A Relatora Especial das Nações Unidas sobre a situação dos Direitos Humanos nos territórios ocupados da Palestina, Francesca Albanese, endereçou este sábado uma carta aberta ao ministro dos Negócios Estrangeiros, Paulo Rangel, apelando ao reconhecimento da Palestina e a um embargo a Israel.
Na carta, Albanese relembra que esteve em Portugal recentemente, a convite do ISCTE e da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, tendo também contactado com ativistas, estudantes, deputados, académicos, jornalistas, sindicalistas e funcionários do governo. A relatora especial das Nações Unidas lamenta que Paulo Rangel se tenha recusado a recebê-la, porque queria partilhar com o ministro a sua “profunda preocupação com a situação catastrófica na Palestina/Israel, com os palestinianos, com os israelitas, e com a actual instabilidade regional”.
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“Teria igualmente recordado as obrigações internacionais de Portugal no que respeita à ocupação de 57 anos por Israel do que resta da Palestina histórica – a Faixa de Gaza e Cisjordânia, incluindo Jerusalém oriental –, bem como as implicações de um ano de genocídio em Gaza”, diz na carta.
Francesca Albanese carateriza a atual situação na Palestina como “uma crise de humanidade e um genocídio em directo que nos responsabiliza a todos” e lembra que Israel distorceu intencionalmente o direito internacional humanitário para camuflar a sua violência genocida. Fazendo o balanço de mais de 40.000 mortos na faixa de Gaza, afirma que as práticas do governo israelita “revelam uma intenção de destruir fisicamente os palestinianos enquanto grupo”.
“Neste cenário catastrófico, o único caminho deve ser o de honrar as obrigações internacionais, pondo fim ao genocídio e à ocupação, assegurando a existência dos palestinianos no que resta da sua pátria e acabando com o regime de apartheid”, afirma.
Elogiando Portugal por pedir medidas sobre a exportação de armas, fechar o seu espaço a voos vindos dos Estados Unidos da América para Telavive e por finalmente ter retirado o pavilhão português ao navio MV Kathrin – medidas que só foram possíveis devido à pressão do movimento social face ao governo –, a relatora especial das Nações Unidas defende que é preciso fazer mais, nomeadamente reconhecer o Estado da Palestina.
”Uma vez que o Estado da Palestina existe, o seu reconhecimento é um acto de coerência política e de consistência retórica”, diz, relembrando que não se trata apenas de um dever moral, mas de uma “obrigação não derrogável a que Portugal está vinculado por lei”.
Francesca Albanese lembra o papel de Portugal na defesa do direito à autodeterminação do povo timorense, considerando que o país tem agora um papel fundamental a desempenhar, remetendo em concreto para a Constituição da República Portuguesa, cujo artigo 7.º exige a defesa dos direitos humanos e o direito à autodeterminação dos povos. “Nestes 50 anos da Revolução dos Cravos, o Governo português pode e deve fazer mais para que Portugal não traia os valores que outrora guiaram a sua própria luta”, conclui.