Alterações climáticas

Mortes por excesso de calor na Europa podem triplicar até ao fim do século

22 de agosto 2024 - 12:03

Estudo publicado na revista Lancet Public Health diz que Portugal e os países do sul serão os mais afetados. Se o aumento da temperatura chegar aos 3°C ou 4°C, o excesso de mortalidade por causa do calor vai ultrapassar em muitos países a queda prevista das mortes por frio. 

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homem a sair da estação de metro
Foto de Paulete Matos

Num cenário de aumento da temperatura média global de 3°C em relação à era pós-industrial até ao fim do século - o dobro da meta do Acordo de Paris -, o excesso de calor pode matar 129 mil pessoas por ano na Europa, face às 44 mil mortes anuais que se registam hoje em dia. A conclusão é de um estudo científico publicado esta quarta-feira na revista Lancet Public Health. Num cenário extremo de aumento de 4°C, o número de mortes iria ascender a 207 mil, indica o mesmo estudo.

Hoje em dia é o excesso de frio que mais mata na Europa e isso não se alterará até ao ano 2100 mesmo no cenário mais extremo deste estudo. Ao todo morrem hoje cerca de 407 mil pessoas por causa do excesso de frio e de calor na Europa e mesmo se a meta de 1,5°C de aumento da temperatura do Acordo de Paris fosse cumprida, o número de mortes em 2100 seria mais elevado, ascendendo a quase 450 mil. Num cenário de aumento de 3°C, a previsão é de cerca de 462 mil mortes. Ou seja, em termos gerais a diminuição da mortalidade por excesso de frio não compensa o aumento por excesso de calor.

Nas projeções para Portugal, os cientistas preveem um pequeno aumento da mortalidade por excesso de calor no cenário da subida de 1,5°C da temperatura média, passando das atuais 1.008 mortes para as 1.038. Um número que sobe para 1.362 com um aumento de 2°C e dispara para as 2.284 com um aumento de 3°C e para as 3.448 com um aumento de 4°C, o que é mais do triplo das mortes atuais. No mesmo cenário extremo, a queda da mortalidade por excesso de frio, que é a que provoca mais vítimas em todos os países europeus, seria para cerca de metade no caso português, passando das atuais 7.345 mortes para 3.822.

No conjunto da Europa, apontam os cientistas, o rácio de mortes por frio para as mortes por calor, que hoje é de oito para um, tenderá a baixar substancialmente até ao fim do século, com a queda gradual das primeiras e o grande aumento das segundas. A faixa etária mais afetada será a dos maiores de 85 anos, que é a mais vulnerável às temperaturas extremas e será bem mais numerosa no fim do século graças ao aumento da esperança de vida. Mas se as mortes por excesso de frio num cenário de aumento da temperatura média de 3°C não se irão reduzir em todos os países, prevendo-se mesmo um aumento na Polónia, Chéquia, Irlanda e algumas regiões escandinavas, no caso das mortes por excesso de calor o aumento ocorre em todos os países e será mais acentuado nos países do Sul da Europa.

Os resultados deste estudo mostram o efeito combinado do aumento das temperaturas e do envelhecimento da população previsto para a Europa até ao fim do século, embora a amostra esteja limitada à população urbana de cidades médias e grandes, em geral mais suscetíveis aos efeitos das cada vez mais frequentes ondas de calor.

Nas suas conclusões, os cientistas chamam a atenção para a importância do ordenamento do território e das normas de construção como instrumentos das políticas de adaptação às alterações climáticas para reduzir os riscos para a saúde. E defendem que seja dada prioridade às “regiões com elevado desemprego, pobreza, mudanças económicas estruturais, emigração e envelhecimento da população, uma vez que têm uma menor capacidade de adaptação aos impactos das alterações climáticas e, simultaneamente, são pontos críticos onde a morte relacionada com o calor se materializará mais intensamente nos próximos anos”.