Na sua recente deriva securitária, Carlos Moedas tentou marcar pontos políticos, anunciando que deu ordens à Polícia Municipal para passar a deter pessoas. Apesar de recrutar os seus efetivos na PSP, esta polícia não é um órgão de polícia criminal e foram criadas com vocação administrativa, justamente para retirar trabalho administrativo às polícias com competência criminal. No entanto, a lei já permite que as polícias municipais possam efetuar detenções em casos de flagrante delito, serem chamadas a ajudar a PSP, ou participarem em funções de segurança pública em grandes eventos ou situações de elevado risco, como terrorismo.
O anúncio de Moedas foi recebido com críticas de vários quadrantes, incluindo as do homólogo do Porto, com Rui Moreira a considerá-lo “um disparate e um perigo” e prevendo que por este caminho “qualquer dia estamos no tempo dos xerifes, ou vamos ter um exército privado também”.
A ordem de Moedas foi também contestada pela Associação Sindical dos Profissionais da Polícia (ASPP/PSP), que considera que as declarações do presidente da Câmara de Lisboa "incorreram numa precipitação e não se coadunam, nem com as competências de um autarca (ordens), nem com o quadro legal que sustenta o exercício das polícias municipais (detenções)".
Curiosamente, a única responsável política que levou a sério o anúncio de Moedas foi justamente a que deveria lembrar ao autarca que a lei é clara quanto às competências das várias polícias. Mas a ministra da Administração Interna preferiu dizer que vai estudar o assunto do ponto de vista técnico e jurídico. O Bloco de Esquerda decidiu chamar Margarida Blasco ao Parlamento por considerar que “o assunto está mais do que estudado” e que “a lei é clara, as polícias municipais têm vocação administrativa, a competência para a detenção é dos órgãos de polícia criminal, por exemplo, a Polícia de Segurança Pública e a GNR”.
Nas últimas semanas, os agentes da Polícia Municipal passaram a ostentar o crachá da PSP na farda, o que acontece pela primeira vez desde que a farda mudou em 2017, e soube-se que a Câmara Municipal apagou do Youtube a passagem do discurso do comandante da Polícia Municipal em que José Figueira, dias antes das declarações de Moedas, defendeu numa cerimónia oficial que os seus agentes deviam passar a poder deter pessoas, palavras que o autarca viria a repetir dias depois numa entrevista.
Rede de exploração de mulheres: Moedas recusou chamada do comandante a dar explicações
Pouco depois desta polémica, a Polícia Municipal de Lisboa foi notícia pelo facto de dois dos seus agentes estarem envolvidos numa rede de tráfico de pessoas e exploração de mulheres para a prostituição no centro de Lisboa.
A investigação da PSP, refere o comunicado desta polícia, teve início "há cerca de um ano e meio" e permitiu identificar uma estrutura que "explorava mulheres para a prostituição, submetendo-as a condições degradantes e desumanas, obrigando-as a trabalhar de forma quase permanente, limitando a sua liberdade e autodeterminação". A operação levou a buscas na sede da Polícia Municipal, onde os agentes trabalhavam e o gabinete da vereação do Bloco de Esquerda requereu a vinda do comandante da Polícia Municipal para dar esclarecimentos sobre o caso.
Mas Moedas recusou o pedido para que os vereadores ouvissem o comandante, considerando que este “tem que fazer aquilo que fez, e bem, que é um comandante que está sempre presente, perto dos seus homens e das suas mulheres, que colaborou imediatamente com a Justiça”. E acrescentou que este crime “poderia ter acontecido na Polícia de Segurança Pública ou noutra instituição”, pelo que se trata de uma “luta contínua”, concluindo que não é "um caso concreto que deixa uma mancha sobre uma instituição tão importante para a cidade".