Na quarta-feira, uma base de dados online de um grupo Quaker sediado nos Estados Unidos listava mais de duas dúzias de empresas que lucravam com o derramamento de sangue na Faixa de Gaza, onde as forças israelitas passaram as últimas 10 semanas a travar aquilo a que os especialistas chamam uma guerra "genocida" que fez disparar as ações das empresas do sector da Defesa.
Apoiado por 3,8 mil milhões de dólares de ajuda militar anual dos Estados Unidos, Israel declarou guerra a 7 de outubro, em retaliação a um ataque liderado pelo Hamas que matou mais de 1.100 pessoas. Desde então, as forças israelitas mataram mais de 20.000 palestinianos em Gaza - dando origem a enormes protestos exigindo um cessar-fogo em todo o mundo, incluindo muitos liderados por judeus.
O número crescente de mortos, desalojados, destruição de infra-estruturas civis e dificuldades na entrega de ajuda humanitária ao enclave sitiado também aumentaram o escrutínio de um pacote de 14,3 mil milhões de dólares para a guerra que a administração Biden solicitou ao Congresso, bem como as críticas aos fabricantes de armas dos EUA e aos doadores bilionários que estão a armar e a apoiar as Forças de Defesa de Israel (IDF).
"A escala de destruição e os crimes de guerra em Gaza não seriam possíveis sem as transferências maciças de armas dos EUA", disse Noam Perry, do American Friends Service Committee (AFSC), o grupo por trás da iniciativa, em comunicado na quarta-feira. "À medida que a resistência global à guerra e ao apartheid cresce, é importante que o público saiba exatamente quem está a tornar possível esta violência."
Como a página web da AFSC descreve:
Pouco depois de 7 de outubro, o governo dos EUA começou a transferir para Israel quantidades maciças de armas. Entre essas armas, Israel recebeu mais de 15.000 bombas e 50.000 projécteis de artilharia apenas no primeiro mês e meio. Estas transferências têm sido deliberadamente envoltas em secretismo para evitar o escrutínio público e impedir o Congresso de exercer qualquer controlo significativo.
Algumas destas armas foram adquiridas com o dinheiro dos contribuintes americanos através do programa de vendas militares ao estrangeiro; outras foram vendas comerciais diretas adquiridas através do próprio orçamento de Israel; e outras ainda foram reabastecidas com stocks militares americanos em Israel, que os militares israelitas também podem utilizar. O Fórum sobre o Comércio de Armas mantém uma lista das transferências de armas dos EUA conhecidas.
A página na internet refere que a lista se baseia em relatórios, redes sociais e outras fontes abertas, e "centra-se nas armas utilizadas por Israel porque todos os grupos militantes palestinianos já estão sancionados e não recebem apoio de governos ou empresas ocidentais".
Por exemplo, a Boeing, o quinto maior fabricante de armas do mundo, fabrica os caças F-15 e os helicópteros de ataque Apache AH-64 utilizados pelas forças israelitas, bem como "vários tipos de bombas não guiadas de pequeno diâmetro (SDB) e kits de Munições Conjuntas de Ataque Direto (JDAM)" que foram utilizados "em grande escala" durante a guerra, incluindo num bombardeamento do campo de refugiados de Jabalia, em Gaza.
Depois de décadas em que as forças de ocupação israelitas utilizaram os bulldozers blindados D9 da Caterpillar para "demolir casas palestinianas e infra-estruturas civis na Cisjordânia ocupada e para impor o bloqueio à Faixa de Gaza", as máquinas "foram cruciais na invasão terrestre" do enclave por parte dos militares israelitas, segundo a AFSC.
Israeli forces are invading the Nour Shams refugee camp in Tulkarem, bringing a bulldozer to destroy infrastructure belonging to the refugees there. This is on the same day that Israeli forces bulldozed and murdered displaced people and their tents in Kamal Adwan hospital, Gaza. pic.twitter.com/CH3gdoe1Zd
— Good Shepherd Collective (@Shepherds4Good) December 16, 2023
Embora ambos os especuladores de guerra estejam sediados nos Estados Unidos, a lista não se limita a empresas americanas, destacando também o sétimo maior fabricante de armas do mundo, a BAE Systems do Reino Unido, e o maior fabricante de armas de Israel, a Elbit Systems, "um dos principais fornecedores de armas e sistemas de vigilância para os militares israelitas".
Outras empresas da lista incluem gigantes do armamento como a General Dynamics, a General Electric, a L3Harris Technologies, a Leonardo, a Lockheed Martin, a Northrop Grumman e a RTX - antiga Raytheon - bem como as empresas de veículos AM General, Ford, Oshkosh, Toyota e os fabricantes de drones AeroVironment, Skydio e XTEND.
A lista também visa a Colt's Manufacturing Company, sediada nos EUA, que fabrica armas de fogo, incluindo a M16, e a Emtan Karmiel, uma empresa israelita que "entregou cerca de 12.000 espingardas" às forças do país na semana a seguir a 7 de outubro. Inclui também a Israel Aerospace Industries, uma empresa estatal que "fabrica vários sistemas de armas especificamente para as forças armadas israelitas".
Israeli journalist says Jews who want to live in Israel have no choice but to take up arms
There is no choice for a Jew who wants to live in the land of Israel, except to hold the Tanakh (Hebrew scriptures) in one hand, and in the other hand, hold an M16 rifle. pic.twitter.com/XlU19KS3Lp
— Middle East Monitor (@MiddleEastMnt) December 20, 2023
Outras empresas israelitas incluídas na lista incluem a Plasan, que fabrica o veículo blindado ligeiro SandCat, e a MDT Armor, que é propriedade da empresa israelita Shladot e fabrica o veículo blindado ligeiro David Urban, utilizado pelos militares para patrulhas e reconhecimento.
As outras empresas estrangeiras que constam da lista são a ThyssenKrupp, a empresa alemã que construiu quatro navios de guerra para Israel, e a Nordic Ammunition Company, que fabrica o M141 Bunker Defeat Munition, um foguete "bunker-buster" disparado do ombro.
"Enquanto organização Quaker com uma longa história de trabalho na Palestina e em Israel, incluindo em Gaza, apoiamos um embargo total de armas aos grupos militantes israelitas e palestinianos", sublinhou Perry na quarta-feira. "A guerra e os ataques a civis nunca trarão segurança ou paz a israelitas ou palestinianos. Precisamos de um cessar-fogo permanente e de trabalhar para uma paz justa e duradoura na região."
Jessica Corbett é editora sénior e redatora da equipa do Common Dreams. Artigo publicado em Common Dreams. Traduzido por Luís Branco para o Esquerda.net.