EDP

Mexia e Manso Neto acusados de corromper Manuel Pinho

29 de outubro 2024 - 15:26

Ministério Público acusou finalmente os dois ex-administradores da EDP e o ex-ministro da Economia de corrupção para favorecer os interesses da empresa. Acusação calcula prejuízos para o Estado e os consumidores em torno de mil milhões de euros.

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João Manso Neto e António Mexia
João Manso Neto e António Mexia quando ainda estavam à frente da EDP. Foto Tiago Petinga

Ao fim de doze anos de investigação, o “caso EDP/CMEC” conheceu esta semana finalmente uma acusação por parte do Ministério Público. António Mexia e João Manso Neto foram acusados pela prática do crime de corrupção ativa para ato ilícito de titular de cargo político. Esse titular é Manuel Pinho, que à data dos factos era ministro da Economia e vai responder pelo crime de corrupção passiva, também para ato ilícito, de titular de cargo político. A tese da acusação é que Pinho apoiou a nomeação de António Mexia para liderar a EDP e favoreceu indevidamente essa empresa, mediante contrapartidas.

A proximidade de Manuel Pinho e António Mexia é antiga e vem do tempo em que ambos trabalhavam diretamente com Ricardo Salgado enquanto executivos do Banco Espirito Santo. Proximidade que envolveu laços familiares, com Mexia a tornar-se compadre de Pinho, apadrinhando a filha mais nova do ex-ministro. Ao longo da investigação, o Ministério Público contabilizou 52 encontros a sós entre ambos, em reuniões ou almoços, durante quatro anos, desde que Pinho anunciou Mexia como novo presidente da EDP em 2006.

O favorecimento apontado à EDP urge no âmbito da transição dos Contratos de Aquisição de Energia (CAE) para os Custos de Manutenção do Equilíbrio Contratual (CMEC), “designadamente com a sobrevalorização dos valores dos CMEC, bem como com a entrega das barragens de Alqueva e Pedrógão à Eletricidade de Portugal (EDP) sem concurso público e ainda com o pagamento pela EDP da ida de um ex-ministro para a Universidade de Columbia dar aulas”, relata a acusação, calculando os prejuízos para o Estado e os consumidores de energia em torno de ml milhões de euros.

O então diretor-geral de Energia Miguel Barreto também é acusado neste processo de ter colaborado com o ministro e os dois administradores na "fixação de um montante a pagar pela EDP pela extensão da concessão do domínio público hídrico à EDP em cerca de metade do sustentado pela REN”, além de ter participado na "feitura de legislação do setor da energia e de decisões" à medida dos interesses da EDP, aqui em colaboração com outros dois arguidos: Rui Cartaxo e João Conceição, na altura assessores do gabinete de Pinho. O Ministério Público sustenta que os dois assessores “sabiam que as suas condutas eram criminalmente ilícitas”, mas graças a elas "conseguiram como pretendiam integrar a administração da REN e receber as inerentes remunerações e prémios”, pelo que, tal como Pinho e Barreto, "mercadejaram com os cargos públicos que ocuparam”, sendo agora todos acusados de corrupção passiva.

Jorge Costa
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A reação dos acusados à anunciada decisão do Ministério Público não se fez esperar, com os advogados de Mexia e Manso Neto a considerarem a acusação uma “fuga para a frente”, pois ao fim de doze anos de inquérito ela teria de surgir “sob pena de os titulares da investigação perderem a face”. Para sustentar a falta de fundamento da acusação, os advogados argumentam que “as regras relativas à implementação dos CMEC e à extensão do Domínio Público Hídrico foram fixadas em momento anterior à entrada de António Mexia e João Manso Neto no Conselho de Administração da EDP; não geraram qualquer benefício à empresa; as decisões foram sempre colegiais; e foram devida e amplamente escrutinadas, em particular pela Comissão Europeia”. Referem ainda que o Ministério Público “sempre negou o óbvio, ‘varrendo para debaixo do tapete’ as múltiplas provas que existem no processo e que demonstram a legalidade da atuação dos arguidos, que se limitou à defesa dos interesses da EDP e do Estado”.

Quanto à defesa de João Conceição, os advogados dizem que a acusação estava “há muito anunciada” e reservam para o julgamento a contestação das “muitas inconsistências de várias naturezas (e não apenas jurídicas) que ao longo dos anos tivemos oportunidade de identificar no processo”.

Noutro processo que nasceu a partir deste inquérito, Manuel Pinho foi condenado a dez anos de prisão efetiva por dois crimes de corrupção passiva para acto ilícito, um crime de fraude fiscal e um crime de branqueamento, na primeira vez que um membro do Governo foi condenado por corrupção no exercício de funções. os outros condenados foram Ricardo Salgado a seis anos e três meses e a mulher do ex-ministro, Alexandra Pinho, a quatro anos e oito meses com pena suspensa. O tribunal deu como provada a tese da acusação de que Pinho teria agido para favorecer os interesses do Grupo Espírito Santo em vários projetos a troco de contrapartidas pagas através de offshores em nome de Pinho e da esposa. O grupo era também um dos principais acionistas da EDP.