Novo projeto de lei de asilo do Reino Unido cria cisões no governo

08 de dezembro 2023 - 11:13

Diploma permite ignorar decisões do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos e leis internas e internacionais. Oposição, instituições e organizações internacionais criticam ataque aos direitos humanos, mas ala mais à direita do executivo quer que Rishi Sunak vá ainda mais longe.

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Rishi Sunak, primeiro-ministro britânico. Foto de ANDY RAIN.

O projeto de lei agora apresentado visa ultrapassar a decisão do Supremo Tribunal, datada de novembro, que confirmou que o acordo firmado entre o governo conservador britânico e o Ruanda, que previa a deportação para este país dos requerentes de asilo, punha em causa o direito destes migrantes, quer por poderem ver os seus processos incorretamente tratados, quer por se arriscarem a ser devolvidos aos países de origem, onde podem sofrer perseguições.

Um dia depois de assinar um novo tratado com o país africano, Rishi Sunak submete a votos na próxima terça-feira um diploma que visa dar poderes aos ministros para desrespeitarem decisões urgentes do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH) no sentido de suspender, temporariamente, a transferência de migrantes para o Ruanda, e também permitir aos tribunais nacionais ignorarem leis internas e internacionais, como a Convenção das Nações Unidas relativa ao Estatuto dos Refugiados, que travem essas mesmas transferências. A proposta define ainda o Ruanda como um país “seguro”.

O Partido Trabalhista já anunciou a sua firme oposição à política de imigração do governo, que também é repudiada pela ala mais moderada do Partido Conservador, bem como pelas Nações Unidas, a Comissão Europeia e inúmeras organizações de direitos humanos.

Por outro lado, a fação mais à direita do Partido Conservador quer ir ainda mais longe, pretendendo, inclusive, que o Reino Unido se retire da convenção dos refugiados da ONU e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, e que revogue a Lei dos Direitos Humanos britânica.

Na quarta-feira, Robert Jenrick, secretário de Estado para a Imigração, apresentou a sua demissão, alegando o curto alcance da proposta. Já na quinta-feira, a ex-ministra do Interior Suella Braverman afirmou que a lei “não vai funcionar” e alertou que a capacidade do executivo para “travar os barcos” de migrantes no Canal da Mancha será essencial para os conservadores “vencerem as próximas eleições”.

Também na quinta-feira, o primeiro-ministro britânico deu uma conferência de imprensa de emergência para tentar recuperar o controlo sobre o debate. À medida que a contestação no interior do seu partido cresce, Rishi Sunak prometeu “terminar o trabalho” de pôr em prática o seu plano, e avançou que a nova lei no Ruanda evitará contestações legais e finalmente permitirá a descolagem de voos de deportação para o país africano.

O governante explicou ainda que as autoridades ruandesas comunicaram que rasgariam o acordo caso o Reino Unido se retirasse dos tratados internacionais em causa.

“Esta é a única abordagem possível (…), a diferença é de um centímetro. Se formos mais longe, isso fará com que o Ruanda faça o acordo colapsar e, então, não teremos para onde enviar ninguém”, frisou Rishi Sunak.

“Bloqueámos todas as formas através das quais os migrantes ilegais tentam permanecer [no Reino Unido]. Pusemos a fasquia tão alta que será extremamente difícil alcançá-la”, garantiu.

O primeiro-ministro britânico deixou ainda uma certeza: “Se o tribunal de Estrasburgo [TEDH] escolher intervir contra a vontade expressa no nosso Parlamento soberano, irei fazer aquilo que for necessário para que os aviões [para o Ruanda] levantem voo”.