Francesca Albanese veio esta semana a Portugal para dar algumas conferências sobre o genocídio em Gaza e o Direito Internacional. Na quarta-feira esteve no ISCTE, esta quinta-feira irá ao CCB e na sexta é a vez da Universidade de Coimbra. Pelo meio está previsto um encontro no Ministério dos Negócios Estrangeiros, mas o ministro Paulo Rangel, que recentemente teve de recuar na sua posição sobre a bandeira portuguesa no navio que transporta explosivos para Israel, invocou motivos de agenda para não a receber. E em vez de ser recebida por um secretário de Estado, será um diretor-geral do Ministério a marcar presença no encontro.
Na manhã desta quinta-feira, a relatora especial da ONU foi recebida por deputados na Assembleia da República. No final do encontro, a coordenadora bloquista Mariana Mortágua lamentou que o ministro tenha optado por não receber Francesca Albanese “como era sua responsabilidade como representante do Governo português”. E considerou a ausência como “mais uma das contradições do Governo” no que diz respeito à Palestina, a juntar à da defesa dos dois estados sem reconhecer o Estado da Palestina. E para o Bloco a prioridade agora passa por reconhecer o Estado da Palestina e parar o massacre, caso contrário “não vai ter população para reconhecer daqui a uns meses”.
Mariana Mortágua destacou a importância da presença de Albanese no Parlamento português, elogiando a forma clara e simples como coloca o problema que está em causa: que “as ações de Israel só podem ser enquadradas num projeto racista, expansionista, de ocupação do território palestiniano e extermínio da sua população” e que por isso “não se trata de uma resposta, de uma defesa, não se trata sequer de uma vingança, mas sim de “um plano de longo prazo” para a Palestina com aquelas características.
A coordenadora do Bloco criticou ainda o ministro Paulo Rangel por dizer na ONU que Israel tem o direito à legítima defesa mas que cometeu “excessos” em Gaza. “O genocídio não é excesso, é crime internacional”, prosseguiu Mariana, concluindo que o argumento dos “excessos” não faz mais do que revelar “a natureza da cumplicidade” de muitos estados com Israel. A coordenadora do Bloco agradeceu ainda a pressão feita por Albanese para a retirada da bandeira portuguesa do navio Kathrin, considerando-a “decisiva” para a “vitória da mobilização popular e da pressão que fizemos” junto do Governo que tinha começado por negar que houvesse navio e depois que houvesse explosivos a bordo.
“Os arquitetos deste genocídio vão ser responsabilizados”, acredita Francesca Albanese
Em conferência de imprensa na quarta-feira, Albanese congratulou-se com a retirada da bandeira do cargueiro Kathrin, mas sublinhou que “a questão mais urgente é saber o que é que Portugal vai fazer para não ter qualquer relação política, diplomática ou económica com Israel que possa prejudicar os palestinianos. O que é que o Governo vai fazer sobre o reconhecimento do Estado da Palestina. O que é que é preciso?”, questionou.
Albanese diz acreditar que “os arquitetos deste genocídio vão ser responsabilizados” e que a pressão sobre os governos para aplicarem o Direito Internacional “é um imperativo moral para todos nós”. Questionada sobre se o corte de relações diplomáticas com Israel não seria um passo excessivo, responde que “há um genocídio a acontecer, e mesmo se não lhe quiserem chamar genocídio, crimes de guerra, crimes contra a humanidade, o que seja: não se apoia um país no momento em que este comete atrocidades, e isto não começou ontem.”
Gaza
Relatora da ONU "implora" ao governo português que retire bandeira ao navio do genocídio
A relatora das Nações Unidas defendeu que “este deve ser o momento para o Governo de Portugal ter um papel exemplar. Eu vejo como o vosso país vota nas Nações Unidas. Este é o momento de passar à ação. Qual é a coerência em dizer que concordam com a autodeterminação mas não reconhecem o Estado da Palestina? Isto é uma incoerência. Onde está o compasso moral da Europa?”, voltou a perguntar, contrapondo que “[os palestinianos] têm o direito de existir como povo num ou em dois Estados”.
Francesca Albanese foi também questionada pelos jornalistas sobre o recente anúncio de considerar o secretário-geral da ONU como persona non grata. “Já não há palavras. O mandato do secretário-geral vai ser marcado por este genocídio. Ele tem estado debaixo de grande pressão mas foi muito corajoso. Quanto ao facto de ter sido declarado persona non grata, já somos dois. É o que é”, concluiu.