Ex-marido da juíza que julga Pinho e Salgado também recebia do saco azul do BES

23 de outubro 2023 - 20:55

Após o caso ser divulgado pelos advogados de Manuel Pinho, a juíza decidiu suscitar junto do Tribunal da Relação o incidente de escusa.

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Manuel Pinho à entrada para uma das sessões do julgamento.
Manuel Pinho à entrada para uma das sessões do julgamento. Foto André Kosters/Lusa

A juíza-adjunta Margarida Ramos Natário, que integra o coletivo de juízes do julgamento de Manuel Pinho, da sua mulher Alexandra Pinho e de Ricardo Salgado, anunciou que vai suscitar junto do Tribunal da Relação o incidente de escusa, para que seja este a decidir se se irá manter no julgamento. O pedido foi anunciado após os advogados que defendem Manuel e Alexandra Pinho terem apresentado um requerimento para que a juíza avaliasse a sua imparcialidade após as notícias vindas a público através da SIC-Notícias e do jornal Público.

E essas notícias revelaram que o ex-marido da juíza - Miguel Natário Rio-Tinto -, antigo alto quadro do Grupo Espírito Santo, recebeu pelo menos até 2014 mais de de um milhão de euros através de uma conta sediada no estrangeiro titulada pela Enterprises Management Services LTD, a mesma conta que remunerou a Tartaruga Foundation, de que Pinho era o beneficiário. Além destas transferências, os advogados do casal Pinho acrescentam que o então marido da juíza também recebeu através do Banque Privée Espírito Santo vários pagamentos "relativamente aos quais pode existir igualmente a suspeita de não terem sido fiscalmente declarados”.

Os advogados resumem também as declarações da juíza num processo judicial, na qualidade de testemunha, em que ficou apurado que "o casal, que então vivia na Quinta da Marinha, divorciou-se em agosto de 2014, mas continuou a viver em união de facto, tendo o divórcio ocorrido por ‘precaução’, para ‘salvaguarda dos filhos’, tendo em conta a situação criada no BES, razão pela qual ‘dividiram património’ (o qual já teria expressão significativa, o que não aconteceria quando casaram).”

No processo agora em julgamento, o antigo ministro da Economia do governo de José Sócrates está a ser acusado de dois crimes de corrupção passiva, um de branqueamento e um de fraude fiscal. Ricardo Salgado responde por dois crimes de corrupção ativa e um de branqueamento e Alexandra Pinho é acusada de um crime de branqueamento e outro de fraude fiscal, ambos em co-autoria com o marido. A acusação defende que Manuel Pinho terá beneficiado os interesses do Grupo Espírito Santo enquanto ministro e responsável pela candidatura de Portugal à organização da competição de golfe Ryder Cup, com intervenções a favor de projetos do grupo ou financiados por ele, como os das herdades da Comporta e do Pinheirinho. Na tese da acusação, em troca Ricardo Salgado terá subornado o então ministro com mais de cinco milhões de euros. A defesa de Pinho nega os crimes de corrupção, admitindo apenas não ter declarado ao fisco o dinheiro recebido das empresas do grupo, alegando ser uma prática comum entre os altos quadros serem remunerados através de sociedades sediadas em paraísos fiscais.