O Tribunal do Trabalho de Viseu reconheceu o vínculo contratual à Glovo de dois estafetas por considerar que se estava efetivamente perante um contrato de trabalho subordinado por tempo indeterminado e não numa situação de “prestação”.
A base das sentenças, proferidas em separado a 14 e 16 de junho, é o que o “instrumento de trabalho” fundamental, a aplicação informática, pertence à empresa, não sendo por isso determinante que sejam detentores das mochilas ou dos meios de transporte. Para aceder à aplicação que lhes permite trabalhar, os estafetas são aliás obrigados a pagar uma “taxa de utilização” que é quinzenal. Sem ela, não há acesso aos clientes, aos pedidos ou aos “pareceiros”, não podendo assim ser exercida a “atividade de entrega”.
Para além disso, considerou-se provado que a Glovo fixa a remuneração, dentro de limites mínimos e máximos, impondo regras a cumprir e controlando e supervisionando o trabalho do estafeta em tempo real, verificando ainda a sua qualidade. Este controlo faz-se “seja através do sistema de reputação, seja através dos critérios que utiliza na gestão algorítmica de atribuição de pedidos, a qual é da inteira responsabilidade da ré e cujo conhecimento a mesma não faculta aos estafetas”.
A notícia das duas sentenças foi conhecida esta sexta-feira no Público e, depois dela, a empresa informou que iria interpor recurso “com a maior brevidade possível”, argumentando que “são completamente opostas às proferidas anteriormente, no total 28 sentenças, que envolvem 59 estafetas”.
Ao longo dos últimos meses, tem havido sentenças favoráveis quer aos trabalhadores quer às várias plataformas. Todas sujeitas a recurso, ou das empresas ou do Ministério Público. Na sequência das novas regras sobre trabalho em plataformas, em vigor desde 1 de maio do ano passado, a Autoridade para as Condições de Trabalho fez, em janeiro passado, 861 participações ao Ministério Público por ter encontrado indícios que os estafetas não são “trabalhadores independentes” mas trabalhadores subordinados.
Aquele jornal dá conta que os dos recursos já foi decidido pelo Tribunal da Relação de Évora que reverteu a decisão da primeira instância, reconhecendo assim a existência de um contrato de trabalho sem termo entre o estafeta e a Comidas.pt. O acórdão delibera que esta empresa “coordena e organiza toda a atividade, não só no que se refere à específica recolha, transporte e entrega de refeições, como também quanto a todo o modus operandi dos estafetas”, considera que o trabalho está inserido numa estrutura organizativa e salienta que o seu trabalho é acompanhado através de geolocalização. Por isto tudo, existe uma relação de subordinação ainda que estafeta tenha supostamente a possibilidade de se ligar ou desligar quando quiser ou de trabalhar para outras plataformas.