SNS

Baixa adesão dos médicos à dedicação plena confirma avisos dos sindicatos

20 de junho 2024 - 11:13

Apenas um em cada quatro médicos especialistas aderiram ao regime criado pelo anterior executivo. E metade fizeram-no porque a isso estavam obrigados. FNAM continua a contestar a constitucionalidade do regime e quer incluí-lo nas negociações com o Governo.

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hospital
Foto de Paulete Matos

O debate dos últimos anos sobre a fixação de médicos no SNS passou pela escolha entre o regime de dedicação exclusiva - há muito defendido pelo Bloco de Esquerda e que contemplava uma majoração de 40% no salário e outros incentivos - ou o regime defendido pelo PS, a que chamou de “dedicação plena”, em que em troca de mais alguma remuneração os médicos aceitavam trabalhar mais horas extraordinárias. Foi este último que a maioria absoluta aprovou no ano passado, mas sem o acordo dos sindicatos ao fim de meses de negociações.

O Diário de Notícias publica esta quinta-feira o resultado da adesão dos médicos a este regime e conclui que é “residual”: dos 21 mil médicos especialistas a trabalhar no SNS, aderiram até 24 de abril apenas 5.260 profissionais. Mas este número inclui os médicos de família que integram as Unidades de Saúde Familiares Modelo B (USF-B) e que são obrigados a entrar no regime da dedicação plena, bem como as chefias hospitalares que teriam de deixar essas funções caso não aderissem. A soma das duas categorias corresponde a cerca de metade dos médicos integrados no novo regime.

“Só 2806 médicos hospitalares é que aderiram, sendo que as chefias tinham de aceitar o regime. Nós temos 15 mil médicos especialistas nos hospitais. Nos cuidados primários, só aceitaram o regime 2390 médicos de família, e há seis mil nesta área, e na Saúde Pública só 74 é que aceitaram, eles são 450”, diz ao DN a presidente da FNAM, Joana Bordalo e Sá. E acrescenta que alguns dos médicos que aderiram já estão a tentar sair deste regime. A FNAM sempre acusou este regime de ser inconstitucional e violar direitos adquiridos, prometendo levar a luta judicial até aos tribunais europeus se necessário.

“A FNAM defende a dedicação exclusiva e não o regime de dedicação plena que são completamente diferentes. Neste, há uma perda notória de direitos e não é por atribuir um suplemento de 25% que se pode fazer tudo”, afirmou a sindicalista ao DN, concluindo que “a baixa adesão explica os problemas deste regime”. Em troca daquele aumento na remuneração, os médicos que aderem a este regime passam a aceitar fazer 250 horas extraordinárias anuais em vez das 150 que a lei permite. Abdicam também do dia de descanso compensatório após uma noite de urgência, têm de trabalhar ao sábado caso não façam urgência e podem passar a trabalhar até nove horas diárias. Tudo isto, resume Joana Bordalo e Sá, ajuda a explicar as razões para a grande maioria dos médicos não ter aderido à dedicação plena.

Também ouvido pelo mesmo jornal, o presidente da Associação Portuguesa de Medicina Geral e Familiar (APMGF), Nuno Jacinto, admite esperar pelo final do ano para fazer um balanço mais conclusivo, mas para já reconhece uma adesão “residual” na área dos cuidados primários, prevendo que a passagem de algumas Unidades de Saúde Familiar para o modelo B, que contempla mais incentivos, tenha mais influência do que este regime de dedicação plena no funcionamento das unidades.

Médicos em Luta recusam fazer mais horas extra se não houver acordo entre ministra e sindicatos

O grupo de médicos que lançou no ano passado as minutas de recusa de ultrapassagem do limite das 150 horas extra anuais recolheu agora 500 assinaturas de médicos que declaram a sua indisponibilidade para fazer mais horas acima daquele limite legal - que aumentou para 250 horas no caso dos profissionais que aderiram à dedicação plena - já a partir do final de junho, caso as negociações entre a ministra da Saúde e os sindicatos  não resultem em acordo.

À agência Lusa, a médica Helena Terleira afirmou que o número de médicos hospitalares e especialistas em medicina geral e familiar que já entregaram a minuta é superior aos que agora subscrevem esta carta aberta. No caso de não haver acordo, a esta recusa juntar-se-á o período das férias, fazendo antever mais complicações para o funcionamento das unidades do SNS ao longo deste verão.

"Já é um período do ano em que é muito difícil fazer escalas e que, nalguns sítios, já se repercute na possibilidade de algumas urgências estarem encerradas só por causa das férias. Se a isso juntarmos as minutas, de facto, vai ser um verão muito difícil", alertou a médica. A carta chama ainda a atenção para o impacto das atuais condições de trabalho na “saúde mental, física e a qualidade de vida de todos os profissionais de saúde”.

Governo e sindicatos voltam a sentar-se à mesa na próxima semana, depois de na reunião de maio não terem chegado a acordo sobre as matérias incluídas na negociação. Tanto a FNAM como o SIM pretendem ver incluídas a revisão das grelhas salariais, a reposição das 35 horas e a integração dos internos nas carreiras médicas, entre outras matérias.