Independentistas catalães querem "aproveitar a oportunidade

11 de setembro 2023 - 20:06

Durante as celebrações do Dia da Catalunha e com as negociações do próximo governo espanhol como pano de fundo, a Òmnium Cultural avançou com um número: 1.432 pessoas devem ser abrangidas pela lei da amnistia.

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Manifestação da Diada 2023 em Barcelona
Manifestação da Diada 2023 em Barcelona. Foto ANC/Twitter

Milhares de pessoas voltaram a manifestar-se nas ruas de Barcelona esta segunda-feira, por ocasião da Diada, o Dia Nacional da Catalunha. A organização diz terem estado 800 mil pessoas, mais cem mil do que anunciou em 2022, enquanto a Guardia Urbana contabilizou 115 mil manifestantes, menos 35 mil em relação ao ano passado.

Graças às últimas eleições legislativas espanholas, cujo resultado ditou uma aritmética parlamentar em que os partidos independentistas catalães são decisivos para viablizar um Governo com maioria, o ambiente das celebrações da Diada não podia ser mais diferente do que se viveu no ano passado. Nessa altura, o líder da Esquerda Republicana da Catalunha (ERC) e chefe do Governo catalão decidiu não marcar presença na manifestação que a Assembleia Nacional Catalã (ANC) promove e que serve de termómetro anual à força do independentismo. A razão então apontada por Aragonés é que não seria bem-vindo, após as críticas dos organizadores às divisões entre os partidos pró-independência e em concreto à estratégia da ERC de apostar numa "mesa de diálogo" entre os governos catalão e espanhol, vista pela ANC como um recuo na luta pela independência.

Para este ano, o apelo à participação da iniciativa voltava a classificar como um fracasso os dois anos de negociações com Espanha e apela ao regresso da "confrontação". Mas estas palavras não podiam estar mais distantes do atual momento político, com as duas principais forças políticas do independentismo - ERC e Junts - mais envolvidas do que nunca em negociações com o PSOE e o Sumar, tendo em vista a investidura de Pedro Sánchez.

No seu discurso após a manifestação da tarde, a presidente da ANC, Dolors Feliu, voltou a exigir ao parlamento catalão para "cumprir a sua palavra" e tornar efetiva a independência, considerando que qualquer pacto com Madrid "apenas deve servir para conseguir a independência da Catalunha" com o reconhecimento do referendo de 2017. E avisou que a reivindicação da independência não pode servir de moeda de troca das negociações dos independentistas com o PSOE e o Sumar.

Esquerda Republicana e Junts trocam farpas em nome do protagonismo nas negociações

Horas antes, nas iniciativas públicas matinais - em que muitos partidos, associações e cidadãos depositam flores junto à estátua de Rafael Casanova (1660-1743), um dos símbolos do patriotismo catalão -  o secretário-geral do Junts, Jordi Turull, foi questionado sobre o caminho para uma possível viabilização do próximo governo PSOE/Sumar. Respondeu que "não confiamos neste Estado depois de tantos anos de enganos" e que por essa razão exige "o pagamento adiantado": a aprovação de uma lei da amnistia para os envolvidos no "procés" que culminou no referendo de 1 de outubro de 2017, a começar pela principal figura do seu partido e líder do executivo catalão nessa altura, Carles Puigdemont.

Do lado da ERC, com o seu líder Oriol Junqueras afastado das comemorações por ter contraído covid-19, a ministra catalã da Presidência, Laura Villagrà, afirmou que agora "o independentismo está em posição de força na agenda política estatal e há que aproveitá-lo". Assim, depois dos indultos aos condenados do "procés" e da reforma do código penal, "agora é a vez da amnistia".

ERC e Junts não perderam a oportunidade para trocarem farpas sobre o respetivo papel nas negociações, com o primeiro a abrir a porta à participação do adversário na mesa de negociação com Madrid, após tê-los excluído em 2021 quando romperam a aliança de governo, e o segundo a saudar a mudança de posição após o que diz terem sido seis anos de "vetos" nas negociações com o PSOE no parlamento espanhol.

Sem supresa, o líder dos socialistas catalães foi o mais comedido em considerações políticas sobre as negociações, aconselhando "prudência, paciência, discrição e Constituição" que diz serem "os quatro pontos cardeais do PSC" neste assunto. Mais à esquerda, a lídr parlamentar dos Comuns, Jéssica Albiach, diz ver nesta Diada "um ponto de inflexão para um novo princípio da Catalunha, sublinhando que a amnistia defendida pelo seu partido é um passo necessário para "culminar o processo de desjudicialização" do conflito político catalão.

Òmnium defende amnistia para 1.432 reprimidos do "procés"

Na também habitual sessão pública da Òmnium Cultural, a maior organização da sociedade civil pró-independência, o seu líder Xavier Antich apelou à ERC e ao Junts para trabalharem em conjunto nas negociações que se realizam "num cenário inédito e que oferece uma oportunidade política indubitável. Estamos convencidos que é preciso aproveitá-la".

E sobre uma eventual amnistia, Antich foi o primeiro a avançar publicamente com um número: no mínimo, diz que deve ser aplicada a 1.432 das cerca de quatro mil pessoas "reprimidas" pelo Estado espanhol ao longo do "procés". Entre essas 1.432 pessoas estão as 113 condenadas penalmente, as 17 que aguardam sentença, as 387 que respondem na justiça, as 880 que foram sancionadas administrativamente e as 35 com processos pendentes no Tribunal de Contas.

Para a associação, entre os abrangidos não deve estar a presidente do Junts e ex-presidente do Parlamento Laura Borràs, condenada por irregularidades em contratos quando presidia ao Instituto das Letras Catalãs. A Òmnium considera que apesar dos debates sobre a sua gestão do organismo ou se teve um julgamento justo e imparcial, o que levou à sua condenação "não se deve ao exercício de direitos fundamentais, que é o que reivindica a amnistia".