Em frente à fachada do edifício que já albergou a Escola Superior de Dança, Mariana Mortágua assinalou que o antigo palácio Pombal “conta bem o que é a história de Lisboa”. Neste momento, uma parte do imóvel é pública, outra camarária e uma terceira de privados, a que Carlos Moedas atribuiu licença para hotel de luxo. E a parte pública, do Instituto Politécnico de Lisboa, está à venda, e é destinada a habitação de luxo.
O que o Bloco defende é que “este edifício, como muitos outras nas mesmas circunstâncias, possam transformar-se em residências universitárias”.
E essa transformação “pode acontecer num muito curto espaço de tempo, mediante obras de recuperação do prédio”, explicou a coordenadora do Bloco.
Mariana Mortágua lembrou que, “em Lisboa, como em quase todo o país, a oferta de alojamento estudantil regrediu”. Essa redução foi de quase 60% na capital, e “isso aconteceu porque as casas anteriormente destinadas a estudantes passaram a estar destinadas a alojamento local, a turismo de nómadas digitais ou foram vendidas para habitação de luxo”, detalhou.
De acordo com a líder bloquista, o Estado não só não deu resposta a este problema como “ajudou no processo”, dando “incentivos fiscais aos nómadas digitais, incentivos à habitação de luxo, a não residentes endinheirados que cá vêm comprar casas e sem qualquer regra para o alojamento local”.
Mariana Mortágua reforçou que, perante a crise de habitação que atravessa, a opção do Governo e das autarquias não pode ser vender património. Uma das soluções, conforme defendeu, passa por reabilitar edifícios públicos, que podem ser reutilizados como residências estudantis.
E o Bloco avança que fará nesta campanha aquilo que o Governo não tem feito: identificar alguns imóveis do Estado que possam ser destinados a habitação a custos controlados ou residências estudantis.
Palácio Pombal: um elemento fulcral da memória coletiva da cidade
O edifício está abandonado desde 2018. Na altura, na sequência das queixas de alunos e professores sobre as más condições do edifício, a Escola Superior de Dança foi transferida, provisoriamente, para o campus do Instituto Superior de Engenharia. No entanto, nunca chegaram a ser feitas obras no edifício do Chiado.
O Estado, através do Instituto Politécnico de Lisboa, já tentou, por três vezes, vender o imóvel por, pelo menos, 10 milhões de euros. Ou seja, o edifício acabará afeto a habitação de luxo ou à hotelaria. Isto num momento em que o Governo, agora em gestão, anunciou medidas de apoio à habitação, entre elas, a colocação de casas devolutas no mercado de arrendamento.
É de assinalar que, na zona onde fica localizado o edifício, foram registados aumentos nas rendas de mais de 50% e nos preços do metro quadrado de mais de 64%, e não faz falta mais habitação de luxo, alojamentos locais e hotelaria, e sim casas onde quem cá vive e cá trabalha possa viver.
Acresce que o edifício integra a memória coletiva da cidade. Toda a zona está repleta de história e conheceu uma intensa participação cívica e atividade cultural. O imóvel onde está localizado atualmente o Ministério do Ambiente albergava o jornal “O Século”.
Com mais esta alienação, dá-se um novo passo no sentido da desertificação do centro da cidade, cada vez mais desprovido de vida cultural, cívica e de espaços de memória viva.
O Palácio Pombal, também conhecido por Palácio dos Carvalhos, foi mandado construir na 1ª metade do séc. XVII, pelo avô de Sebastião José de Carvalho e Melo, futuro Marquês de Pombal. Após o terramoto de 1755, entre 1760 e 1770, foi ampliado e melhorado. A par de ter albergado a Escola Superior de Dança, e de ter sido neste espaço que nasceu Marquês de Pombal, foi aqui que se fixou a primeira sede intersindical existente em Portugal, inaugurada há, precisamente, 113 anos. Entre 30 de janeiro e 31 de fevereiro, houve uma operação repressiva sobre o movimento sindical em que a GNR instalou uma peça de artilharia para obrigar os operários a obrigar as instalações recém inauguradas. Os trabalhadores formaram então um cordão no largo em frente ao edifício e cantaram a Internacional ao mesmo tempo que eram escoltados até duas fragatas militares estacionadas no Tejo onde foram aprisionados por dias ou meses. Esta foi a primeira vaga repressiva da I República sobre o movimento operário.