Entrevista

Trabalhadores abandonados pelo Minipreço e Auchan vão "continuar a luta até ao fim da linha"

09 de outubro 2024 - 21:37

Em dois Minipreços franqueados no distrito do Porto, 14 trabalhadores foram despedidos no contexto da venda das lojas Minipreço ao grupo Auchan. Em entrevista ao Esquerda, Sandra Artilheiro, uma das trabalhadoras que dirige agora a luta em articulação com o sindicato, fala sobre o processo.

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Manifestação dos trabalhadores frente ao Minipreço
Fotografia de Sindicato dos Trabalhadores das Grandes Superfícies, Armazéns e Serviços de Portugal

O Minipreço vendeu as suas lojas ao Grupo Auchan, mas no Porto, duas lojas encerraram definitivamente e os trabalhadores estão desempregados. Eram duas lojas franqueadas, cujo proprietário era Fernando Queiróz Orosa, e cujos trabalhadores o Grupo Auchan se recusa a empregar, passando a responsabilidade para o antigo patrão.

Perdidos no processo de negociação entre as duas plataformas, estes catorze trabalhadores juntaram-se e, em articulação com o Sindicato dos Trabalhadores das Grandes Superfícies, Armazéns e Serviços de Portugal, estão a levar a cabo um processo de luta "até ao fim da linha", para serem integrados na estrutura de retalho do Auchan.

Sandra Artilheiro é uma das trabalhadoras que está a liderar o processo de luta em conjunto com o sindicato. Em entrevista exclusiva ao Esquerda, fala sobre o impacto que os despedimentos têm na vida das pessoas, mas também sobre a desresponsabilização por parte de todas as partes envolvidas e a falta da "parte humana" do processo.


Quando o Grupo Auchan comprou as lojas ao Minipreço, que informação é que foi transmitida aos trabalhadores?

Nenhuma. Da parte dos franqueados, nenhuma. Soubemos pelas notícias que eram partilhadas na Internet. Da parte do meu patrão, na loja franqueada, não houve informação nenhuma, só mesmo quando o negócio estava concluído é que ele disse que as lojas supostamente tinham sido compradas. Ainda tinha que ir a um processo na entidade reguladora para ver se aceitavam, mas que a gente já sabia que aquilo ia ser aceite. Mas a gente já sabia há muito tempo que isto já tinha luz verde para andar.

Deram-vos alguma segurança em relação a esta transição?

Não. A segurança que tínhamos era do nosso patrão, Fernando Queiróz Orosa, que era quem nos pagava. Nós achávamos que tínhamos uma segurança, se eventualmente ele entregasse as lojas, que o Auchan ficasse com os trabalhadores. Quando vamos para um franqueado, aquilo que ouvimos dizer é que se a loja fechar, o posto de trabalho fica em causa. Se a loja continuar aberta ao público, agora como pertence ao Auchan e não ao Minipreço, eles supostamente são obrigados a ficar connosco. Mas não foi isso que aconteceu. Ninguém disse nada e o que é certo é que estamos todos sem trabalho. São catorze pessoas em duas lojas.

O facto de ser uma loja franqueada coloca os trabalhadores numa posição mais precária?

Coloca, pensava que não mas coloca. Se fosse noutro tipo de situação, imagine que aquela loja ia fechar mesmo definitivamente e era Minipreço ou Auchan, eles colocavam as pessoas noutras lojas. Não foi o caso. Aquela loja estava a ser explorada pelo Fernando Queiróz Orosa, ele entrega às lojas ao grupo, e ele é que é responsável por nós. E nós nem carta para o fundo de desemprego temos. Estamos aqui a batalhar para termos alguma coisa para nos sustentar, porque toda a gente tem casa e família. Foi o que eu disse ao meu patrão: nós temos casa, família, comemos como ele e precisamos de dinheiro ao fim do mês. E ele disse que ia tratar mas acho que não está a tratar nada.

Qual é a relação entre o seu patrão e o Auchan na responsabilidade por manter estes postos de trabalho?

O que ele nos disse foi que não sabia se eles iam assegurar as postos de trabalho, que ninguém lhe disse nada, que achava que deviam de fazer, mas que não sabia de nada. Do meu ponto de vista, o Auchan precisa de pessoas com experiência para trabalhar e pelos vistos, precisa nas lojas. Mas quem está nos recursos humanos ainda é a gestão antiga. E daquilo que eu conheço da gestão antiga estão-se a marimbar para o que acontece com o resto do pessoal.

Qual foi a reação dos trabalhadores e do sindicato sobre o fecho das loja?

Ontem reunimos todos os trabalhadores das lojas com o sindicato. Foram feitas cartas registadas para mandar para a morada fiscal das firmas, porque o nosso patrão tinha duas firmas com o mesmo contribuinte, a pedir a carta para o desemprego. Se ao fim de cinco dias não recebermos, seguimos para a Autoridade para as Condições do Trabalho. E entretanto o mês está a correr. Eu por mim ainda queria ir trabalhar, mas o Auchan no retalho não nos dá luz verde, a carta que eles mandaram para ao sindicato foi a dizer não se responsabilizavam pelos funcionários franqueados. Se não me derem trabalho tenho de ter pelo menos algum sustento, e por isso quero a carta para o desemprego.

Entretanto o Auchan refugia-se na lei para se desresponsabilizar pela situação.

Podem não ter responsabilidade legal, mas tem de haver a parte humana. Pelo menos ao falar com as pessoas. Quando uma loja era franqueada, o Minipreço dava a possibilidade de falar com os operadores para ver se querem ficar com eles. Quando a loja foi franqueada em Canidelo, o franqueado veio falar connosco e uns disseram que sim, outros disseram que não. E agora não estão a dar a oportunidade aos trabalhadores franqueados de falar com o Minipreço [a estrutura ainda existente que passa para o Auchan] a ver se querem ficar com o pessoal.

Que caminho é que acha que agora há em frente? É possível pressionar o Auchan?

Sim, mas tem de ser o Auchan Retalho. Tínhamos que conseguir chegar a alguém mesmo da estrutura do Auchan. Explicar que há famílias que não conseguiram emprego, por exemplo. Dizer-lhes que há famílias preocupadas, são 14 famílias, há uma casa que é preciso governar. Renda, luz e água são as três principais preocupações, mais a comida. Mas é um bocado difícil gerir. Nunca estive numa situação destas. Eu já tenho 48 anos e nunca estive numa situação destas.

Os trabalhadores organizaram um protesto a semana passada à frente do Minipreço, estão a pensar mais alguma ação?

Estamos a planear uma ação no Minipreço de Matosinhos, na próxima sexta-feira às 13h. Falou-se ontem com o sindicato juntar-se a nós na loja de Matosinhos. O sindicato quer os postos de trabalho, estamos a trabalhar nisso, mas a resposta que vem é que não se responsabilizam pelos trabalhadores franqueados. Vamos continuar esta luta até virem falar connosco, darem a cara e se responsabilizarem pelos postos de trabalho, até ao fim da linha, como se costuma dizer.