Testemunhos de homenagem a Margarida Tengarrinha

29 de outubro 2023 - 9:47
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O Esquerda.net publica neste artigo alguns testemunhos que nos foram encaminhados por ocasião da morte de Margarida Tengarrinha, resistente antifascista, membro destacado do Partido Comunista e artista plástica.

Margarida Tengarrinha. Foto publicada na página de facebook de Helena Pato.

Um pequeno testemunho de homenagem a Margarida Tengarrinha

Por Vítor Ruivo.

Pelo fim dos anos noventa, fazia eu parte da Direcção do Sindicato da Função Pública do Sul e da Direcção da sua Delegação do Algarve, realizou-se uma greve nacional do sector da Saúde.

Nós, no Algarve, organizámos um piquete de greve que nesse dia se deslocou ao Hospital de Portimão, onde conversámos com as trabalhadoras e os trabalhadores grevistas e com outros colegas a trabalhar, em diálogo sobre as razões de ser da greve.

A certa altura, estando nós na sala dos delegados sindicais do Hospital, entrou uma senhora já idosa (para nós, pela diferença de idade, talvez sendo eu o de idade menos afastada) que nos cumprimentou distribuindo folhetos do PCP de apoio à greve em curso. Reconheci-a logo como sendo a Margarida Tengarrinha e, melhor do que eu, algumas das colegas da direcção, militantes do partido.

A Margarida, ao cumprimentar-nos, saudou efusivamente as suas camaradas do PCP e, com elas, também a mim. As colegas, sorrindo, esclareceram que eu não era do partido, mas sim da UDP. Mas ela respondeu que isso não tinha importância e pediu-me se me podia abraçar, dizendo que os sindicatos são de todos os trabalhadores.

Foi com grande orgulho que a abracei e, entre todos conversámos, e eu me emocionei por então conhecer pessoalmente aquela militante tão prestigiada do PCP e da luta antifascista em Portugal.

Hoje aqui recordo, de novo emocionado, esse momento que para mim permaneceu inesquecível.


Partiu Margarida Tengarrinha, ficam o exemplo e as memórias

Por Augusto Taveira.

Faleceu hoje, dia 26, Margarida Tengarrinha, resistente antifascista que, em 1961, era companheira do pintor José Dias Coelho. Ambos pertenciam ao PCP.

Dias Coelho foi assassinado pela PIDE, em 19 de dezembro desse ano, em pleno dia, à porta da casa onde morava, na Rua da Creche (atualmente, Rua José Dias Coelho), em Alcântara, Lisboa. Só muitos anos mais tarde, soube do crime que acontecera a apenas umas centenas de metros da casa onde eu vivia.

Quem viu e, naturalmente, se indignou, teve, naturalmente também, a “obrigação” de se calar.

Apesar de já ter, na altura, dez anos – e pese embora o meu interesse supremo fosse uma animada jogatana com uma bola de trapo, com os outros miúdos da rua –, não ouvi ninguém falar em nada.

O meu pai costumava, como diz o poeta, perguntar “ao vento que passa, notícias do meu país” – procurava-as nalguma entrelinha furtiva do Diário Popular, nalgum panfleto achado no caminho para casa ou, às escondidas – as paredes tinham ouvidos... –, na onda curta das rádios ditas subversivas. Margarida Tengarrinha chegou a ser redatora numa dessas rádios, a Rádio Portugal Livre, fundada em 1962.

Porém, como aconteceu também ao poeta, o vento calou a desgraça, o vento nada lhe disse...

O crime ficou imortalizado pela homenagem de Zeca Afonso, no magistral “A morte saiu à rua”... a morte que o fascismo – liderado por Salazar – enviou para abraçar José Dias Coelho, o companheiro de Margarida Tengarrinha.

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