Imigração

Governo abriu “limbo legal” que cria “incentivo à imigração indocumentada”

03 de junho 2024 - 18:40

Mariana Mortágua reagiu ao plano do Governo para acabar com o mecanismo que permite aos imigrantes regularizarem-se quando chegam a Portugal em busca de trabalho. E diz que é “um regresso ao passado” que vai provocar a acumulação de processos e as regularizações extraordinárias ao fim de alguns anos.

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Mariana Mortágua
Mariana Mortágua. Foto de Ana Mendes.

Luís Montenegro apresentou esta segunda-feira um plano para alterar a lei de estrangeiros. A grande mudança é o fim do mecanismo da manifestação de interesse, que permitia aos imigrantes solicitar a regularização da sua situação quando já estão em Portugal a procurar emprego ou mesmo a trabalhar. No plano do Governo, esse pedido só poderá ser feito no consulado português nos países de origem dos imigrantes, solicitando um visto específico de trabalho para poder ter acesso legal ao país.

Durante uma ação de campanha para as europeias na Feira do Livro de Lisboa, a coordenadora do Bloco de Esquerda reagiu à apresentação do plano e começou por sublinhar que “em Portugal não há imigrantes a mais, há um problema de regularização de imigrantes e de acolhimento de imigrantes”. E por isso é urgente “regularizar todos os processos pendentes da AIMA”. Mariana Mortágua afirma que é preciso reconhecer que “a AIMA não funcionou bem”, mas também que “ninguém pode viver a sua vida num limbo e a regularização é o primeiro passo para o acolhimento e integração destas pessoas”.

Sobre o plano apresentado pelo Governo, Mariana Mortágua afirmou que ele “abre um vazio legal”, pois ao extinguir a manifestação de interesse - “que é um mecanismo que também tinha problemas na sua aplicação prática - o Governo está a eliminar a possibilidade de alguém que chega a Portugal e encontra trabalho se puder regularizar”.

“O Governo diz que só é regular em Portugal quem vier regular de fora. Mas quem já está ou quem chegar a Portugal à procura de trabalho não vai poder regularizar-se. Esta lei já existiu em Portugal no passado. O que é que acontece? As pessoas chegam indocumentadas a Portugal porque a economia precisa delas e depois não têm simplesmente forma de se regularizar. E depois, de x em x tempo, os processos acumulam-se e obrigam a uma regularização extraordinária”, explicou a coordenadora do Bloco, concluindo que “o que está a ser feito pelo Governo com este vazio legal é um incentivo à imigração indocumentada”, pois ele “retira da lei um mecanismo que existia para regularizar pessoas”.

“Se o Governo diz que o único mecanismo que existia para quem procura de trabalho se poder regularizar deixa de existir e que as pessoas só podem ser regulares se fizerem esse pedido no consulado no país de origem, isso quer dizer que à chegada não há uma forma de regularizar as pessoas”, resumiu Mariana Mortágua, lembrando que as pessoas vêm para Portugal para trabalhar e porque há trabalho nas diferentes áreas. “São os patrões que o dizem, na agricultura, no turismo e na hotelaria”, acrescentou. 

A coordenadora do Bloco de Esquerda rejeita ainda a dicotomia das “portas abertas e fechadas” que invadiu o discurso político, pois mesmo os países com leis mais draconianas para restringir a entrada de imigrantes não evitaram que as pessoas continuem a chegar para procurar trabalho ou fugir da guerra.

Por isso, defende que “a escolha não é entre portas abertas ou fechadas, é entre ter imigrantes documentados, integrados e acolhidos, ou imigrantes ilegais, indocumentados e sem qualquer tipo de acolhimento”. Nesse sentido, o Bloco mantém a sua proposta para a regularização extraordinária de todos os processos pendentes e a criação de um mecanismo que permita a quem procura trabalho poder fazê-lo de forma regular em Portugal.

Questionada pelos jornalistas sobre os cortes dos apoios sociais aos imigrantes propostos pela extrema-direita, Mariana Mortágua respondeu que “a nossa Constituição diz que as pessoas são iguais em direitos e deveres”. E lembrou também que neste momento “os imigrantes estão a pagar as reformas dos portugueses, não é o contrário. Não há dinheiro da Segurança Social a pagar apoios dos imigrantes porque quando fazemos o saldo entre o que é pago e recebido os imigrantes pagam mais do que recebem”. Assim, “quem tem propostas desse género o que está a querer dizer é que não quer esse dinheiro e esse financiamento”.

Catarina Martins: “O meu compromisso é para reverter o Pacto das Migrações”

Ao lado da coordenadora do Bloco estava Catarina Martins, que colocou o anúncio do Governo no plano do debate europeu sobre migrações, considerando-o “um passo profundamente negativo” de Luís Montenegro, depois de o PSD ter votado a favor do Pacto para as Migrações ao lado do PS, PSD, CDS e o grupo dos liberais. Catarina lembrou que este pacto foi “condenado pela Unicef, que apelou a que não fosse aprovado porque prevê a detenção de crianças”.

“O Governo não devia aceitar o pior que há do ponto de vista do ataque aos direitos humanos. No Parlamento Europeu, o meu compromisso é para reverter o Pacto das Migrações”, defendeu a candidata do Bloco às eleições do próximo domingo.

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