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Habitação, proteção social e cuidados: três áreas em que há lacunas do Estado social

No comício do Porto, José Soeiro salientou que são nestas três áreas que se manifestam as “debilidades estruturais do nosso modelo de desenvolvimento", "a estrutura das desigualdades" e as "lacunas do Estado Social" e que necessitam de respostas para construir um país mais decente.
José Soeiro no comício do Porto - foto de Pedro Almeida
José Soeiro no comício do Porto - foto de Pedro Almeida

Na sua intervenção no comício do Porto, que se realizou este sábado, 22 de janeiro, o deputado José Soeiro começou por contar que na véspera tinha visitado o edifício onde fez o recenseamento militar, um grande edifício situado mesmo ao lado da estação de metro da Casa da Música.

O edifício atualmente está vazio, mas vai ser ocupado com habitação pública.

Bloco conseguiu que este edifício não fosse vendido

"Em 2019, o Bloco de Esquerda propôs que edifícios como este, em lugar de serem vendidos ou concessionados, porque era isso que estava previsto, que passassem do ministério da Defesa para o ministério das Infraestruturas para se fazer habitação pública, habitação acessível”, explicou José Soeiro.

A habitação é das maiores urgências atuais, o deputado salienta: “os salários médios do país não permitem às pessoas viverem nos centros das cidades, aliás os salários não permitem às pessoas arrendarem uma casa seja no centro da cidade ou em qualquer ponto”. “E, como é sabido, só consegue empréstimo quem não tem um contrato precário. Só que, quase toda gente pelo menos as pessoas mais novas, o que têm, quando têm, é um contrato precário. Um recibo verde ou uma bolsa”, destaca José Soeiro.

O Bloco conseguiu que o prédio do recenseamento militar não fosse vendido, em 2019 o projeto foi debatido e em 2021 foi “finalmente assinado o protocolo”, “o prédio ficou na esfera pública e vai acolher 36 casas de habitação acessível”. O mesmo irá acontecer a outros dois edifícios, situados no centro da cidade do Porto e que em vez de serem vendidos ou concessionados irão dar a lugar a 193 casas de habitação acessível e pública.

"Nós sabemos que é uma pequenina gota no oceano das carências habitacionais que temos. Mas é um grande exemplo do que pode ser feito e é também um grande exemplo da diferença que tem feito, nas grandes causas e nas pequenas lutas concretas, haver deputados do Bloco que não se conformam", destacou José Soeiro.

Três áreas em que as lacunas do Estado Social têm de ser resolvidas

"O problema da habitação, a questão da proteção social e o regime de cuidados que temos são três das áreas em que se manifestam da forma mais gritante as debilidades estruturais do nosso modelo de desenvolvimento", salientou José Soeiro, acrescentando que nelas se manifestam as “debilidades estruturais do nosso modelo de desenvolvimento", "a estrutura das desigualdades" e as "lacunas do Estado Social".

O deputado bloquista sublinhou também que essas debilidades têm de ser resolvidas e são necessárias respostas consistentes para superar os atrasos e construir um "país mais decente e nivelado para toda a gente".

Por uma nova prestação social

"O emprego precário transforma-se, ao mínimo sinal de crise, em desemprego desprotegido. As prestações sociais que temos revelaram-se incapazes de responder ao precariado", apontou José Soeiro, recordando a pandemia e sublinhando que "quem estava na Casa da Música ficou sem proteção", assim como os bolseiros, as trabalhadoras domésticas, "mesmo as poucas que fazem descontos não têm direito de proteção no desemprego", lembrando também os trabalhadores informais e "o exército de trabalhadores à experiência que não tiveram direito ao lay-off, nem compensação porque não tinham contrato".

"Foram despedidos, foram descartados e nem sequer cabem na figura de desempregado, de despedido do despedimento", frisou o deputado, recordando ainda "a floresta dos apoios extraordinários e temporários que o governo criou e que teve muitos buracos e atrasos" e em que "muitas vezes foram mais os anúncios do que os apoios concretos".

"Tiveram, porém, um grande mérito para uma esquerda que queira aprender com o país, com a pandemia", apontou José Soeiro, assinalando a insistência do Bloco numa "nova prestação social que unifique as prestações de combate à pobreza e que responda ao precariado".

"E quando falamos de justiça, de proteção social, de combate à pobreza e à desproteção falamos dos mais novos e dos mais velhos", indicou o deputado, recordando depois o caso dos 62 mil trabalhadores, "que tiveram o azar de se reformarem antes das leis que nós alterámos em 2018, 2019" e que retiraram o corte do fator de sustentabilidade das pensões requeridas a partir desse ano.

"Acabar com o corte de sustentabilidade para este grupo de pensionistas é possível e é sustentável. Custa 60 milhões por ano. Ou seja, um quinto do que o imposto Mortágua dá todos os anos à Segurança Social", apontou José Soeiro.

E frisou: "As propostas do Bloco reforçam a Segurança Social pública e aprofundam a sua sustentabilidade, além de trazerem mais justiça para quem trabalhou. Só por má fé ou ignorância se pode dizer que o Bloco alguma vez pôs em causa a sustentabilidade deste pilar do Estado Social".

"Acabar com o paradoxo de não poderem existir respostas sociais públicas para a infância e para a velhice"

José Soeiro passou a seguir ao regime dos cuidados, a terceira área onde há "lacunas do Estado Social"

"Ainda bem que se tornou um consenso a existência de creches gratuitas, como a Escola Pública é gratuita", afirmou o deputado, acrescentando que é preciso somar à gratuitidade das creches muito mais oferta. "Aqui no distrito do Porto, por exemplo, "para as crianças até aos 3 anos só 35% é que são cobertas por creches apoiadas", disse, sublinhando que "é muito pouco e é possível fazer muito mais".

"É possível construirmos em Portugal uma rede pública de creches e acabarmos com um paradoxo, que atravessa todas as respostas sociais e que tem sido um bloqueio do bloco central: a ideia de que não podem existir respostas sociais públicas para a infância e para a velhice", destacou José Soeiro, apontando que a lei que regula as respostas financiadas pela Segurança Social proíbe o financiamento público de respostas sociais públicas.

"Isto é, quando se consagra um monopólio do setor social privado na gestão das creches, do apoio domiciliário, dos lares para idosos, das estruturas para idosos, o Estado financia mas não pode gerir", frisou, sublinhando o absurdo que está a acontecer com as autarquias, "que podem financiar-se através do PRR, que é dinheiro público, para construir creches ou centros de dia, mas não podem gerir esses equipamentos".

"Para os pôr a funcionar vão ter de fazer outsourcing, vão ter de externalizar. Porquê?", questionou José Soeiro, defendendo que o Estado deve ter uma rede pública de creches, uma rede lares e residências partilhadas para idosos, "sobretudo uma bolsa pública de apoio domiciliário que chegue a todas as pessoas dependentes". E que essa rede pública "se some às respostas que existem nas IPSS, que alivie os cuidadores e cuidadoras informais da enorme sobrecarga a que estão sujeitas. Que não assente na mão de obra gratuita das cuidadoras informais ou então na precariedade e nos baixos salários, na falta de reconhecimento e de valorização dos profissionais dos cuidados", salientou.

"Aprender com a pandemia é isto, é sermos exigentes, é dizermos que essas pessoas que trabalham nos cuidados e no apoio social também são heróis e heroínas anónimas, que se mantiveram invisíveis no momento das palmas: as trabalhadoras da limpeza, as trabalhadoras domésticas, as auxiliares dos lares", assinalou José Soeiro, apontando ainda que estes trabalhadores e, sobretudo estas trabalhadoras, "são a coluna vertebral de uma política do cuidado". "E é com elas que nós respondemos de forma justa e na prática à questão do envelhecimento e da vulnerabilidade que é uma caraterística de todos os seres humanos. É com eles e elas com esses trabalhadores e essas trabalhadoras que a esquerda tem de fazer essa reforma estrutural e esta grande transformação nas políticas públicas e no Estado Social", afirmou a concluir José Soeiro.

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