O governo português ajudou a diluir as metas de redução de gases da UE

06 de novembro 2025 - 10:17

Na negociação dos ministros do Ambiente que concluiu um acordo na madrugada de ontem, Portugal esteve do lado dos que defenderam um aumento dos chamados “créditos de carbono”.

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Wopke Hoekstra, comissário europeu para o clima na conferência de imprensa que se seguiu ao acordo.
Wopke Hoekstra, comissário europeu para o clima na conferência de imprensa que se seguiu ao acordo. Foto de OLIVIER HOSLET/EPA.

Nas vésperas da Cimeira climática da ONU no Brasil, a COP 30, os ministros do Ambiente da União Europeia concordaram formalmente, depois de uma negociação que entrou madrugada dentro de quarta-feira, numa redução das emissões de gases com efeito de estufa até 2040 de 90% relativamente aos níveis de 1990.

O número que foi fixado na emenda à lei climática europeia parece ser contundente e o corte drástico mas esta meta vem acompanhada de “alçapões” problemáticos e da ausência de especificação sobre como alcançar este objetivo. Isto para além oficialmente se mencionar uma “flexibilidade” que contraria a proposta inicial da Comissão Europeia.

Tal é o caso da compra dos chamados “créditos de carbono”. Até 5% desta meta poderá ser “comprada” a países fora da União Europeia através deste esquema que permite “compensar” a manutenção da poluição investindo em projetos que noutros pontos do mundo supostamente contribuam para o clima. A proposta inicial da Comissão Europeia era de 3%. O prazo em que isto pode começar a ser feito também foi antecipado. Era de 2036 mas passou a haver a possibilidade de haver a partir de 2031 um projeto piloto que desencadeie o processo cujos detalhes estão por definir.

De acordo com a Reuters, os governos francês e português estiveram do lado dos países que exigiram a introdução dos 5% de créditos de carbono. Polónia e Itália exigiam mesmo 10%. Do outro lado, estavam, por exemplo, Espanha e Países Baixos que se opuseram a enfraquecer o objetivo designado.

O texto inclui ainda a possibilidade de, no futuro, os países poderem passar a comprar mais 5% deste tipo de créditos, o que reduziria efetivamente a meta proposta para 80%.

Outra concessões são o adiamento, de 2027 para 2028 da implementação do ETS2, sistema que obriga ao pagamento de um “preço de carbono” por cada tonelada de CO2 emitida pela atividade de transportes rodoviários e aquecimento de edifícios e a “reavaliação” do prazo de 2035 para o fim da venda de automóveis novos a gasóleo e a gasolina.

Para além disso, o texto inclui uma cláusula de “revisão abrangente” que implica rever a meta se a política climática tiver “impactos negativos” na economia da UE ou se existir preços da energia considerados “elevados”.

De fora deste consenso ficaram a Polónia, a Hungria e a Eslováquia, que votaram contra, enquanto que Bélgica e Bulgária se abstiveram. Ainda assim, conseguiu-se superar a maioria qualificada que era requerida de 55% dos estados-membros e de representação de pelo 65% da população.

Um acordo aquém do exigido pelos consultores científicos

Do lado da Greenpeace, um comunicado lembra que esta meta “fica significativamente aquém do mínimo exigido pelos próprios consultores científicos da UE”. O Conselho Consultivo Científico Europeu sobre Alterações Climáticas tinha defendido a necessidade de reduções de emissões de 90-95% até 2040 e enfatizado que essa meta deveria ser para reduções domésticas da poluição climática, e não cortes terceirizados para outros países.

A organização ambientalista denuncia que, segundo o acordo, “os governos também podem terceirizar mais cinco pontos de suas próprias metas nacionais”, ao mesmo tempo que se adia “o início do mercado de carbono da UE para a poluição proveniente de automóveis e sistemas de aquecimento” e que se “alarga as licenças de emissões de poluentes à indústria pesada e isentar alguns combustíveis de "baixo carbono" da eliminação gradual dos motores de combustão interna”.

Lembra-se ainda que os ministros “não conseguiram chegar a acordo sobre uma meta firme para 2035, mantendo, em vez disso, um intervalo previamente acordado de cortes de emissões de 66,25% a 72,5%, cuja meta, mesmo a mais elevada, é inconsistente com uma trajetória credível para o corte proposto de 90% para cinco anos depois”.

Thomas Gelin, representante da Greenpeace Europa, explica que “reduzir a poluição climática em 90% nunca foi suficiente para que a UE desse uma contribuição justa para a ação climática global, mas pelo menos com uma meta honesta, o fosso tornar-se-ia claro. A utilização da lavagem de carbono offshore para atingir esta meta nominal significa que o próprio compromisso da UE é muito menor, e este compromisso significa ainda menos com uma cláusula incorporada que dilui a meta a cada dois anos. É como prometer correr uma maratona treinando apenas 10 km, apanhando o autocarro para o último quilómetro e reservando-se o direito de simplesmente ficar em casa se chover”.

O ativista alerta para os avisos dos cientistas sobre os pontos de inflexão climáticos, as mortes por ondas de calor, as perdas de culturas e o caos económico que “estão a tornar-se cada vez mais graves”. Assim sendo, “agir de forma inadequada em relação às alterações climáticas é profundamente irresponsável e fará com que mais pessoas percam as suas vidas, casas e meios de subsistência.”

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