A receita fiscal perdida no ano passado na Europa só no sector da aviação foi de 34.200 milhões de euros, o que daria para construir uma linha ferroviária de alta velocidade com 1.400 quilómetros de extensão, conclui o mais recente estudo da Federação Europeia de Transportes e Ambiente.
A associação ambientalista Zero, que integra a federação, diz que em Portugal essa diferença correspondeu no ano passado a 1.200 milhões de euros, com o Estado a cobrar apenas 10% do que devia. Ou seja, bem abaixo dos 16% cobrados no conjunto dos países da União Europeia, onde a receita fiscal perdida ascendeu a 26.400 milhões de euros. Se os benefícios fiscais não forem revistos em Portugal, esta borla fiscal vai aumentar para 1.400 milhões em 2025, refere a Zero em comunicado citado pela agência Lusa.
No caso português, a Zero destaca os 450 milhões concedidos à TAP em isenções e benefícios fiscais no ano passado, dos quais "270 milhões de euros por via direta de impostos sobre o combustível e sobre o preço do carbono e 180 milhões por via indireta do IVA e taxas de que os seus passageiros beneficiam". Os ambientalistas defendem a aplicação do princípio do poluidor-pagador na aviação, no qual as companhias e os passageiros arcam com os custos de "todos os prejuízos climáticos e ambientais que originam". Isso resultaria numa taxa a rondar em média 20 euros por viagem doméstica, 48 euros por viagem intraeuropeia e 281 euros em viagens intercontinentais, abrindo caminho a uma diferenciação nestes preços, consoante o número de viagens por passageiro.
A análise olha para as tributação que devia estar a ser feita se o sector da aviação não beneficiasse de isenções e benefícios fiscais, comparando-a com a tributação realmente existente. A diferença resulta num fosso fiscal de 34.200 milhões de euros, com o Reino Unido, França, Espanha e Alemanha a liderar a tabela. A maior fatia desta diferença - 20.500 milhões - diz respeito a taxas sobre combustíveis e emissões de carbono que não são pagas. As duas companhias que mais beneficiam deste fosso fiscal são a Air France e a Lufthansa, com 2.400 e 2.300 milhões de receita fiscal perdida, respetivamente.
"A Europa está a perder dinheiro por não tributar o sector da aviação. As companhias aéreas preparam-se para atingir lucros recorde este ano, ao mesmo tempo que lançam combustíveis sujos nos nossos céus. Mas os governos não estão dispostos a tocar nas suas queridas transportadoras nacionais. Como podem justificar aos cidadãos que os condutores paguem mais impostos do que a Air France e a Lufthansa pelo seu combustível?", questiona Jo Dardenne, diretora de aviação da federação.
Este fosso fiscal vai agravar-se no futuro, com o crescimento previsto do sector da aviação. A menos que sejam tomadas medidas para começar a taxar as companhias aéreas, aquele valor irá aumentar 38% já em 2025, ano em que se prevê a recuperação completa da atividade da aviação em relação aos valores pré-covid.
"Os mais ricos têm estado a pagar muito pouco pelos seus hábitos de voo"
O estudo recomenda a aplicação de um imposto sobre a querosene, uma taxa de 20% de IVA nos bilhetes e o alargamento do mercado de carbono na aviação a todos os voos. Sem estas medidas, a recomendação vai para a aplicação de uma taxa por bilhete equivalente ao fosso fiscal de cada país.
A queda na procura do transporte aéreo que resultaria da ausência destas borlas fiscais, com o aumento do preço dos bilhetes, significaria uma poupança nas emissões de CO2 de 35 megatoneladas em 2022. "A tributação não deve ser entendida como um castigo, mas sim como uma forma de cobrar justamente àqueles que mais beneficiam da falta de regulamentação da aviação. Os mais ricos da sociedade têm estado a pagar muito pouco pelos seus hábitos de voo. Para além disso, a tributação não limitará a capacidade de investimento da aviação. Pelo contrário, a tributação da aviação beneficiará os cidadãos e o sector a longo prazo, uma vez que os governos intervêm para financiar a transição para as energias limpas, incluindo a aviação. É tempo de acabar com a era dos voos baratos e com o aumento das emissões", defende Jo Dardenne.