Apesar de ter falhado a maioria, Benjamin Netanyahu ainda poderá conseguir o seu nono mandato e oitavo consecutivo (mesmo se os últimos quatro foram de curta duração), dada a inesperada disponibilidade manifestada pela lista islamita moderada árabe Ra’am para se coligar com o seu campo. Apesar desta hipótese ter sido rejeitada pelo Sionismo Religioso, formação da extrema-direita judaica, o primeiro-ministro, que necessita continuar à frente do executivo para evitar ser julgado por corrupção, tudo fará para permanecer no cargo.
Um parlamentarismo puro
O Parlamento (Knesset) é constituído por 120 membros, eleitos por sufrágio universal, direto e secreto para um mandato de quatro anos, num círculo único nacional, sendo a alocação dos mandatos feita através do método do quociente eleitoral simples. Os mandatos remanescentes serão atribuídos de acordo com a média mais alta. Existe uma cláusula-barreira, fixada em 3,25% dos votos válidos.
Para verem mais pormenores sobre o sistema político e eleitoral israelita e sobre a democraticidade das eleições no país podem consultar aqui outro artigo da minha autoria.
O contexto político
O último ato eleitoral, realizado em março de 2020, deu uma pequena maioria ao bloco político oposicionista. Contudo, a pretexto da pandemia, o líder da oposição, Benny Gantz, aceitou integrar um governo de unidade nacional, que contou, igualmente, com a presença dos partidos da direita religiosa e os trabalhistas, o que levou a uma cisão na coligação que liderou no ato eleitoral. No acordo que firmou com Netanyahu, ficou decidido que este chefiaria o governo nos primeiros 18 meses, após o que aquele lhe sucederia.
Igualmente no âmbito desse entendimento, previa-se a apresentação de um orçamento bianual, mas o Likud, partido do primeiro-ministro, entendeu que, devido à situação provocada pela COViD-19, não havia condições para tal, pretendendo que aquele fosse anual, como habitualmente. Uma atitude que Gantz entendeu como uma clara violação do acordo que firmara.
Um compromisso de última hora permitiu um adiamento excecional de 120 dias para a sua aprovação, mas os desentendimentos no seio do governo impossibilitaram que ele fosse aprovado nesse prazo adicional, levando, assim, à dissolução do Knesset e à convocação de novas eleições.
Análise dos resultados eleitorais
Vamos, agora, proceder à análise dos resultados eleitorais, com destaque para o desempenho das diferentes forças políticas e respetivos blocos. Para conhecer a origem e as posições dos partidos parlamentares podem recorrer à consulta do mesmo artigo aqui.
O bloco direitista apenas conseguiu obter 52 lugares no Knesset. Se lhe juntarmos o partido Yamina, que, oficialmente, não faz parte dele, mas poderá aliar-se-lhe, Netanyahu apenas terá o apoio de 59 deputados, ficando-lhe a faltar dois para a maioria parlamentar. Por seu turno, o bloco oposicionista conseguiu, em princípio, 57 lugares, pelo que os quatro eleitos da lista islamita árabe Ra’am serão decisivos para a formação do novo executivo.
O bloco de Netanyahu
No novo Knesset, será constituído por quatro partidos (cinco, se a Yamina se lhe juntar, o que é provável) e terá 52 lugares parlamentares (59 com aquela).
Têm em comum a intransigência ou, mesmo, a mais completa hostilidade face aos palestinianos. Representam a ala direita do sionismo, que sonha com o Grande Israel (ou seja, a ocupação total da Palestina), ou por razões religiosas (a reconstrução do território judaico dos tempos bíblicos) ou de segurança (vendo num eventual estado palestiniano independente uma ameaça à existência do estado hebraico). Existem, no entanto, diferenças de grau entre eles.
Possuem, ainda, algumas diferenças nas questões religiosas (uns são seculares, outros ortodoxos) e económico-sociais (uns são mais liberais, outros têm algumas preocupações sociais).
Eis as principais forças políticas deste campo ideológico.
Likud
O seu nome significa Consolidação. Inicialmente no centro-direita, foi resvalando para a direita e é, atualmente, um partido nacional-conservador. Neste ato eleitoral, foi a lista mais votada, obtendo 24,19% dos votos, que lhe valeram 30 lugares no Knesset, uma descida significativa face aos 29,46% e aos 36 mandatos obtidos nas últimas eleições.
As acusações de corrupção que visam o seu líder e primeiro-ministro e as manobras deste para evitar ir a julgamento terão contribuído para a perda de algum apoio, embora o seu partido continue a ser o maior do país. Contudo, mantém bastante crédito entre os seus apoiantes, convencidos pela estratégia “trumpista” do líder, que acusa os juízes e os procuradores de terem motivações políticas para o acusarem.
Entretanto, Netanyahu deu início a uma campanha de vacinação massiva contra a COViD-19 (mais de metade da população de Israel já está vacinada), o que lhe permitiu segurar algum eleitorado menos contente com a sua governação.
Por outro lado, desta vez, o primeiro-ministro ensaiou uma estratégia diferente face aos eleitores árabes. Noutras eleições, particularmente em 2020, considerou-os uma ameaça, pedindo aos judeus que fossem votar massivamente e utilizou táticas de intimidação, de forma a dissuadir os árabes de irem às urnas. Essa atitude teve o efeito contrário, levando a uma participação histórica destes, com o consequente crescimento da lista conjunta dos respetivos partidos. Agora, optou por um discurso conciliador, procurando cativá-los. E isso foi suficiente para que muitos deles ficassem em casa, para além de ainda ter ido buscar, aqui e ali, alguns votos (mesmo que não muitos) no seio destes.
Essa estratégia foi possível pela situação de relativa acalmia, tanto em Israel como nos territórios ocupados. Aliás, a questão palestiniana esteve praticamente ausente da campanha.
O partido conseguiu os seus melhores resultados nos pequenos e médios centros urbanos e nas áreas rurais mais conservadoras, mas habitadas por judeus seculares, um pouco por todo o país. Obteve, ainda, vitórias claras nas principais cidades do Sul (Beersheba e Dimona, no Negev; Ashkalon e Ashdod, na costa mediterrânica), bem como em Sderot, junto a Gaza, e em Eilat, a mais meridional do país, no golfo de Aqaba, à entrada do mar Vermelho. No Centro, venceu na maioria das principais cidades (Ramla, Petah Tikwa, Rishon LeZion, Rehovot e Netanya), bem como em Holon, na periferia de Tel Aviv, mas, em geral, por margens menores. No Norte, tem menos implantação, mas ainda obteve alguns triunfos claros, como em Hadera, Acre, Afula ou em Kiryat Shmona, junto à fronteira libanesa. Obteve, igualmente, bons resultados entre os drusos do Nordeste e dos Golan. Em Haifa, a maior cidade do Norte, foi, desta vez, o mais votado (com 21,4%), embora, aqui, devido à divisão da coligação oposicionista. Conseguiu, também, vencer em diversos colonatos, habitados por judeus seculares ou mistos (onde coabitam laicos e religiosos), em especial em Ariel (o maior da Cisjordânia) e junto à “cidade santa”, mas teve resultados mais fracos nos colonatos exclusivos de ortodoxos e ultraortodoxos.
Em Tel Aviv, porventura a mais progressista urbe judaica de Israel, o Likud foi segundo, atrás do Yesh Atid, a principal formação oposicionista, tendo-se quedado pelos 17,0% na capital internacionalmente reconhecida. Perdeu, igualmente, para aquele em alguns subúrbios mais prósperos, como Ramat Gan. Porém, a maior surpresa ocorreu em Jerusalém, onde foi apenas segundo, com 20,7%, atrás dos religiosos do UTJ. Como é tradicional, também foram mais fracos os resultados nos kibutzim, aldeias comunitárias onde a terra é explorada coletivamente, e, em menor grau, nos moshavim, cooperativas de produção agrícola, em geral atrás do Yesh Atid (centrista), do Labor (social-democrata), do Meretz (esquerda) e, mesmo, do Kahol Lavan (centro-direita), em especial nos primeiros. Como seria de esperar, apesar de ter melhorado um pouco, a sua votação, continua a ser relativamente residual nas principais cidades árabes do Norte (como Nazaré e Umm-al-Fahm) e entre as tribos beduínas do Negev.
A descida do Likud teve por base a fuga de eleitorado para alguns dos seus aliados da direita e da extrema-direita. De acordo com a nossa estimativa, o partido terá conservado apenas 65% dos seus eleitores de 2020, tendo deixado fugir 7% para o Sionismo Religioso (extrema-direita) e 5% para o Yamina (direita radical). A isso se juntam 10% para a Nova Esperança, da direita moderada, resultante de uma cisão no partido, 6% para a abstenção, 2,5% para o Kahol Lavan (centro-direita), 1,5% para o Yesh Atid (centro), o mesmo para o Labor (centro-esquerda) e, igualmente, para outras opções de voto.
Na composição do seu eleitorado, manteve 84% dos que nele votaram há um ano atrás, a que acrescentou 6% vindos da coligação Kahol Lavan (que incluía este, o Yesh Atid e outros pequenos partidos), 3% da abstenção, 1,5% do Shas (religioso sefardita), igual percentagem do Yisrael Beiteinu (direita nacionalista) e, ainda, da coligação de esquerda Labor-Meretz-Gesher (pois a líder deste último, Orly Levy, aceitou integrar o governo de unidade nacional e, agora, as listas do Likud), 1% da Lista Conjunta árabe e 1,5% de outras opções de voto.
(Extrema) direita religiosa
Nestas eleições, o maior dos partidos da direita religiosa voltou a ser o Shas, acrónimo que significa Sefarditas Observantes da Torah. Foi fundado em 1984 pelo rabi Ovadia Yosef e, como o nome indica, pretende representar os judeus (ultra)ortodoxos sefarditas (provenientes da Península Ibérica, Norte de África e Médio Oriente). Após a morte do seu líder espiritual, em 2013, assumiu a liderança Aryeh Deri, que se tornou um aliado fiel do atual primeiro-ministro.
Apesar disso, voltou a ser a terceira força política mais votada, graças ao apoio do eleitorado sefardita religioso, obtendo 7,17 % dos sufrágios, uma pequena descida face aos 7,69% de há um ano, mas manteve os seus nove lugares no Knesset.
Conseguiu boas votações nos colonatos habitados por judeus ortodoxos sefarditas e em Jerusalém, onde foi terceiro, com 15,7% dos votos. Em Bnei Brak, um subúrbio de Tel Aviv cujos residentes são quase todos religiosos, foi segundo, com 27,7%. De registar, também, os bons resultados obtidos em algumas urbes do sul (Ashdod, Dimona, Ashkelon e BeerSheba), centro (Ramla, Netanya, Petah Tikva e Holon), e norte (Kiryat Shmona, Acre e Hadera). Estes ocorrem principalmente nos subúrbios destas, onde habita a maioria da população sefardita, em geral mais pobre.
Nas restantes cidades de maior dimensão, esmagadoramente laicas, a sua votação foi mais fraca (3,6% em Tel Aviv e 2,6% em Haifa), tal como nos colonatos habitados predominantemente por seculares ou por religiosos ashkenazim, sendo, como é óbvio, inexistente entre árabes e drusos.
Como é habitual nos partidos de inspiração religiosa, o seu eleitorado é muito estável. Assim, conservou 84% dos seus eleitores anteriores, tendo perdido 5% para o Likud e outro tanto para o Sionismo Religioso, 3% para a abstenção, 1,5% para a Yamina e o mesmo para outras opções de voto.
Daí que, na composição do seu eleitorado, 95% dos que nele votaram haviam feito a mesma opção em 2020. Os restantes vieram de abstencionistas e novos eleitores (4%) e da coligação Yamina, que, então, incluia a extrema-direita (1%).
Outra formação da direita religiosa é o Judaísmo Unido da Torah (UTJ). Trata-se de uma aliança entre dois partidos: o Agudat Yisrael (União de Israel) e o Degel HaTorah (Bandeira da Torah), estabelecida em 1992. Ao contrário do anterior, sefardita, representa duas correntes dos judeus (ultra)ortodoxos ashkenazim (provenientes da Europa Central e Oriental). A sua liderança cabe a Yaakov Litzman, líder do primeiro, mas, neste ato eleitoral, a lista foi encabeçada por Moshe Gafni, que lidera o segundo.
Foi a sétima força mais política mais votada, obtendo 5,63% dos votos, uma ligeira descida face aos 5,98% das últimas eleições, mas conservou os sete deputados que elegera há um ano.
Recebeu bastante apoio nos colonatos habitados por judeus ortodoxos ashkenazim, onde foi, invariavelmente, o mais votado, atingindo, em alguns deles, na periferia de Jerusalém, perto de 80% dos sufrágios. Na “capital” israelita da Cisjordânia ocupada, o colonato de Modi’in Illit, chegou aos 79,2%. Nos mistos, a sua votação foi bastante menor, mas ainda obteve um apoio significativo, na casa dos 20%. Em Bnei Brak, a cidade habitada por religiosos na periferia de Tel Aviv, conseguiu 60,8%. Mas o seu maior feito foi o triunfo na “cidade santa”, onde atingiu 23,5% dos sufrágios, à frente do Likud. Nas outras cidades, apenas em Ashdod (onde registou 13,8%) teve uma boa votação.
Já noutros centros urbanos, cidades habitadas esmagadoramente por judeus ashkenazim, mas laicos, como Petah Tikva (4,2%) e Haifa (3,7%), teve resultados bem mais fracos. Nas restantes, é residual, ficando, invariavelmente, abaixo de 1% (0,8% em Tel Aviv).
Tal como o do Shas, o seu eleitorado é bastante estável, tendo conservado 85% dos que nele votaram há um ano. 8% fugiram para o Sionismo Religioso, 3% para a abstenção, 1,5% para o Likud, 1% para a Yamina e 1,5% para outras opções de voto.
Da sua composição, podemos estimar que, tal como o do seu homólogo sefardita, inclui 95% dos que por ele optaram em 2020, com os restantes a virem de abstencionistas e novos eleitores (4%), bem como da Yamina e seus aliados de então (1%).
A terceira força de inspiração religiosa é a aliança de extrema-direita judaica, denominada Sionismo Religioso, constituída por três formações: o Partido Religioso Sionista (RZP), o Otzma Yehudit (Poder Judaico) e o Noam (Plenitude). Criada em fevereiro para concorrer a estas eleições, obteve 5,12% e elegeu seis deputados, quatro do primeiro e um de cada uma das outras formações.
O primeiro e mais importante, dirigido por Bezalel Smotrich, líder da coligação, resultou da fusão entre a União Nacional e a Tkuma (Ressurreição) sendo, simultaneamente, liberal em matéria económica, ultraconservador nos costumes e nacionalista, partidário do Grande Israel e apoiante da expansão dos colonatos e posterior anexação da Cisjordânia e de Jerusalém Leste. Pior ainda, o Otzma Yehudit, chefiado por Michael Ben-Ari, defende, além dessa posição, um estado teocrático e é abertamente antiárabe, sendo considerado por muitos como o herdeiro do Kach, um partido racista, fundado pelo rabi Meir Kahane (assassinado em 1990, em Nova York), que defendia a expulsão de todos os árabes da Palestina, e que foi ilegalizado por ser racista. Também o Noam é partidário da implantação de uma teocracia, regida pela Halasha, a lei religiosa judaica, e é abertamente homofóbico, pretendendo institucionalizar a “cura” das pessoas LGBTQI+.
Em 2020, o primeiro, ainda sob a designação de Tkuma, concorreu na coligação Yamina, que obteve 5,24% e elegeu um dos seis deputados da lista. Já o Otzma Yehudit concorreu separadamente e não foi além de uns modestos 0,4%, enquanto o Noam apoiou a primeira.
É o principal partido dos colonos, em especial entre os judeus ortodoxos, embora também capte ultraortodoxos e alguns seculares. Conseguiu os seus melhores resultados nos colonatos do sul da Cisjordânia, tendo, em alguns deles, ultrapassado os 80%, e também teve um bom desempenho nos implantados na periferia de Jerusalém e habitados, maioritariamente, por judeus religiosos, como os do “bloco Etzion”. Na “cidade santa”, ficou em quarto lugar, com 9,2% dos votos. Nos restantes meios urbanos, teve uma boa votação em Sderot, junto a Gaza, onde chegou aos 10,6%, e em Petah Tikva, no centro, onde atingiu os 7,0%. Nas outras cidades de média dimensão, obteve, geralmente, resultados entre os 3% e os 5,5%.
Já em Tel Aviv teve uma fraca votação (1,7%), tal como em Haifa onde o seu desempenho não foi muito melhor (2,6%). Na maioria dos kibutzim e moshavim a sua implantação é residual, sendo, obviamente, inexistente nas áreas habitadas por árabes.
O seu eleitorado é composto por 43,5% de eleitores provenientes do Likud, 20% da anterior coligação Yamina, 10% do UTJ, 8% do Otzma Yehudit, igual percentagem do Shas, 5% de abstencionistas e novos eleitores, 3% da aliança Kahol Lavan e 2,5% de outras opções de voto.
Yamina
A Yamina (Direita), liderada por Naftali Bennett, obteve 6,21% dos votos e elegeu sete parlamentares. Em 2020, em aliança com duas das formações de extrema-direita que constituíram, agora, a lista do sionismo Religioso, não fora além de 5,24% e seis lugares.
O novo partido filia-se na direita radical e foi fundado em finais de 2018 pelo seu atual líder e por Ayelet Shaked, sob a designação de Nova Direita. É liberal na economia e conservador nos costumes, pretendendo captar tanto eleitores religiosos como seculares.
Nestas eleições, não declarou a sua adesão a nenhum dos blocos, nem o de Netanyahu nem o oposicionista. Contudo, após serem conhecidos os resultados eleitorais, afirmou não apoiar a nomeação de Yair Lapid, líder do segundo, para a chefia do novo executivo. Bennett não esconde que gostaria de ser primeiro-ministro, mas dificilmente o conseguirá por agora. Logo, muito provavelmente, acabará por apoiar o atual, apesar das divergências entre ambos, que levaram, então, à sua demissão da pasta da Educação, bem como de Ayelet Shaked de ministra da Justiça.
O partido obteve os melhores resultados nos colonatos do chamado “bloco Etzion”, situado a sul de Jerusalém, onde foi o mais votado, com valores acima de 30% dos votos. No de Ariel, maioritariamente laico, obteve 9,7%. Na maioria das cidades judaicas, obteve resultados razoáveis, com destaque para Sderot, junto a Gaza, onde chegou aos 13,5%, e em Petah Tikva, na zona central, aos 8,8%, enquanto noutras ficou, em geral, entre os 5% e os 7%. Em Jerusalém, obteve 6,7%.
Ao invés, ficou abaixo desses valores em Haifa (4,8%) e em Tel Aviv (3,6%), enquanto nas povoações árabes e drusas as suas votações foram residuais ou, mesmo, nulas. Também nos kibutzim e mochavim o seu desempenho foi, em geral, bastante fraco.
Da composição do seu eleitorado, 62,5% proveio da coligação que, em 2020, concorreu com o mesmo nome, a que se juntam 25% vindos do Likud, 3,5% de abstencionistas e novos eleitores, 2,5% da aliança Kahol Lavan, 2% do Yisrael Beiteinu, a mesma percentagem do Shas e 2,5% de outras opções de voto.
Por seu turno, dos votos da anterior Yamina, conservou 70%. Daqueles, 18,5% foram para o Sionismo Religioso, parte do qual integrou, então, a lista, 4% para a abstenção, 1,5% para o Likud e 6% para outras opções de voto.
Ra’am (UAL)
A Lista Árabe Unida (UAL), também conhecida pelo acrónimo hebraico Ra’am (Trovão), liderada por Mansour Abbas, surpreendeu, ao obter 3,79% dos sufrágios, percentagem suficiente para ultrapassar a cláusula-barreira e eleger quatro deputados, quando a maioria das sondagens (incluindo as realizadas à boca das urnas) a colocavam fora do Parlamento.
Em 2020, concorreu ao lado das principais formações árabes na Lista Conjunta (JL), que obteve uns históricos 12,67% dos votos e 15 mandatos. Contudo, desentendimentos quanto aos direitos das pessoas LGBTQI+, levaram a UAL, de inspiração islamita moderada, a abandonar aquela, optando por se apresentar isoladamente a estas eleições. A rutura foi bastante traumática, de tal forma que não assinou um acordo eleitoral com os seus antigos companheiros para a distribuição dos mandatos sobrantes, como era normal entre diferentes listas árabes concorrentes às eleições para o Knesset.
Aliás, Abbas, que tem uma boa relação pessoal com Netanyahu, afirmou não alinhar com nenhum dos dois grandes blocos eleitorais e surpreendeu o país na noite eleitoral, ao declarar estar pronto para negociar com o atual primeiro-ministro o apoio à sua investidura parlamentar.
Ao contrário da JL, esta lista tem maior apoio entre as classes baixas muçulmanas da população árabe, em especial nas comunidades beduínas do Sul do país, onde foi a mais votada. Em várias tribos ultrapassou os 75%, tendo mesmo chegado aos 90% numa ou outra. Já em Nazareth e em Umm-al-Fahm foi apenas segunda, atrás daquela, na primeira ainda com 24,0%, mas na segunda não foi além dos 13,7%. Por sua vez, em Abu Gash, subúrbio maioritariamente árabe da “cidade santa”, foi terceiro, com 17,0%.
Os seus votos são provenientes, em 96%, de eleitores da JL nas eleições de há um ano, a que se somam apenas 3% da abstenção e novos eleitores e mais 1% de outras opções de voto.
O bloco oposicionista
É composto por sete listas eleitorais e, para já, conta, no novo Knesset, com 57 lugares parlamentares.
Uma coligação heteróclita, tem formações que vão da ultradireita nacionalista laica à esquerda, passando pelo centro-direita, centro e centro-esquerda. Na verdade, pouco mais as une que o desejo de afastar Netanyahu do poder.
Eis as principais forças políticas deste bloco eleitoral:
O centro
Depois deste ato eleitoral, a sua maior formação passou a ser o Yesh Atid (Há um Futuro), de Yair Lapid, de orientação centrista, que obteve 13,93% dos votos e 17 lugares. Em 2020, concorrera como parte da coligação Kahol Lavan (Azul e Branca) e conseguira 16 dos 33 mandatos que esta, então, conquistou.
Criado em 2012 pelo atual líder, um antigo jornalista, advoga grande parte das ideias da plataforma eleitoral daquela aliança oposicionista, liderada pelo ex-general Benny Gantz, que desafiou a liderança de Netanyahu. Porém, quando aquele acabou por aceitar integrar um executivo de unidade nacional com o Likud e outras forças políticas, Lapid e o seu partido abandonaram a coligação.
Os seus melhores resultados foram obtidos nos principais meios urbanos, tendo sido o mais votado em Tel Aviv, com 22% dos votos, tal como na próspera cidade de Ramat Gan, na sua periferia, enquanto em Haifa foi segundo com 19,7%. Venceu, ainda, categoricamente, em alguns subúrbios do oeste de Jerusalém, habitados por populações judias seculares. Outras cidades onde ficou acima ou próximo da média nacional foram Eilat, no extremo Sul, junto ao mar Vermelho, e Metula, no extremo norte, junto à fronteira libanesa, bem como Rishon LeZion, Petah Tikva e Netanya, no centro, e Hadera, a norte. Teve, ainda, excelentes resultados nos kibutzim e nos moshavim, em especial no norte do país, tendo vencido em muitos deles, tal como entre os drusos do Nordeste e dos Golan. Este território sírio ocupado foi a única zona onde teve bons desempenhos nos colonatos.
Menos bons os resultados em Jerusalém (5,6%) e em cidades como Ramla, no centro, Acre, no Norte, e Sderot, no sul. Na maioria dos colonatos habitados por judeus ortodoxos e ultraortodoxos o seu desempenho foi bastante fraco, tal como nas povoações árabes, onde a sua implantação é residual, tendo ficado invariavelmente atrás do Likud.
Analisando a composição do seu eleitorado, verifica-se que 89% votou, nas últimas eleições, na coligação que o partido integrava, a que se somam 3,5% provenientes da abstenção e novos eleitores, igual percentagem do Likud, 1,5% da lista Labor-Meretz-Gesher e 2,5% de outras opções de voto.
A outra força política do centro, liderada por Benny Gantz, herdou o nome da coligação Kahol Lavan (Azul e Branco), que, um ano antes, colocara um grande desafio à liderança de Netanyahu. Esta era composta por três partidos: o Hosen L’Yisrael (Resiliência de Israel), formação centrista fundada em dezembro de 2018, por Gantz, social-liberal, laica e com uma abordagem mista da questão palestiniana, entre a procura da paz e o que considera vital para a segurança de Israel; o Yesh Atid (Há um Futuro), de Yair Lapid, de que já falámos, e o Telem (Movimento da Cidadania Nacional), de Moshe Ya’alon, economicamente liberal e menos aberto relativamente à questão palestiniana, situado no centro-direita do espectro partidário.
Porém, a pretexto do combate à pandemia, assinou um acordo de governo de unidade nacional com Netanyahu, em que este se comprometia a ceder-lhe a chefia do executivo a meio da legislatura. Os seus aliados consideraram que Gantz traíra os princípios da plataforma eleitoral e as suas declarações de que nunca integraria um governo presidido por um primeiro-ministro corrupto e abandonaram a aliança, que ficou reduzida ao seu partido.
Entretanto, este adotou o nome da antiga coligação, inspirado nas cores da bandeira israelita. Foi com esta designação que se apresentou a sufrágio, tendo obtido 6,63% dos votos e oito mandatos, um resultado superior ao que previam as sondagens e os analistas políticos, já que o seu líder ficara desacreditado perante muitos dos seus eleitores de há um ano. Antes, dispunha de 12 dos 33 lugares da aliança.
Do ponto de vista político, é uma formação de centro-direita, sem grandes diferenças face ao Yesh Atid, mantendo, no geral, as propostas defendidas na campanha eleitoral de 2020, que acima referimos. É menos aberto que aquele na questão palestiniana, embora Gantz, apesar de integrar o executivo de Netanyahu, se tenha oposto à sua intenção de anexar a totalidade da Cisjordânia. Contudo, defende o reforço da colonização dos Golan, afirmando que nunca os devolverá à Síria.
O seu resultado mais significativo foi o triunfo em Metula, a cidade mais setentrional do país, junto à fronteira libanesa, com 19,1% dos votos. Teve, ainda, bons desempenhos nos colonatos dos Golan, na sua maioria habitados por judeus seculares, e entre os drusos da mesma área e do Nordeste. Nesta região, também conseguiu boas votações em vários moshavim e, mesmo, em alguns kibutzim. Nas maiores cidades, os melhores resultados ocorreram em Tel Aviv (10,7%) e nas suas periferias, em especial em Ramat Gan, em Haifa (8,1%) e em alguns subúrbios laicos a oeste de Jerusalém. Ficou, ainda, acima da média em Petah Tikva e Richon LeZion, no centro, e em Hadera, no Norte.
Nas restantes cidades, em especial no Sul, os seus resultados foram menos bons. Em Jerusalém, não passou dos 3,3%. Também foram bastante fracos nos colonatos da Cisjordânia e dos arredores da “cidade santa”, em especial nos habitados por judeus ortodoxos e ultraortodoxos, e teve votações muito residuais nas povoações e tribos árabes.
O seu eleitorado é composto por 79% de eleitores que, em 2020, optaram pela aliança do mesmo nome, a que se juntam 11,5% vindos do Likud, 4% de abstencionistas e novos eleitores, 1,5% da coligação Labor-Meretz-Gesher, outro tanto do Yisrael Beiteinu e 2,5% de outras opções de voto.
O centro-esquerda e a esquerda
A principal formação desta área é o Labor (Trabalho), de centro-esquerda, o mais antigo partido político do país, que obteve 6,09% dos votos e elegeu sete parlamentares. Uma melhoria significativa face a 2020, quando a coligação com o Meretz, da esquerda, e o Gesher (Ponte), centrista, se ficara pelos 5,83% e sete lugares, dos quais apenas três pertenciam aos trabalhistas.
Os sucessivos desaires eleitorais que vem abrevando desde 2009 foram levando o Labor a “devorar” os seus líderes uns atrás dos outros. O anterior, Amir Peretz, aceitou participar no gabinete de unidade nacional, com Netanyahu e Gantz, como ministro da Economia, mas opôs-se aos planos do primeiro para anexar a Cisjordânia. Após a queda do governo, afirmou a sua intenção de não se recandidatar nestas eleições. As primárias, realizadas em janeiro deste ano, saldaram-se por um triunfo claro de Merav Michaeli, uma popular apresentadora televisiva, jornalista e professora universitária, conhecida pelas suas ideias feministas.
A verdade é que, de imediato, o partido, que parecia condenado ao desaparecimento, começou a subir nas sondagens e os resultados vieram a confirmar esse crescimento.
Os seus melhores resultados ocorreram nos kibutzim, em especial nos do Nordeste e dos ocupados Golan, onde obteve algumas vitórias, tendo estado, igualmente, bem na maioria dos mochavim e em algumas aldeias drusas. Na cidade setentrional de Metula, nessa região, chegou aos 15,6%. Nos principais centros urbanos, a sua maior votação ocorreu, como habitualmente, em Tel Aviv (14,8%) e áreas circundantes, bem como em algumas periferias ocidentais seculares de Jerusalém, enquanto os 6,8% de Haifa, seu antigo bastião, ficam pouco acima da média nacional
Em contrapartida, em Jerusalém (onde se ficou pelos 4,0%) e na maioria das cidades de média e pequena dimensão ficou quase sempre bem abaixo daquele valor. Nos colonatos da Cisjordânia, as suas votações foram, como habitualmente, bastante fracas, sendo residuais nos povoados por judeus ortodoxos e ultraortodoxos, o mesmo sucedendo nas povoações e tribos árabes.
A outra força política importante deste campo é o Meretz (Vigor), principal partido da esquerda israelita e o mais importante do chamado “campo da paz” entre a população judaica. Contrariando a maioria das sondagens, algumas das quais o colocavam abaixo da cláusula-barreira, conseguiu 4,59% do votos e seis lugares no Knesset. Em 2020, concorrera em coligação com o Labor e o centrista Gesher, que obteve 5,98% e sete mandatos, três dos quais para o Meretz.
Apesar de ser uma formação essencialmente hebraica, possui alguns aderentes árabes e um ou outro dirigente dessa origem étnica. O seu atual líder é Nitzan Horowitz, um antigo jornalista. Dois dos seis parlamentares que elegeu são árabes, uma das quais a ativista da paz Ghaida Rinawie Zoabi.
A possibilidade de ficar fora do Parlamento terá levado a que beneficiasse de algum “voto útil” de eleitores trabalhistas e de outros que, há um ano, optaram pela Lista Conjunta árabe.
Nestas eleições, tal como o Labor, o partido obteve os seus melhores resultados nos kibutzim do Nordeste, tendo vencido em alguns deles, e também teve um bom desempenho nos kibutzim dos Golan, nos moshavim e entre os drusos. Tendo grande parte da sua implantação nas elites intelectuais urbanas de origem ashkenazim, conseguiu, como habitualmente, um bom resultado em Tel Aviv, onde obteve 14,0%, pouco atrás dos trabalhistas. Também ficou acima da média nacional nas periferias da cidade, bem como nos nos subúrbios laicos a oeste de Jerusalém. Em Haifa (6,3%) e em Metula, no norte do país, ficou ligeiramente acima daquele valor.
Foi a única força política israelita a conseguir uma pequena votação nas cidades árabes de Nazareth (4,0%) e Umm-al-Fahm, no Norte, e de Abu Gosh, nos subúrbios de Jerusalém, o que mostra que consegue penetrar em pequenos segmentos do eleitorado árabe. Na “cidade santa” ficou-se pelos 3,7% e no resto do país, em especial nas pequenas cidades e nas áreas rurais mais conservadoras, a sua implantação é fraca ou, mesmo, residual, em especial no Sul. Sem surpresa, é praticamente inexistente nos colonatos e nas conservadoras tribos árabes beduínas.
O seu eleitorado tem, na respetiva composição, 40% de eleitores da coligação Labor-Meretz-Gesher de 2020, 31% da aliança Kahol Lavan de então, 23,5% da Lista Conjunta árabe, 4,5% da abstenção e novos eleitores e 1% de pequenos partidos, brancos e nulos.
(Extrema) direita laica
O maior partido desta corrente neste bloco é o Yisrael Beiteinu (Israel A Nossa Casa), liderado por Avigdor Lieberman, que obteve 5,63% dos votos, uma ligeiríssima descida face aos 5,74% de há um ano. Fundado em 1999, com o intuito de representar os judeus russófonos, provenientes dos países da ex-URSS, que haviam chegado em grande número ao Estado judaico, rapidamente se tornou uma das principais forças políticas do país.
Estamos em presença de uma formação secular e anticlerical (recorde-se que Lieberman rompeu com Netanyahu, em 2018, quando era ministro da Defesa, por não ter sido aceite a sua proposta de tornar o serviço militar obrigatório para os ultraortodoxos), mas ultranacionalista, defendendo “mão dura” face aos palestinianos, e liberal no plano económico.
Conseguiu os maiores apoios nas áreas urbanas habitadas por judeus russófonos, em especial no Sul, tendo sido segundo em Ashkelon (com 14,5%) e Beersheba (com 9,7%). Na região meridional, obteve, ainda, bons resultados em Ashdod (13,2%), Sderot, junto a Gaza, e Eilat, no mar Vermelho. No centro do país, também teve bons desempenhos em Rehovot, Netanya, Richon LeZion e Petah Tikva, e, no Norte, em Haifa (9,4%), Afula, Acre, Hadera e Kiryat Shmona, junto à fronteira libanesa. Também mostrou uma boa implantação entre os drusos, tendo vencido em Buqata, e nos colonatos habitados por populações laicas, como Ariel, onde foi segundo (16,4%).
Em Tel Aviv (3,7%) e, sobretudo, em Jerusalém (2,0%), os resultados foram bem menos positivos, tal como nas áreas rurais, em especial nos kibutzim e nos moshavim. Nos colonatos habitados por judeus ortodoxos e ultraortodoxos, a sua votação foi residual e, como seria de esperar, é inexistente nas zonas árabes.
Na composição do seu eleitorado, 83% foram seus eleitores em 2020, a que se acrescentam 6% vindos do Likud, 5% da aliança Kahol Lavan, 4% da abstenção e novos eleitores e 2% de outras opções de voto.
Por seu turno, conservou 77% dos que nele votaram há um ano, mas deixou fugir 6,5% para o Likud, 5% para a abstenção, 2% para o Yesh Atid, outro tanto para o Kahol Lavan e o mesmo para a Yamina, mais 1,5% para o Labor, igual percentagem para pequenos partidos e 2,5% para outras opções de voto.
A outra formação desta área é a Nova Esperança (NH), uma formação de centro-direita, liderada pelo ex-ministro das Finanças, Gideon Sa’ar, que, após ser derrotado por Netanyahu nas eleições internas do Likud, abandonou o partido, criando, em dezembro passado, esta nova força política, que obteve 4,74% dos sufrágios e elegeu seis deputados.
Trata-se de um partido representante do sionismo nacional-liberal. Assim, em matéria económica, defende a livre concorrência, a aposta na inovação tecnológica e a redução da burocracia, mas advoga algumas políticas redistributivas, de caráter assistencialista, em especial de apoio aos pequenos empresários, mas também o aumento do investimento na educação e na saúde. Defende o caráter judaico de Israel e o aumento da imigração judaica, embora seja favorável ao diálogo entre as diferentes comunidades do país. Apoia a limitação de mandatos dos governantes e a reforma do sistema eleitoral, com a passagem ao sistema alemão de representação proporcional personalizada. Na questão palestiniana, a sua posição não se distingue muito da do Likud.
No anterior Parlamento, conseguiu a adesão de dois parlamentares da aliança Kahol Lavan, dissidentes do Telem, que apoiaram o governo de união nacional e criaram uma fação denominada Derekh Eretz (Via da Terra). Quando Sa’ar abandonou o executivo, seguiram-no e aderiram à sua nova formação política.
Nestas eleições, os primeiros inquéritos de opinião foram-lhe bastante favoráveis, tudo indicando que poderia vir a ser a terceira força política do país. Porém, a sua posição ambígua sobre o apoio à indigitação de Yair Lapid ou à possibilidade de voltar a integrar um governo de Netanyahu levou a que, na última semana, começasse a cair nas sondagens e os seus resultados acabaram por ser dececionantes. Na noite eleitoral, Sa’ar rejeitou liminarmente a segunda daquelas hipóteses, embora não tenha sugerido ao presidente o nome do líder do Yesh Atid para primeiro-ministro.
Os seus melhores resultados ocorreram em vários colonatos habitados por judeus seculares, como Ariel (onde obteve 8,8%) e alguns dos Golan. Nas maiores cidades, ficou ligeiramente acima da média em BeerSheva (5,6%) e Haifa (5,4%), bem como em áreas periféricas de Tel Aviv. Nas restantes, obteve uma boa votação em Metula (9,1%), Hadera e Kiryat Shmona, no Norte, Rishon LeZion, Petah Tikva e Netanya, no centro, e Eilat, no Sul. Entre os drusos e em urbes como Ashkelon, Ashdod ou Dimona, no Sul, Ramla, no centro, Acre, no Norte, e em alguns subúrbios de Jerusalém teve um desempenho próximo da média nacional
Noutras cidades, como Tel Aviv (4,2%) e Jerusalém (3,3%), nos kibutzim e nos moshavim, os seus resultados ficaram, em geral, abaixo daquele valor. Muito fracos foram os obtidos nos colonatos habitados por religiosos, enquanto entre os árabes é quase inexistente.
O seu eleitorado tem as seguintes proveniências: 66% do Likud, 24% da coligação Kahol Lavan, 4,5% da abstenção e novos eleitores, 1,5% do Yisrael Beiteinu e 4% de outras opções de voto.
Lista Conjunta (JL)
A Lista Conjunta (JL), constituída por três formações da esquerda árabe, foi a grande derrotada destas eleições, tendo obtido 4,82% dos votos e seis deputados, quando, há um ano, tinha atingido uns históricos 12,7% e 15 lugares no Knesset.
Para isso contribuiu muito a fraca afluência às urnas do eleitorado árabe, que andou à volta dos 50%, quando a participação, em 2020, chegou aos 67%.
Contudo, desta vez, divergências entre os islamitas do Ra’am e as restantes forças políticas a propósito de questões de costumes não permitiram a apresentação de uma lista unificada. E, tal como também já sublinhámos, a diferente e hábil atitude de Netanyahu, procurando cortejar a população árabe em lugar de a hostilizar, levou muitos a não comparecer nas urnas, ainda mais em tempo de pandemia. A isso somam-se, ainda, o desencanto com as divisões entre os dirigentes, a estagnação do processo de paz e a ausência de uma verdadeira alternativa no que respeita à questão palestiniana.
A lista conjunta é constituída pelas três formações, cuja caracterização fizemos no artigo acima mencionado: o Hadash, acrónimo de Frente Democrática para a Paz e a Igualdade, e que, em hebraico, significa Novo, criado em 1977, da fusão entre o partido comunista israelita e outros grupos de esquerda judaicos, cujo líder é Ayman Odeh, que encabeçou a lista da coligação; o Ta’al, acrónimo de Movimento Árabe para a Renovação, um partido da esquerda nacionalista árabe, fundado pouco antes das eleições de 1996 por Ahmad Tibi, antigo conselheiro de Arafat e atual líder do partido, e o Balad, acrónimo de Aliança Democrática Nacional, nascido em 1995, um partido nacionalista árabe, liderado por Jamal Zahalka, quiçá o que mais tem posto em causa a natureza do Estado de Israel.
O seu principal suporte vem das classes médias árabes seculares da Galileia, no Norte, sendo que o Hadash é o partido com maior apoio entre os cristãos. Não surpreende, assim, que a lista tenha sido a mais votada em Nazareth, a maior cidade árabe do país, onde obteve 64,7% dos votos, e que tenha atingido os 80,5% em Umm-al-Fahm, próximo de Haifa e habitada esmagadoramente por árabes. Venceu, ainda, em Abu Gosh, subúrbio maioritariamente árabe a leste de Jerusalém, com 48,8%. Em Acre, no Noroeste, foi segunda, com 14,3% e ainda ficou acima da média em Haifa (7,2%) e em Ramla, no centro (6,3%).
Nas áreas beduínas do Negev, foi esmagado pelo Ra’am, ficando, frequentemente abaixo dos 10%. Em contrapartida, pouco penetrou entre drusos e alauitas do Nordeste e dos Golan.
O seu eleitorado é constituído por 93,5% de pessoas que nela votaram em 2020, mais 2,5% provenientes da abstenção e novos eleitores, 2,5% vindos da coligação Kahol Lavan, 1% da aliança Labor-Meretz-Gesher e 0,5% de brancos e nulos.
Por seu turno, apenas conservou 33,5% dos seus eleitores de há um ano, tendo perdido 27% para o Ra’am, 22% para a abstenção, 8% para o Meretz, 3% para o Labor, 2% para o Likud, 1,5% para brancos e nulos, igual percentagem para pequenos partidos (em especial, o NEP), 1% para o Yesh Atid e 0,5% para o Kahol Lavan.
Outros partidos
A votação em outras forças políticas foi residual, à exceção do partido da Nova Política Económica (NEP), criado em dezembro de 2020, pelo ex-ministro das Finanças e professor de Economia, Yalon Zelekha, de orientação social-democrata e anti-corrupção, que obteve 0,79%, e o movimento anti vacinação e defensor do investimento em saúde Rapha, Só Saúde, liderado pelo médico Aryeh Avni, que se ficou pelos 0,39%.
Votos brancos e nulos
Têm, em geral, pouco significado nas eleições israelitas. Nestas, a sua percentagem foi de 0,59%, um pouco mais que os 0,54% de há um ano.
A abstenção
A taxa de abstenção registou uma subida significativa, atingindo os 32,56%, contra os 28,44% das últimas eleições.
Esse crescimento do abstencionismo foi, como já referimos, fruto de uma queda abrupta da ida às urnas por parte do eleitorado árabe, pelas razões políticas que explicámos, para mais em tempos de pandemia. Já os eleitores judeus compareceram sensivelmente na mesma proporção, em especial os ortodoxos e ultraortodoxos.
De acordo com a nossa estimativa, a abstenção terá, em relação a 2020, a seguinte composição: 80% já não tinha votado então, somando-se, depois, 7% da Lista Conjunta árabe, 6% da coligação Kahol Lavan, 4% do Likud e 3% de outras opções de voto.
Na sequência lógica do que referimos, a JL foi a força política mais afetada pela abstenção, tendo visto fugir para esta 22% dos seus eleitores do ano passado. Seguiram-se os pequenos partidos (20%), a coligação Kahol Lavan (12%), o Likud (6%), a aliança Labor-Meretz-Gesher (5%), o Yisrael Beiteinu (5%), a Yamina alargada ao Sionismo Religioso (4%), o UTJ (3%) e o Shas (3%). Como se pode verificar, os eleitores religiosos abstiveram-se menos que os seculares.
O “puzzle” da formação do governo
Mais uma vez, Netanyahu falhou o seu objetivo de obter uma maioria parlamentar, já que, mesmo com o apoio da Yamina, terá apenas 59 dos 120 lugares do Knesset.
O primeiro-ministro, a braços com uma acusação formal de corrupção, tenta a todo o custo manter-se no poder, de forma a evitar ir a julgamento e, eventualmente, legislar de forma a poder continuar no cargo, reduzindo os poderes da procuradoria-geral, que deixaria de poder acusar judicialmente governantes em funções, e instituindo a possibilidade de o Knesset poder remover juízes do Supremo Tribunal, no que seria um golpe na independência do poder judicial.
Entretanto, na noite eleitoral, surgiu a grande “bomba”: o líder do Ra’am, Mansour Abbas, manifestou-se disponível para participar num governo liderado por Netanyahu. Desta forma, quebrou um tabu da política israelita, que nunca o centro-esquerda e os partidos árabes seculares conseguiram quebrar: a possibilidade de árabes integrarem o governo de Israel.
Claro que, tendo em conta o antagonismo histórico entre israelitas e palestinianos, a proposta do líder do Ra’am soa estranha. Porém, se pensarmos bem e nos alhearmos do contexto, ela faz algum sentido: os islamitas partilham com a direita religiosa judaica o mesmo conservadorismo social, o mesmo reacionarismo em matéria de costumes (especialmente, no que se refere aos direitos das mulheres e das pessoas LGBTQI+) e a ideia de uma sociedade regida por princípios teocráticos. Não por acaso, para além do apoio de alguns dirigentes do Likud, a proposta de Abbas foi bem acolhida pelos líderes da UTJ e do Shas.
O grande obstáculo à sua concretização está, porém, na extrema-direita judaica. O líder do Sionismo Religioso, Bezalel Smotrich, já disse que rejeita terminantemente apoiar um executivo com a participação de qualquer força política árabe. E, numa declaração provocatória, afirmou que Israel é o Estado dos judeus e que os árabes que não aceitem isso não tem nele lugar.
Por isso, Yair Lapid ainda não desistiu de tentar convencer o líder islamita a aderir ao bloco oposicionista, que, assim, teria os 61 votos necessários para ser investido como primeiro-ministro, mas, para já, não o conseguiu. Além de que, como já referimos, os partidos que o constituem pouco mais têm em comum que a sua oposição a Netanyahu, pelo que, afastado este, é muito provável que as divergências começassem a aparecer e o governo caísse em pouco tempo.
Aliás, Sa’ar já disse que não apoiará um executivo em que participe o Meretz e/ou a Lista Conjunta e Libermann também recusa a presença desta última no gabinete, embora não rejeitem que façam parte da maioria parlamentar.
Entretanto, o presidente Revlin, após consultar todas as forças políticas parlamentares quanto à personalidade a indicar para chefiar o próximo governo, optou pelo atual primeiro-ministro. De acordo com o Chefe de Estado, o seu nome foi indicado por quatro partidos (Likud, Shas, UTJ e Sionismo Religioso), que possuem 52 lugares no Knesset, enquanto cinco (Yesh Atid, Kahol Lavan, Labor, Yisrael Beiteinu e Meretz) indicaram o de Lapid, mas apenas asseguram 45 votos. Por seu turno, a Yamina apontou o seu líder, Naftali Bennett, que não esconde as suas ambições ao cargo, mas só possui sete deputados, enquanto que a Nova Esperança, a Lista Conjunta e o Ra’am não propuseram ninguém. Mas ele próprio declara-se pouco convencido que Netanyahu consiga formar governo neste quadro.
Uma possibilidade seria Netanyahu aceitar a proposta de Abbas e substituir o Sionismo Religioso pela Nova Esperança, mas Sa’ar, que abandonou o governo em rutura com o primeiro-ministro, não parece disposto a isso, apesar de, formalmente, não ter apoiado a indigitação de Lapid para liderar o novo gabinete. Escrevi aqui que, ao contrário do que se pensa, o chefe do governo, apesar de se filiar no sionismo conservador, não é um fanático ideológico, mas, antes, um pragmático e oportunista sem escrúpulos, que tudo fará para se manter no poder, nem que, para tal, tenha de aliar-se ao “diabo”. Porém, nunca pensei que ele pudesse vir a fazer um acordo de governo com uma formação árabe islamita. Mas também sabemos que, no Médio Oriente, são sempre possíveis as alianças mais improváveis.
Outra hipótese a considerar seria a de Gantz voltar a “dar a mão” a Netanyahu e integrar o novo governo, nos termos do acordo anterior, que lhe permitiria tornar-se primeiro-ministro daqui a um ano. Mas não estará o ex-general “escaldado” perante o que se passou? Estará disposto a arriscar a sua credibilidade numa experiência que correu mal uma vez e tem tudo para voltar a correr, dado o maquiavelismo do atual chefe do governo? Para já, nada indica que tal venha a suceder, mas, na política israelita, o que hoje é mentira, amanhã pode ser verdade.
Por esse motivo, são vários os analistas políticos do país que falam já de uma nova ida às urnas no verão. O quinto ato eleitoral em pouco mais de dois anos e nada indicia que resolvessem o impasse.
Enquanto isso, a questão palestiniana continua “em banho-maria”. Para já, a Fatah e o Hamas chegaram a um acordo para a realização de eleições para o Parlamento e para a presidência da Autoridade Palestiniana, as quais terão lugar, respetivamente, a 22 de maio e a 31 de julho.
Aguardemos, então, as cenas dos próximos capítulos daquilo que parece uma novela sem fim à vista.
Artigo de Jorge Martins