O presidente dos EUA aprovou sanções aos juízes e funcionários do Tribunal Penal Internacional (TPI) que tenham participado em casos contra cidadãos estadunidenses ou de países aliados como Israel. A ordem executiva assinada por Donald Trump quando recebeu na Casa Branca Benjamin Netanyahu, o primeiro-ministro israelita alvo de um mandado de detenção do TPI por crimes de guerra e contra a humanidade, prevê o congelamento de bens no território dos EUA e proibições de viagem para os alvos das sanções e respetivos familiares. E estabelece um prazo de 60 dias para a divulgação da lista das pessoas alvo destas sanções.
Trump alega que nem os EUA nem Israel fazem parte do TPI ou são signatários do Estatuto de Roma, pelo que não reconhecem a sua jurisdição. Diz ainda que os mandados de detenção a Netanyahu e ao então ministro da Defesa Yoav Gallant são um “precedente perigoso” que põe em perigo os militares estadunidenses e a segurança nacional do país. Na semana anterior à assinatura deste decreto, os Republicanos tentaram aprovar no Senado sanções ao TPI por causa dos mandados de detenção dos dirigentes israelitas, mas os Democratas bloquearam a tentativa.
Esta não é a primeira vez que Trump aprova sanções contra o TPI. Em 2020, a procuradora gambiana Fatou Bensouda, que investigava denúncias de crimes de guerra cometidos no Afeganistão e nos territórios palestinianos ocupados, foi alvo de um decreto presidencial a proibir viagens para os EUA e congelar os seus bens no país, além de sofrer perseguição e ameaças de um chefe da Mossad.
Em comunicado, a presidente do Tribunal Penal Internacional reagiu lamentando o decreto de Trump. Para Tomoko Akane, esta é “apenas a mais recente de uma série de ataques sem precedentes e em escalada com o objetivo de enfraquecer a capacidade do Tribunal de administrar a justiça em todas as situações”. A juíza acrescenta que “tais ameaças e medidas coercivas constituem sérios ataques contra os Estados Partes do Tribunal, o Estado de Direito baseado na ordem internacional e milhões de vítimas”.
Meloni e Orbán não subscrevem apoio ao TPI
Em defesa do TPI contra as sanções de Donald Trump, 79 dos 125 Estados-membro, incluindo Portugal, assinaram uma declaração de apoio. “Sancionar o TPI ameaça a independência do Tribunal e mina o sistema de justiça penal internacional”, afirmou António Costa, o presidente do Conselho Europeu. Também Ursula von der Leyen se pronunciou a garantir que “a Europa estará sempre a favor da justiça e do respeito do direito internacional”.
Mas na União Europeia nem todos os países assinaram a declaração. Dos grandes estados europeus, destaca-se a ausência da Itália, o país onde o tribunal foi fundado. Além de ter sido a única chefe de Governo europeia a marcar presença na tomada de posse de Donald Trump, a primeira-ministra Giorgia Meloni está na mira da investigação do TPI por ter deixado fugir do país um general líbio autor de crimes de guerra e tortura.
Outro aliado de Trump, Viktor Orbán, também não assinou a declaração e já afirmou que irá rever a participação da Hungria no tribunal. Entre os países que não integram nem reconhecem a jurisdição do TPI estão os EUA, a Coreia do Norte, Israel, Rússia, India e China.
Musk pediu, Trump assinou: EUA cortam apoio financeiro à África do Sul
Na sexta-feira, Donald Trump assinou um novo decreto com sanções à África do Sul, que apresentou a queixa no TPI contra Israel por genocídio em Gaza. Esta queixa é mencionada no decreto, a par de uma lei que facilita a expropriação de terrenos privados para fins públicos. O braço direito de Trump, o bilionário Elon Musk nascido na África do Sul, já tinha vindo acusar o governo de Pretoria de aprovar “leis racistas sobre a propriedade” que teriam como alvo a população branca do país, palavras agora repetidas por Trump. Além das sanções, o Presidente aprovou a prioridade à ajuda humanitária a eventuais refugiados sul-africanos brancos.
Em resposta, o Ministério dos Negócios Estrangeiros da África do Sul considerou “irónico que a ordem executiva preveja um estatuto de refugiado nos EUA para um grupo de pessoas na África do Sul que continua a estar entre os mais privilegiados economicamente, enquanto pessoas vulneráveis do resto do mundo nos EUA são deportados e veem negado o asilo, apesar de estarem numa situação muito má”.
Entrevista
Como o extremismo de Musk está a influenciar Trump e a política mundial
O Presidente Cyril Ramaphosa diz que não se deixa atemorizar e que o Governo não confiscou qualquer terreno. Na África do Sul, passados 30 anos após o fim do apartheid, apenas 4% das terras que são propriedade privada pertencem a proprietários negros. A população branca - cerca de 8% do total de sul-africanos - detém três quartos das terras do país.
O distanciamento entre o novo governo dos EUA e a África do Sul ficou também patente no anúncio do chefe da diplomacia de Washington, Marco Rubio, de que não irá a Joanesburgo participar na cimeira do G20 porque “a África do Sul está a fazer coisas muito más. Expropria propriedade privada. Utiliza o G-20 para promover a solidariedade, a igualdade e a sustentabilidade. Por outras palavras, a DEI [acrónimo dos programas para inclusão de minorias que estão na mira da Casa Branca] e as alterações climáticas. O meu trabalho é promover os interesses nacionais dos EUA, não esbanjar dinheiro dos contribuintes nem fomentar o anti-americanismo”, escreveu Marco Rubio nas redes sociais.