O realizador português Miguel Gomes venceu o prémio de melhor realização da 77.ª edição do Festival de Cinema de Cannes pelo filme Grand Tour.
Na conferência de imprensa que deu em Cannes sobre a obra explicou que este é “sobre a determinação das mulheres e a cobardia dos homens”.
O filme tem argumento seu e de Mariana Ricardo, Telmo Churro e Maureen Fazendeiro. E é apresentado como seguindo um romance de início do século XX no qual Edward (representado por Gonçalo Waddington) é um oficial do império britânico que foge da noiva Molly (representada por Crista Alfaiate) no dia em que ela chega para o casamento. Na sinopse da obra escreve-se sobre ele que “contemplando o vazio da sua existência, o cobarde Edward interroga-se sobre o que terá acontecido a Molly… Desafiada pelo impulso de Edward e decidida a casar-se com ele, Molly segue o rasto do noivo em fuga através deste ‘Grand Tour’ asiático”.
Esta grande volta é filmada a preto e branco e toma como ponto de referência o livro de viagens "Um gentleman na Ásia" de Sommerset Maugham. Para o preparar, o realizador foi recolhendo imagens e sons de países como Myanmar, Vietname, Tailândia, Japão ainda antes da pandemia. O trabalho com os atores, feito num estúdio de Roma, foi depois acrescentado.
No discurso de aceitação do galardão, Miguel Gomes começou por dizer que "por vezes tenho sorte" e depois fez questão de chamar toda a equipa que fez o filme. Agradeceu também ao cinema português e aos "grandes mestres" como Manoel de Oliveira que o "inspiraram a fazer filmes".
Outro português esteve também em destaque. Daniel Soares recebeu uma Menção Especial do júri na secção de curtas metragens por “Mau Por um Momento”.
O vencedor do maior prémio do festival, a Palma de Ouro, foi "Anora" de Sean Baker. Um filme que conta a história de uma trabalhadora do sexo que casa em Las Vegas com um russo filho de oligarcas.
Mohammad Rasoulof venceu o prémio FIPRESCI da crítica internacional e o do Júri Ecuménico por “As sementes da figueira selvagem”. O realizador foi aclamado com uma longa salva de palmas depois de ter conseguido fugir do Irão onde tinha sido condenado a oito anos de prisão.
A obra é sobre os problemas familiares causados devido ao pai ser juiz na altura dos protestos sobre a morte de Mahsa Amini que tinha sido presa por não usar corretamente o véu islâmico. O júri da Federação Internacional de Críticos de Cinema considera-a "uma história corajosa passada no Irão moderno que aborda o conflito entre tradição e progresso de uma forma muito poderosa e imaginativa". O Júri Ecuménico afirma ser "uma metáfora de qualquer teocracia autoritária", escrevendo na justificação do prémio que "quando a religião está associada ao poder político e ao patriarcado, pode destruir as relações mais íntimas e a dignidade dos indivíduos, como acontece neste drama familiar iraniano".
Destaque ainda para a atriz espanhola Karla Sofía Gascón que se tornou a primeira mulher trans a ganhar o prémio de melhor atriz pelo seu trabalho em “Emilia Pérez”. Trata-se de um musical de Jacques Audiard sobre uma narcotraficante trans e o prémio foi conjunto com as outras atrizes da película Zoe Saldaña e Selena Gómez. No discurso de aceitação , falar além da família e dos colegas dedicou o prémio ainda a “todas as pessoas trans que estamos a sofrer com o ódio e a ver como nos denigrem”, acrescentando que “amanhã esta notícia estará cheia de comentário de gente terrível dizendo coisas terríveis acerca de nós”.