Cem dias de governo de Milei com efeitos devastadores na vida dos argentinos

20 de março 2024 - 21:45

Sondagem revela que a situação de sete em cada dez argentinos piorou. Amnistia Internacional refere que ao empobrecimento económico soma-se “um novo modelo de liderança de não diálogo e violência permanente”. Javier Milei enfrenta grande contestação.

PARTILHAR
Javier Milei. Foto Oliver Kornblihtt / Mídia NINJA

As medidas ultra-liberais de Javier Milei, os cortes no financiamento das províncias ou das cantinas comunitárias e organizações sociais estão a ter um efeito devastador na vida da maioria da população argentina.

Um relatório de Amnistia Internacional assinala que, ainda que tenha decorrido pouco tempo desde a chegada de Milei ao poder, é preocupante “o impacto profundo” que têm tido algumas medidas impostas “na vida e nos direitos das pessoas”.

Segundo esta ONG internacional, o Governo de Milei tem desenvolvido uma “receita infalível composta por confrontação e desinformação para romper limites que geraram retrocessos em matéria de direitos humanos”.

Ao “empobrecimento económico de grande parte da sociedade”, acresce “um novo modelo de liderança de não diálogo e violência permanente”, denuncia a Amnistia Internacional.

Mariela Belski, diretora executiva de Amnistia Internacional Argentina, avançou ainda que os ataques do presidente argentino à oposição, jornalistas, sindicatos, artistas, meios de comunicação e organizações sociais “tem efeitos silenciadores e intimidatórios que atentam contra a liberdade de expressão”.

A ONG identifica entre as maiores vítimas de Milei os pensionistas, não só no que respeita à sua “capacidade de compra, mas também em termos de tranquilidade e dignidade”. A Amnistia Internacional acusa Milei de não estar a castigar os poderosas, mas sim a maioria da população e, especialmente, os mais desprotegidos.

Confiança no Governo em queda acelerada

Uma sondagem da empresa Zuban Córdoba revela que sete em cada dez argentinos viram a sua situação piorar desde que Javier Milei chegou ao poder, e que 88,5% da população está de acordo com a frase “os cortes estamos a pagá-lo todos”. Esta afirmação contrasta com as declarações de Milei, no sentido de que as medidas impostas se dirigiam exclusivamente à “casta”. Sobre a responsabilidade da crise que a Argentina enfrenta, 52% culpa Milei, face a 46% que responsabiliza o ex-presidente Alberto Fernández.

Acresce que 56,3% da população argentina espera que os deputados chumbem o DNU, e que 55,4%, pensa que “o país vai na direção errada”. Em dezembro, a tendência era a inversa, com 54,3% dos inquiridos a declarar a sua confiança no rumo económico do Governo. Segundo a Zuban Córdoba, a confiança no Governo caiu 12 pontos nestes três meses.

Milei sofre novo revés

O Decreto de Necessidade e Urgência (DNU) de Milei, marcado pela liberalização e desregulação da economia, a privatização das empresas públicas,o embaratecimento e facilitação dos despedimento, a derrogação da lei do arrendamento que protege os inquilinos e o ataque feroz ao Estado Social, sofreu um novo revés ao ser recusado, no passado dia 15 de março, pelo Senado da argentina. O futuro deste mega decreto depende agora da próxima votação na Câmara de Deputados.

A 6 de fevereiro, Milei sentiu-se “traído” quando a “oposição amigável” devolveu a outra grande medida destes primeiros três meses, a chamada Lei Ónibus, ao seu ponto de partida.

Milei enfrenta forte contestação

Nestes cem dias de governo, Milei já foi confrontado com uma greve geral e mobilizações diárias.

Para o próximo dia 24 de março, aniversário do golpe de Estado militar e dia da memória e dos direitos humanos em Argentina, está agendada uma grande manifestação unitária que voltará a desafiar o Governo de Milei e o seu plano económico. Esta iniciativa contará com a mobilização de movimentos de direitos humanos, a CGT, os sindicatos da CTA e uma ampla coligação de organizações sociais.

“A pauperização geral da economia e os ataques a quem expõe vozes de contestação conduzem ao conflito social. Esta crua realidade não pode se anular, por mais repressão e restrições que se imponham. Quando sucede o protesto é porque a tensão que gera o conflito é insustentável. À fome não se dá resposta com mão de ferro”, afirmam os promotores do protesto.

A contestação deverá subir ainda mais de tom na medida em que, dia 31 de março corresponde à data limite que Milei estabeleceu para executar uma segunda onda de despedimentos. “Na terça-feira ou quarta-feira da semana que vem vão ser determinantes”, advertiu a Associação de Trabalhadores do Estado (ATE).

"É iminente o despedimento de milhares de funcionários públicos. Temos que aprofundar o nosso plano de luta e definir medidas de força”, frisou o secretário geral da ATE, Rodolfo Aguiar.