Jogos Olímpicos

Imane Khelif, a pugilista acusada de ser homem

02 de agosto 2024 - 16:02

No meio de uma tempestade digital, Imane Khelif tem sido acusada de ser homem depois de performance dominante num combate de boxe. A pugilista já tinha sido desqualificada numa competição internacional. O Comité Olímpico defende que todos os participantes estão em conformidade com os critérios de participação.

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Imane Khelif
Fotografia de Imane Khelif via Facebook

Na passada quinta-feira, duas pugilistas entraram no ringue de box para disputar os oitavos de final nos Jogos Olímpicos. 46 segundos depois, o combate tinha terminado. A italiana Angela Carini desistiu depois de um golpe no nariz, afirmando mais tarde aos jornalistas que nunca tinha sofrido um golpe com tanta força na sua carreira.

Do outro lado estava Iman Khelif, pugilista argelina que se encontra agora no centro de uma tempestade lançada nas redes sociais sobre o seu género. Após a sua esmagadora vitória, Khelif, que nasceu mulher, se identifica como mulher e que sempre competiu enquanto mulher, tem sido acusada nas redes sociais de ser trans e intersexo.

Tais acusações têm tornado a pugilista o centro de acusações de várias figuras da extrema-direita, incluindo Donald Trump, que prometeu que iria “manter os homens fora dos desportos femininos” e o seu parceiro eleitoral, J.D. Vance, que afirmou que as “ideias de género de Kamala Harris” permitiram “a um homem adulto bater numa mulher”. A presidente italiana, Giorgia Meloni, aproveitou o apoio à pugilista italiana para garantir que esta vencerá um dia, “numa competição que será finalmente justa”. A autora J. K. Rowling e Elon Musk também publicaram ou partilharam conteúdos que davam a entender que acreditam que a pugilista é, de facto, um homem.

No entanto, não há quaisquer provas nem indícios de que Khelif seja trans ou intersexo. Na quinta-feira, Rosario Coco, presidente da Gaynet (associação italiana pelos direitos LGBTI+) afirmou que a pugilista é intersexo com base em informações que supostamente terá recebido sobre a atleta, mas estas declarações acabaram por juntar-se à confusão uma vez que a presidente da associação não apresentou quaisquer provas.

Não é a primeira vez que o género da atleta é colocado em causa. Já em 2023, Imane Khelif tinha sido desqualificada do campeonato mundial de boxe feminino em Nova Deli, por falhar um teste “elegibilidade de género”. No mesmo torneio, Lin Yu-ting, atleta que já se sagrou duas vezes campeã mundial, também foi desqualificada pela mesma razão. Mas a Associação Mundial de Boxe (IBA) não especificou qual foi exatamente o teste que as duas atletas falharam, apenas indicou que nem uma nem outra teriam feito testes aos níveis de testosterona.

Khelif nunca afirmou ser trans nem intersexo. Aliás, ganhou alguma simpatia nos media ao partilhar a história de como sempre desafiou os papéis de género na sua aldeia argelina, aprendendo primeiro a jogar futebol, e desenvolvendo o gosto pelo boxe ao entrar em rixas com os rapazes da aldeia. A atleta tem sido também porta-voz da importância do desporto na Argélia, especialmente para raparigas.

Apoio do Comité Olímpico

Desde que a controvérsia digital começou, na quinta-feira, Imane Khelif e a comitiva argelina têm lutado contra a desinformação e o ódio. Num comunicado anterior ao combate, a comitiva argelina já tinha condenado as acusações “infundadas” atiradas à atleta sobre a sua participação nos Jogos Olímpicos.

No início do torneio, o Comité Olímpico (IOC) já tinha deixado claro que “Todos os atletas que participam nos torneios de boxe dos Jogos Olímpicos de Paris 2024 estão em conformidade com os critérios de elegibilidade e participação da competição, bem como todos os critérios médicos aplicáveis”.

Depois do escândalo nas redes sociais, o Comité tornou pública uma declaração em que se diz “entristecido com o abuso”, e onde declara que “toda a gente tem o direito a praticar desporto sem discriminação”. Mas aproveitou também para atacar o que foi a decisão da IBA em 2023, que lançaram toda esta controvérsia e que, segundo o IOC, é possível comprovar “através das minutas da IBA”, que a decisão foi tomada “apenas pelo secretário-geral e CEO da IBA” de forma arbitrária.

“A agressão atual contra estas duas atletas [Imane e Lin] é baseada apenas nesta decisão arbitrária, que foi tomada sem qualquer tipo de protocolo, especialmente considerando que estas atletas competiam há anos ao mais alto nível”, concluiu o IOC.