diz que temos de cortar nas pensões e na saúde, e Maria Luís Albuquerque quer pegar no dinheiro dos pensionistas” para investir nas empresas de armamento.

“Uma Europa que abdica do estado social e do combate às alterações climáticas para uma corrida ao armamento desnecessária é uma Europa em que Putin já ganhou e Trump já ganhou”, concluiu.