Direitos Humanos

Amnistia Internacional destaca problemas em Portugal

24 de abril 2024 - 13:55

Racismo, violência policial, violência de género, desalojamentos forçados, más condições de habitação e nas prisões são algumas das violações dos direitos humanos ocorridas em Portugal e que constam do relatório da organização publicado esta quarta-feira. No plano mundial, vive-se uma situação de “quase colapso do direito internacional”.

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Manifestante com cartaz sobre luta pelos direitos humanos.
Manifestante com cartaz sobre luta pelos direitos humanos.

No seu relatório anual sobre o estado dos direitos humanos no mundo em 2023, divulgado esta quarta-feira, a Amnistia Internacional denuncia que persistem em Portugal situações de racismo, violência policial, violência de género, desalojamentos forçados, más condições de habitação e nas prisões.

No documento referem-se vários casos que ilustram situações destas, como o dos sete agentes policiais que, estando acusados de torturar imigrantes, puderam continuar em funções. E que, em junho, o Tribunal da Relação de Évora absolveu um polícia militar e reduziu penas a quatro agentes policiais que foram condenados por tortura de imigrantes em Odemira.

Sobre a situação de detidos e presos, recorre-se ainda às conclusões do Comité para a Prevenção da Tortura do Conselho da Europa que avaliou os maus-tratos a detidos como uma prática persistente no país e também a um relatório do Provedor de Justiça que apontava para uma taxa média de ocupação das prisões no final de 2022 de 100,8%, com 25 das 49 prisões sobrelotadas.

Sobre violência de género destaca-se a baixa taxa de acusações de suspeitos e a “insuficiente oferta de abrigos” para as vítimas. A referência aqui é, por exemplo, ao Comité dos Direitos Económicos, Sociais e Culturais das Nações Unidas que tinha sublinhado o “elevado e persistente nível de violência doméstica” no país.

E sobre habitação informa-se que o número de famílias sem habitação adequada triplicou face a 2018 e que Portugal atingiu um nível recorde de sem-abrigo. Os dados aqui referidos são do Instituto Nacional de Estatística, de janeiro, de onde se conclui que 86.000 pessoas vivem em situação de carência habitacional, com 9,2% em casas sobrelotadas, quase 20% das famílias em situação de pobreza.

Pedro Neto, diretor-executivo da Amnistia Internacional em Portugal, sublinha à Rádio Renascença que “em vários municípios do país continuam a haver desalojamentos que acontecem de uma forma conflituosa, o que prova que as políticas públicas e as boas práticas não estão a ser seguidas. Não vale tudo”.

Outro tipo de violação dos direitos em Portugal é o tráfico de seres humanos. Os números oficiais da segurança interna de março passado notam que foram detetadas 235 vítimas, um aumento na ordem dos 18,2%, quase metade por “exploração laboral”: “principalmente no setor da agricultura, mas também no futebol e em servidão doméstica”, conclui-se, sendo Beja e Leiria as zonas mais afetadas e as vítimas sobretudo do Nepal e da Índia, apesar de também haver migrantes de outras nacionalidades.

Direitos humanos ameaçados em todo o mundo: “quase colapso do direito internacional”

No mundo inteiro intensificam-se guerras, repressão, para além da falta de garantias de direitos mínimos como o acesso à alimentação, à saúde e educação. A degradação ambiental das comunidades marginalizadas é também um problema referido.

A organização critica que “governos poderosos remetem a humanidade para uma era destituída de um Estado de direito internacional efetivo, onde os civis em conflitos são os mais prejudicados”. Defende-se que “o mundo está a vivenciar as consequências terríveis da intensificação dos conflitos e do quase colapso do direito internacional” e destaca-se que “a rápida evolução da inteligência artificial pode criar um terreno fértil para o racismo, a discriminação e a divisão num ano de importantes eleições públicas”. E também o “domínio das grandes empresas tecnológicas” é uma ameaça que pode “provocar um aumento das violações dos direitos humanos se a regulamentação não acompanhar a inovação”.

Denuncia-se que “as plataformas das grandes empresas tecnológicas têm alimentado os conflitos”, que “o spyware e a vigilância em massa são utilizados para restringir o exercício dos direitos e das liberdades fundamentais, enquanto os governos adotam ferramentas automatizadas que visam os grupos mais marginalizados da sociedade”. Tecnologias “como a inteligência artificial generativa, o reconhecimento facial e o software de espionagem estão prestes a tornar-se um inimigo perigoso, com capacidade para aumentar e alimentar as violações do direito internacional e dos direitos humanos até limites extremos”, afirma Agnès Callamard, secretária-geral da organização.

Esta conclui que há um “quadro sombrio de repressão alarmante dos direitos humanos e de frequentes violações internacionais das normas estabelecidas, num cenário de crescente desigualdade global, de superpotências que disputam a supremacia e de uma crise climática cada vez mais grave”.

Realça-se ainda o “flagrante desrespeito do Estado de Israel pelo direito internacional” que “é agravado pela inação dos seus aliados para pôr termo ao indescritível massacre de civis imposto na Faixa de Gaza”. Isto “a par da atual agressão russa na Ucrânia, do número crescente de conflitos armados e das violações massivas dos direitos humanos em países como o Sudão, a Etiópia e Myanmar”. A conclusão é que “a ordem mundial baseada em normas corre o risco de se desmoronar”.