Mandato de Moedas falhou na resposta às pessoas em situação de sem-abrigo

A crise na habitação tem aumentado o número de pessoas a viver nas ruas de Lisboa. Mas o plano de Moedas só previa novas vagas e centros de acolhimento para depois de 2026. Pressão do Bloco conseguiu aprovar duplicação de vagas em housing first até ao final do mandato.

13 de outubro 2024 - 11:50
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Moedas e as pessoas sem-abrigo na Baixa de Lisboa

Recém-chegado à presidência da autarquia, uma das primeiras decisões do Carlos Moedas deu o sinal do que viria a ser o resto do mandato: a poucos dias do Natal, mandou encerrar dois centros de acolhimento de emergência para pessoas em situação de sem-abrigo, parte do dispositivo instalado pela vereação bloquista dos direitos sociais no mandato anterior para responder à pandemia e aos seus efeitos no aumento do número de pessoas a viverem na cidade sem um teto.

Outro projeto iniciado pela vereação anterior foi o centro de resposta instalado no Quartel de Santa Bárbara que reunia vários serviços de acompanhamento, das questões sociais de saúde ou de saúde mental, com uma localização privilegiada junto da zona onde mais pessoas em situação de sem-abrigo se concentram, na freguesia de Arroios. Uma instalação com prazo de validade anunciado, pois aquele espaço estava já reservado para a construção de habitação acessível. Quando esse prazo de validade se aproximou, a estratégia de Moedas era a de dispersar aqueles serviços por quatro localizações em bairros sociais na zona oriental da cidade, o que foi criticado por toda a oposição, que defendeu uma solução no centro da cidade. A solução encontrada com o anterior Governo, após meses do habitual “passa-culpas” que tem marcado a gestão de Moedas, passou pela cedência da ala norte do edifício da Manutenção Militar para transferir este equipamento.

A par da pandemia, o aumento do número de pessoas em situação de sem-abrigo ficou a dever-se em grande parte à crise da habitação, com os centros de acolhimento a receberem cada vez mais gente que trabalha e não consegue pagar uma renda.

Em vez de trabalhar para dar resposta imediata a este aumento da população mais vulnerável da cidade, o executivo de Moedas tem resistido o mais que pode a acelerar essa resposta. Prova disso foi o debate do Plano Municipal para as Pessoas em Situação de Sem Abrigo (PMSSA) 2024-2030, com a proposta inicial a prever a abertura de novas vagas e novos centros de abrigo só após 2026, impedindo assim o crescimento da resposta em 2024, 2025 e 2026. “Não podemos ficar oito anos com a resposta de alojamento pensadas em 2019. Isso não faz sentido, o momento é agora”, defendeu na altura Beatriz Gomes Dias, com o Bloco a conseguir fazer aprovar, apesar da oposição de Moedas, a duplicação até ao final deste mandato de 400 para 800 vagas previstas no plano para a modalidade de housing first, que assenta no princípio de que a atribuição de uma moradia é o primeiro passo na reintegração na vida ativa. 

Apesar de ter votado contra a medida e de ter enfraquecido o dispositivo criado pela vereação anterior do Bloco, Moedas não perdeu depois a oportunidade de se gabar que “Lisboa é a cidade em Portugal que mais faz” em termos de resposta aos sem-abrigo e que até lançou um plano para duplicar o número de vagas.

Na mesma entrevista, a propósito dos imigrantes a viverem em tendas há mais de um ano junto à igreja dos Anjos, Moedas atribuiu culpas à “extrema-esquerda” pela situação daquelas pessoas sem-abrigo, afirmando que ela “olha para a situação de sem-abrigo quase como um negócio”. O autarca de Lisboa foi mais longe do que o seu homólogo de Cascais, Carlos Carreiras, que em maio tinha criticado a extrema-esquerda por fazer do apoio às pessoas sem-abrigo uma “bandeira política”.

Mas no caso dos imigrantes da igreja dos Anjos, recordou a vereação bloquista, foi o próprio Moedas que em abril tinha dito que estava a “liderar” uma solução com o Governo para os transferir para o antigo Hospital Militar de Belém, mais uma promessa que parece ter ficado pelo caminho. Uma semana depois do habitual passa-culpas na entrevista de setembro, na véspera de discursar no 5 de Outubro, Moedas fez finalmente o que já podia ter feito há mais de um ano: retirou aqueles imigrantes da rua para instalações de alojamento temporário. Fê-lo no seu próprio timing político, a tempo de poder anunciá-lo com pompa no feriado republicano. Isso foi apelidado de “demagógico” até por apoiantes como Pedro Santana Lopes, explicando ao homólogo lisboeta que “não se devem usar questões de solidariedade humana para fins de propaganda política”.
 

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