Poluição

Contestação à celulose da Altri ganha força na Galiza

19 de junho 2024 - 16:01

Aumenta a contestação social ao projeto inicialmente apresentado como uma fábrica sustentável de fibras têxteis vegetais e que não passa afinal de uma mega-fábrica de celulose que ameaça o ar e o rio.

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Artic Sunrise no protesto em águas galegas
Artic Sunrise no protesto em águas galegas. Foto Greenpeace Espanha

O protesto contra a fábrica de celulose que a Altri quer construir junto ao rio Ulla em Palas de Rei, na província galega de Lugo, ganhou na quarta-feira projeção internacional com a entrada em cena do Artic Sunrise. O famoso quebra-gelo da Greenpeace entrou na ria de Arousa acompanhado de centenas de embarcações de pescadores e mariscadores galegos que temem pelo futuro do estuário onde desembocaria o produto das descargas da fábrica. Ao mesmo tempo, milhares de pessoas manifestavam-se em terra contra o projeto da Altri, convocadas pelas plataformas Ulloa Viva e Em defesa da Ria de Arousa.

Para a Greenpeace, trata-se de “um pesadelo num espaço galego da Rede Natura: uma enorme fábrica de celulose que usará milhões de litros de água por dia, fará descarfas de água contaminada de volta aos rios, emitirá gases tóxicos, porá em risco os setires primários e requerirá que se plante muito mais eucalipto no norte, empobrecendo a biodiversidade”. Para os mariscadores da ria de Arousa, a instalação da celulose na cabeceira do rio pode significar a sentença de morte para a apanha do marisco, à semelhança do que aconteceu na ria de Pontevedra por causa das descargas da celulose da Ence.

Em números, os ambientalistas resumem o impacto deste projeto: 46 milhões de litros extraídos diariamente do rio Ulla - a mesma quantidade que consome toda a província de Lugo -, 30 milhões de litros diários de águas contaminadas devolvidas ao rio, uma  chaminé com 75 metros de altura junto ao Caminho de Santiago a emitir gases tóxicos, 2,4 milhões de toneladas de eucalipto necessárias para a alimentar e 250 milhões de euros de fundos públicos europeus a pagar à Altri para concretizar todo este projeto que ameaça o ecossistema e a vida das comunidades locais.

Na fase de discussão pública do estudo de impacto ambiental enviado ao governo galego, foram entregues mais de 23 mil contributos de pessoas e associações a contestar o projeto e a chamar a atenção para esta ameaça ambiental. No dia 26 de maio, mais de 20 mil pessoas manifestaram-se em Palas de Rei, localidade com menos de quatro mil habitantes, o que demonstra como a oposição alastrou a toda a Galiza.

PP apoiou o projeto desde o lançamento, PS galego acusado de indefinição 

Desde o início que este projeto da Altri é apadrinhado pelo PP, que ocupa há décadas a liderança do governo galego. Para o promover junto das entidades públicas e facilitar o acesso a fundos europeus, a Altri contratou uma consultora do ex-ministro e eurodeputado socialista José Blanco, natural precisamente de Palas de Rei. O atual líder dos socialistas galegos tem sido criticado por não exprimir com clareza a sua posição face ao projeto, apesar de as estruturas locais e a juventude do partido se declararem ao lado dos que se opõem à celulose, tal como o fez o Bloco Nacionalista Galego.

No início, o projeto recolheu algum consenso ao ser apresentado como uma fábrica ecológica de reciclagem de fibras têxteis que privilegiaria a economia circular ao usar materiais galegos para a produzir os têxteis “verdes” da moda do futuro. Mas à medida que os planos da Altri para a unidade fabril eram divulgados, logo se percebeu que isso não passava de uma campanha de greenwashing para disfarçar uma gigantesca fábrica de celulose .

Com o fracasso da operação de propaganda e a contestação das populações a subir de tom, o CEO da Altri, José Soares de Pina, foi obrigado a ir à Galiza dar explicações no início de junho e tentar convencer a opinião pública de que os argumentos dos ambientalistas “não são verdadeiros” e que há “muita desinformação” no que se diz sobre a fábrica. Mas acabou por admitir que “não fazemos investimentos em comunidades que não os querem.”