Ana Paula Martins tinha garantido em julho que as grávidas da margem sul deixariam de ter de atravessar o Tejo para chegar a um hospital com urgências abertas ao fim de semana já em setembro. Disse mesmo que já estavam a avançar com a contratação de médicos para assegurar o funcionamento da urgência de Obstetrícia e Ginecologia do Hospital Garcia de Orta.
Mas a promessa da ministra de nada valeu às grávidas este fim de semana, com o Ministério a descartar-se de responsabilidades pelo novo enceramento de todas as urgências obstétricas da margem sul. "Este fim de semana, sem que nada o fizesse prever, e à última hora, os médicos prestadores de serviços que asseguram regularmente que as populações da Península de Setúbal têm o serviço que lhes é devido, manifestaram a sua indisponibilidade" para trabalhar. Estes médicos tarefeiros complementam as equipas formadas por médicos dos quadros para manter o número mínimo de profissionais na urgência.
Em declarações ao Público, a líder da Federação Nacional dos Médicos (FNAM), Joana Bordalo e Sá, considera “inaceitável” esta transferência de culpas para os tarefeiros quando é o próprio Governo a não tomar medidas para atrair e fixar médicos nos quadros do SNS. E acusa a ministra de ter feito “pura propaganda eleitoral” nas vésperas das autárquicas com a sua promessa e de ter criado “uma desigualdade entre os próprios médicos do quadro” ao ir recrutar “com condições especiais” alguns médicos ao privado. Mesmo assim insuficientes para cobrir todas as escalas, pois só quatro dos sete médicos em falta aceitaram a proposta.
A sindicalista acrescenta que o problema não é exclusivo do Garcia de Orta. “Barreiro, Setúbal, Vila Franca de Xira, Leiria e Aveiro têm falta de médicos. Temos a obstetrícia a colapsar”, diz Joana Bordalo Sá.
“Sem carreiras estáveis e atrativas, não haverá futuro para o SNS”
Em comunicado divulgado esta segunda-feira para assinalar os 46 anos do SNS, a FNAM acusa o atual governo do PSD/CDS de “manter o subfinanciamento crónico, empurrar os profissionais para fora do serviço público e abrir espaço aos privados, que aguardam o retorno dos 1000 milhões de euros de investimento que têm vindo a ser anunciados”.
Para a federação sindical dos médicos, o caminho tem de ser outro, em que a saúde não seja gerida com “lógicas de produção nem com incentivos que tratam os médicos como peças descartáveis” através de “horas extraordinárias sem fim” e “objetivos impostos como numa fábrica”.
A falta de condições dignas de trabalho e um salário desajustado face à exigência e responsabilidade da profissão são as razões que levam cada vez mais médicos a abandonar o SNS. “Sem carreiras estáveis e atrativas, não haverá futuro para o SNS”, insiste a FNAM, exigindo por isso a “abertura imediata de negociações sérias, para garantir condições justas para os médicos e um SNS capaz de responder a todos”.