Jatos privados: Portugal ocupa pódio de países com maior intensidade carbónica

02 de abril 2023 - 13:46

Relatório da Greenpeace aponta que, em 2022, Portugal foi o segundo país europeu a apresentar rotas da aviação privada com maior intensidade de emissões de dióxido de carbono. E está na lista dos dez países com mais emissões causadas pelos voos de jatos privados.

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Autor: Matti Blume Direitos de autor: CC-BY-SA 4.0 Matti Blume

De acordo com o documento, citado pelo jornal Público, no ano passado, a rota entre os aeroportos de Lisboa e Tires, com uma distância de apenas 20,37 quilómetros, colocou Portugal no segundo lugar do pódio dos países europeus com rotas de aviação privada com maior intensidade de emissões de dióxido de carbono (CO2). Os 118 voos registados em 2022 traduziram-se na emissão de 261 toneladas de dióxido de carbono (CO2). Estes números representam um aumento face a 2021, ano em que se realizaram 97 voos e foram emitidas 189 toneladas de CO2. Mas, à época, a rota Lisboa-Tires já ocupava a terceira posição das mais intensas em emissões de CO2.

“É óbvio que rotas mais curtas terão uma intensidade de CO2 mais elevada, porque o incremento de 95 quilómetros [de emissões] terá um maior peso relativo”, apontam os peritos.

A este respeito, é de referir que a rota que ocupa o primeiro lugar do pódio da intensidade carbónica é a que liga Farnborough, multinacional de armas, segurança e aeroespacial BAE Systems, a maior empresa de defesa europeia, a Blackbushe, perto de Londres.

O relatório da consultora ambiental CE Delft e da organização ambientalista Greenpeace refere ainda que Portugal está em nono lugar na lista dos países europeus com mais emissões: para 7.994 voos teve um total de 65.323 toneladas de emissões.

Em comunicado de imprensa, a Greenpeace alerta que “as emissões de CO2 médias de cada voo de avião privado na Europa em 2022 foram 5,9 toneladas, o que é mais do que conduzir um carro médio a gasolina durante 23 mil quilómetros — ou viajar de Roma a Paris 16 vezes”.

“É tremendamente injusto que pessoas ricas possam causar danos ao clima desta maneira, poluindo mais do que uma viagem de 23 mil quilómetros num só voo. A poluição devido a luxos perdulários deve ser a primeira coisa a eliminar. Precisamos de uma proibição dos voos de jatos privados”, defende Thomas Gelin, ativista da Greenpeace para a área dos transportes.

Com exceção do ano de 2020, com o despoletar da pandemia de covid-19, o tráfego de passageiros em aviões privados aumentou de forma quase ininterrupta.

Em 2021, foram registados 350.078 voos privados, mais do que o dobro do ano anterior. A emissão de 1.637.623 toneladas de dióxido de carbono foi 4,6 vezes superior a 2020. Em 2022, foram, por sua vez, registados 572.806 voos de jatos privados, o equivalente a uma emissão de 3.385.538 toneladas de CO2.

Conforme assinala um estudo de 2021 da organização não-governamental Transporte e Ambiente, os aviões privados apresentam uma intensidade carbónica dez vezes superior, em média, ao dos voos de companhias de transporte coletivo de passageiros, sendo ainda 50 vezes mais poluidores do que os comboios.

Cientistas e sociedade civil prometem ação direta

Os grupos "Abolir Jatos Privados", "Climáximo", e "Scientist Rebellion Portugal" afirmaram-se “indignados com a inação institucional face ao meio de transporte mais injusto e poluente”. E prometem “ir para além da lei para confrontar a maior crise que já enfrentámos”.

“Enquanto Guterres afirma que estamos numa "autoestrada para o inferno", e os mais respeitados orgãos científicos das Nações Unidas desesperam por ação urgente, o governo português parece responder ao ritmo de um projeto suicida. Uma viagem tão curta como Lisboa-Tires (20.37km) pauta a vergonha internacional de ser o 2º troço mais intensivo de carbono da Europa, quando demoraria menos de 1h a percorrer de transportes públicos”, escrevem os ativistas.

Os coletivos comprometem-se a, em 2023, “escalar as ações contra jatos privados em Portugal, de forma a garantir” a “inviabilização dos meios que põem em risco a sobrevivência da nossa espécie”.

Proposta do Bloco para limitar jatos privados foi chumbada no Parlamento

Em dezembro do ano passado, o Bloco levou a debate no Parlamento um projeto de lei para limitar a aterragem e descolagem de jatos privados em Portugal. À época, Pedro Filipe Soares lembrou que "uma viagem em jato privado é 10 vezes mais intensiva em termos energéticos que num avião comercial e 50 vezes mais intensiva que num comboio". E que "este capricho dos super-ricos tem um enorme custo ambiental".

"Num momento em que o mundo tem de responder ao flagelo das alterações climáticas, os super-ricos não podem ter um privilégio de super-poluição", prosseguiu Pedro Filipe.

A proposta bloquista foi chumbada pelo PS, PSD, Chega e Iniciativa Liberal, com a abstenção do PCP.