Ao longo dos últimos meses, têm surgido indícios de fraude associados ao SIFIDE, um dos benefícios fiscais à inovação em Portugal. Em setembro, o secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, António Mendonça Mendes, reconhecia a existência de abusos por parte de empresas que beneficiavam duas vezes do mesmo apoio e prometia corrigir “a breve prazo” a situação identificada pela Autoridade Tributária e pela Inspeção-Geral das Finanças. No entanto, o Governo decidiu manter este regime inalterado no Orçamento do Estado para 2023. Este é um resumo do que está em causa com esta decisão.
1. O que é o SIFIDE?
O Sistema de Incentivos Fiscais em Investigação e Desenvolvimento Empresariais (SIFIDE) é um benefício fiscal concedido às empresas pelo Estado português, cujo objetivo seria o de fomentar o investimento na inovação. Este regime, criado em 1997 e alterado algumas vezes desde então, permite às empresas deduzir na coleta de IRC até 82,5% da despesa em investigação e desenvolvimento (I&D).
No Orçamento do Estado para 2011, com a criação do SIFIDE II, o benefício fiscal passou a abranger, além das despesas efetuadas em investigação, também a “participação no capital de instituições de I&D e contributos para fundos de investimentos, públicos ou privados, destinados a financiar empresas dedicadas sobretudo a I&D”. Ou seja, o SIFIDE II passou a permitir um abate ao imposto sobre os lucros de até 82,5% dos montantes gastos, já não diretamente em investimento, mas em participações de fundos de capital de risco. O Orçamento do Estado de 2020 prolongou a vigência do SIFIDE II até 2025.
2. Quais os impactos desta borla fiscal?
Trata-se de um dos regimes de benefícios fiscais à inovação mais favoráveis da Europa. Entre 2006 e 2019, a despesa fiscal total do SIFIDE foi de 2.796 milhões de euros, tendo atingido em 2019 o seu valor mais elevado, 430 milhões. Apesar da elevada despesa fiscal associada ao SIFIDE, o escrutínio dos reais impactos associados a este benefício é quase inexistente.
E há suspeitas que sirva apenas para as : as empresas que investem em fundos para obter benefícios fiscais SIFIDE recuperam o dinheiro investido, seja sob a forma de empréstimos sem juros ou injeções de capital por parte desses fundos em subsidiárias suas, seja recebendo diretamente investimentos de outros fundos geridos pela mesma gestora (e, por sua vez, vendidos a outras empresas que também acedem ao SIFIDE).
3. Bloco já questionou Governo
O Bloco já questionou o Governo no sentido de saber quais os benefícios atribuídos e a que empresas gestoras de fundos e qual o montante do investimento efetivamente realizado, bem como as diligências que o executivo tomou para garantir a não existência de financiamentos cruzados entre fundos e a utilização abusiva deste benefício fiscal.
Agora, o Bloco entregou um requerimento na Assembleia da República para exigir ao Ministério das Finanças que entregue o relatório da Autoridade Tributária e da Inspeção-Geral das Finanças, bem como todos os documentos da auditoria, aos deputados.