Médicos exigem "proposta escrita" para retomar negociações com o Governo

05 de outubro 2023 - 13:08

Já são cerca de 2.000 médicos a recusar ultrapassar as 150 horas extraordinárias previstas na lei. Face ao caos nas urgências, o ministro quer reabrir negociações. Sindicatos dizem que as promessas de Pizarro não são novas, mas querem vê-las no papel.

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A líder da FNAM, Joana Bordalo e Sá, com o ministro da Saúde, Manuel Pizarro
A líder da FNAM, Joana Bordalo e Sá, com o ministro da Saúde, Manuel Pizarro, durante um protesto no Porto. Foto Estela Silva/Lusa

A recusa dos médicos em ultrapassar o limite legal de horas extraordinárias já provocou encerramentos de urgências nos hospitais de Barcelos, Caldas da Rainha, Chaves, Guarda, Santarém e Tomar e há mais 24 hospitais onde a dificuldade em preencher escalas para as urgências em outubro pode levar a encerramentos temporários. Os sindicatos avisam que em novembro a situação vai piorar, pois na primeira semana de outubro houve mais 500 médicos a assinarem a minuta de recusa de ultrapassar as 150 horas extraordinárias anuais, em protesto contra as medidas aprovadas de forma unilateral pelo Governo, após 16 meses de negociações com muitas promessas e uma única proposta escrita, apresentada no fim do prazo negocial e que não agradou aos sindicatos.

No final de uma reunião com o ministro Manuel Pizarro, o bastonário da Ordem dos Médicos disse aos jornalistas que o Governo estaria disposto a regressar à mesa das negociações para discutir o regime das 35 horas semanais. E os sindicatos confirmam terem recebido o pedido de agendamento de nova reunião com o Ministério, embora continuem céticos quanto ao seu desfecho.

"Esta e outras promessas foram feitas ao longo dos 16 meses de negociações com os sindicatos, mas nunca foram vertidas num documento escrito por parte do Governo", afirmou a vice-presidente da FNAM, Vitória Martins, ao Diário de Notícias. Da parte desta federação, deixou a certeza de que "já não caímos em deslumbramentos de reuniões. Já passámos essa fase". E para que as negociações sejam sérias, tem de existir "uma proposta escrita do ministério que a FNAM possa avaliar com toda a seriedade e com o objetivo de que possamos todos salvar o SNS", prossegue a sindicalista.

Também o secretário-geral do Sindicato Independente dos Médicos (SIM) desconfia da nova abertura do ministro para negociar.  "Pela experiência que tivemos destes meses de negociação não acredito que de um momento para o outro o Ministério mude de atitude", afirmou Roque da Cunha, acrescentando que "só com uma proposta escrita é que acreditamos que se pode voltar a negociar".

Antes da reunião com o ministro, o bastonário Carlos Cortes tinha reagido às declarações de Pizarro, que apelara aos "elevados padrões deontológicos" dos médicos para manterem as urgências a funcionar. Para o bastonário, “aquilo que se está a pedir neste momento aos médicos é que, além dessas 40 horas mais as 150 horas, possam vir a trabalhar, como acontece atualmente, infelizmente, 50, 60 ou até 80 horas por semana, e eu questiono onde é que está a questão precisamente deontológica e ética. Se é de dar segurança aos profissionais para poderem trabalhar adequadamente, em boas condições de saúde, a quem trabalha 80 horas por semana a fazer muitas vezes dois, três e quatro turnos de urgência, se calhar não oferecem essas condições”.

À saída dessa reunião, Carlos Cortes anunciou que Pizarro estaria disposto a estabelecer um horário base de 35 horas semanais em vez das atuais 40 horas. Mas a vice-presidente da FNAM diz já ter ouvido essa promessa ao longo dos 16 meses de reuniões com o Ministério, sem que alguma vez fosse concretizada por escrito.

"A única proposta escrita colocada em cima da mesa só surgiu na última reunião, a 28 de agosto, e era sobre o regime de dedicação plena. E dela constam medidas que conflituam diretamente com o nosso acordo coletivo de trabalho, que não é transversal para todos os médicos. É um regime que premeia os médicos que estão exclusivamente dedicados à atividade hospitalar no SNS e a FNAM tem defendido uma aproximação da valorização salarial para todos os médicos da ordem dos 30% e sem perda de direitos", referiu Vitória Martins.
 

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