Em conferência de imprensa, o Comissário-Geral da Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados da Palestina no Próximo Oriente (UNRWA) afirmou que “já são quase seis semanas de inferno para o povo de Gaza” e quase seis semanas de “total desrespeito pelas leis humanitárias internacionais”
Philippe Lazzarini assinalou que a “escala de destruição e perda” a que estamos a assistir em Gaza é “assombrosa”. O responsável da UNRWA fez referência ao êxodo massivo de “pessoas forçadas a sair das suas casas” que procuram segurança no Sul: “Testemunhámos, nas últimas semanas, o maior deslocamento de palestinianos desde 1948”, frisou.
Philippe Lazzarini deu conta dos testemunhos da equipa da UNRWA no terreno, que, esta semana, recebeu no sul pessoas que caminharam horas e horas e se encontravam “desidratadas, com fome, exaustas e ainda em choque”. O representante das Nações Unidas realçou que o povo de Gaza “está num enclave sem qualquer saída”, e que esse enclave diminuiu para metade.
Assinalando que os palestinianos foram “despidos da sua dignidade”, Philippe Lazzarini partilhou algumas das imagens que o acompanham da sua visita a uma escola da UNRWA em Gaza, onde crianças imploravam por um pouco de água ou um pedaço de pão. Na esmagadora maioria das instalações humanitárias não há água, existem locais onde só está disponível uma casa de banho para largas centenas de pessoas, muitas das quais deixaram tudo para trás, só têm a roupa do corpo.
O representante da ONU vincou que o cerco, “próprio da época medieval”, constitui uma “punição coletiva imposta a toda uma população”.
Philippe Lazzarini esclareceu ainda que “não há nenhum lugar seguro em Gaza”. O sul, onde se registou um terço das mortes não é seguro, bem como não são seguras as instalações das Nações Unidas. Com, pelo menos, 103 colegas mortos nos ataques israelitas, o responsável da UNRWA teme que muitos outros estejam soterrados nos escombros.
Philippe Lazzarini contrariou todos os argumentos israelitas sobre a falta de segurança das operações da UNRWA, no sentido de beneficiarem os combatentes do Hamas, e refutou também a justificação de Israel para os ataques a escolas da agência. Lazzarini destacou que as escolas da UNRWA não ensinam qualquer tipo de ódio, que o sistema escolar em Gaza é reconhecido pela sua excelência. Acresce que a agência e as suas atividades são minuciosamente escrutinadas. Neste contexto, Philippe Lazzarini questiona as motivações de quem lança estas suspeitas.
UNRWA corre o risco de encerrar todo o seu trabalho humanitário
O Comissário-Geral da UNRWA alerta que a agência, que apoia mais de 800 mil pessoas deslocadas em Gaza, pode ter de suspender todas as suas atividades humanitárias devido à falta de combustível.
“Acredito que há uma tentativa deliberada de estrangular a nossa operação e paralisar a operação da UNRWA. Durante semanas a fio temos implorado, alertado para o impacto da falta de combustível”, disse. Philippe Lazzarini explicou que, nas últimas semanas, a agência conseguiu aproveitar as reservas de combustível restantes no território. “Mas agora estão a acabar”, e “corremos o risco de ter de suspender toda a operação humanitária”, advertiu.
“We have just witnessed over the last few weeks the largest displacement of Palestinians since 1948.”
– @UNRWA chief @UNLazzarini says the scale of destruction and loss in Gaza is staggering as lack of fuel jeopardizes entire humanitarian response. https://t.co/CKNjiiFi3X pic.twitter.com/sBE5V6lBp7
— United Nations (@UN) November 16, 2023
Israel cortou os envios de combustível para a Faixa de Gaza como parte de um “cerco total” ao enclave. O primeiro camião de combustível a entrar em Gaza desde que Israel impôs o cerco chegou na quarta-feira. A UNRWA recebeu 23.000 litros de combustível, o equivalente a metade de um camião. E as autoridades israelitas restringiram a sua utilização exclusivamente para o transporte de ajuda proveniente do Egipto. Philippe Lazzarini disse que são necessários 160 mil litros por dia apenas para executar operações humanitárias básicas. “Acredito que é ultrajante que as agências humanitárias tenham sido reduzidas à mendicidade por combustível”, realçou.
O responsável da ONU apontou que as condições humanitárias deterioraram-se gravemente, uma vez que 70 por cento da população no sul de Gaza não tem acesso a água potável e o esgoto começou a fluir para as ruas. O combustível, agora inexistente, é necessário, nomeadamente, para os equipamentos de dessalinização de água, e para o sistema de bombeamento de esgoto.
There will NOT be a cross-border aid operation at the Rafah Crossing tomorrow.
The communications network in #Gaza is down because there is NO fuel.
This makes it impossible to manage or coordinate humanitarian aid convoys. pic.twitter.com/Kaj8z0lE9f
— UNRWA (@UNRWA) November 16, 2023
Sobre o apagão das comunicações anunciado na quinta-feira pelas empresas de telecomunicações palestinas Jawwal e Paltel que esgotaram todas as suas fontes de energia que a sustentam, Philippe Lazzarini avançou que o mesmo “torna impossível gerir ou coordenar comboios de ajuda humanitária”. O Comissário-Geral da UNRWA acusa Israel de estar a utilizar o combustível como “arma de guerra”. “Hoje o que estamos a dizer é que se o combustível não entrar, as pessoas vão começar a morrer por falta de combustível”, salientou.