Na madrugada desta quinta-feira, a polícia russa invadiu a casa de Mikhail Lobanov, arrancando a porta de entrada e levando-o preso. Esta foi apenas uma das detenções que tiveram lugar na capital russa, mas também em São Petersburgo, Novgrod e outras cidades. Segundo o Moscow Times, que cita a RIA Novosti, foram também alvo destes raides a antiga deputada municipal Galina Filchenko e Nodari Khananashvili, ambos membros do partido liberal Yabloko.
Os alvos terão sido políticos da oposição e jornalistas e esta não é a primeira vez que as operações policiais têm Lobanov como alvo. Em dezembro passado, o sono do professor de matemática foi também interrompido pela presença de agentes da polícia a invadirem a casa, espancando-o e levando-o para a prisão onde ficou detido durante 15 dias por "desobediência à polícia". Tal como agora, a intenção anunciada da polícia russa é a de descobrir ligações ao ex-deputado Ilya Ponomarev, que foi o único na Duma a votar contra a anexação da Crimeia em 2014 e que nesse ano fugiu para os Estados Unidos, mudando-se em seguida para a Ucrânia, onde ainda vive.
Polícia inventa ligações ao ex-deputado Ilya Ponomarev
Com o início da invasão russa da Ucrânia, Ponomarev juntou-se aos grupos de defesa territorial e abriu dois canais no Youtube, onde apela à resistência armada dos russos contra o regime de Putin. Depois criou um "parlamento no exílio", que reuniu pela segunda vez em abril deste ano na Polónia, juntando algumas dezenas de antigos eleitos do parlamento russo e autarquias de vários setores políticos, incluindo do partido no poder, o Rússia Unida. Mas a sua legitimidade é contestada por outros setores da oposição que ao contrário dos membros deste grupo foram impedidos de se candidatar nas eleições russas. E o alcance de Ponomarev no Youtube, com os seus cerca de 100 mil seguidores, está muito aquém dos 6,3 milhões de Alexei Navalny, atualmente na prisão, ou do pouco menos de um milhão de subscritores do canal do oligarca exilado Mikhail Khodorkovsky.
Entrevistado pela Newsweek, Ponomarev afirmou não conhecer Lobanov. "Eles pegam em pessoas de quem não gostam e fabricam provas para mostrar que têm alguma ligação". E disse que o professor e ativista "é um bicho estranho na política russa atual, porque está muito à esquerda e é um líder para o sindicato estudantil em Moscovo".
"Claro que isso é uma ameaça potencial verdadeira. Eles não têm medo de liberais. Têm medo de esquerdistas, nacionalistas, porque sabem que estes têm um apoio de base que os liberais não têm. E é por isso que atacam especificamente as pessoas de esquerda", afirmou o ex-deputado que é muitas vezes criticado pelos seus pares no "parlamento no exílio" pelos seus elogios aos bolcheviques. Em Moscovo, foi colocado nas listas oficiais de agentes estrangeiros, terroristas e extremistas.
Quanto a Lobanov, que também nega alguma vez ter conhecido Ponomarev, tornou-se conhecido internacionalmente após a eleição em que derrotou o candidato do partido de Putin, o propagandista televisivo Yevgeny Popov, no seu círculo em Moscovo por 12 pontos percentuais de diferença, para ver em seguida a vitória ser-lhe retirada na contagem eletrónica. Professor de Matemática na Universidade Estatal de Moscovo, assume o seu posicionamento político à esquerda e aceitou nesse ano o convite do Partido Comunista da Federação Russa para integrar as listas como independente, depois de organizar estudantes e professores em torno do sindicato "Solidariedade Universitária", como explicou numa entrevista à Jacobin que o Esquerda.net publicou após essa fraude eleitoral.
Desde então este ativista tem continuado a pronunciar-se contra a guerra de Putin na Ucrânia e em junho passado foi detido e preso durante 15 dias por empunhar um cartaz onde se lia "Não à Guerra". A partir daí tem sido alvo de campanhas de difamação e ameaças telefónicas e nas redes sociais, além das duas rusgas policiais a meio da noite e das prisões subsequentes. Desta vez, os seus advogados dizem que é acusado de "espalhar informação falsa sobre os militares" e de "justificação do terrorismo", as acusações habituais aos ativistas anti-guerra e que podem valer a Mikhail Lobanov uma pena de prisão até sete anos.