Foi com sala cheia que começou a sessão sobre os riscos dos tecno-oligarcas, que detêm as redes sociais e as plataformas digitais. Miguel Cardina abriu a sessão falando sobre a campanha no distrito de Coimbra, e dizendo que “a campanha serve para defender as nossas propostas”.
Fazendo um apanhado da campanha no distrito, lembrou um encontro no Meco, onde os moradores se juntaram para bloquear a extração de caulino. Lembrou também a ação feita em conjunto com o Bloco de Esquerda no distrito da Guarda, indo até à fronteira entre os distritos para ir ao memorial que lembra Aristides de Sousa Mendes. Acabou por lembrar uma conversa com ativistas sobre a Palestina e sobre o massacre que acontece no Médio Oriente.
“O que é que isto tem a ver com a sessão de hoje? Numa altura de capitalismo tardio assistimos ao predomínio da miséria moral. É o tempo de Donald Trump atacar as mulheres, as universidades, a igualdade”, disse. “Isto tem muito a ver com o que se passa em Portugal, também precisamos de combater a miséria moral, precisamos de combater os tecno-oligarcas e taxar os ricos”.
O cabeça-de-lista ao círculo eleitoral de Coimbra terminou a sua intervenção para lembrar que o “nosso combate é para derrotar a pérfida aliança entre a motosserra e a nova extrema-direita”, referindo-se ao ultraliberalismo de Javier Milei e à nova extrema-direita de Trump.
Mariana Mortágua começou a sua intervenção por justificar a necessidade de falar sobre tecno-oligarcas, e a sua ligação ao nosso dia-a-dia. “O Bloco tem propostas para taxar os ricos em Portugal porque só conseguimos compreender a vida difícil das pessoas se olharmos para as desigualdades”, explicou. “Somos explorados pelas 17 famílias mais ricas do país, mas também diretamente pelos tecno-oligarcas americanos”.
Falando das infraestruturas digitais, a coordenadora do Bloco de Esquerda explicou que a articulação entre as infraestruturas físicas e as infraestruturas digitais é “essencial à nossa vida”. Só que as infraestruturas digitais não são alvo de regulação, apesar de terem "um peso imenso nas nossas vidas”.
“Já houve tempos em que o capitalismo era dominado pelo sistema financeiro e os bancos eram as estruturas dominantes. Hoje em dia, as empresas mais valiosas são as tecnológicas”, que são muito concentradas. No navegadores de Internet, por exemplo, as principais opções são privadas, nos motores de busca a mesma coisa, como nos sistemas operativos, nas redes sociais, nos anúncios e na intermediação. Alphabet, Meta, Apple, Amazon e Microsoft concentram em si vários serviços nestas áreas.
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Mariana Mortágua explicou que “são estas empresas que definem como acedemos e quando a estas infraestruturas digitais”. Estas empresas estão verticalmente integradas, ou seja, dominam a tecnologia desde as aplicações de interface com o consumidor até ao servidores digitais onde a informação está. Para além disso, mostram outro traço de monopolização, a compra de empresas mais pequenas para evitar a concorrência e “abusam da sua posição dominante”.
No mercado de anúncios digitais, por exemplo, é a Google que domina, e por isso “define as regras”. Para além disso, as empresas trabalham num sistema fechado em que as aplicações só dialogam com serviços daquelas empresas. “Vocês podem mandar mensagem de um Android para um iPhone, ou da MEO para a NOS, mas não do Whatsapp para o Signal, porque não há interoperabilidade”.
Dominação digital
Para dissecar a dominação destas empresas, a coordenadora do Bloco de Esquerda deu o exemplo da Amazon, mostrando que a empresa vai buscar 7% dos seus luros a taxas, a um modelo rentista de acesso a serviços que controlam. Também 31% do mercado da bases de dados está nas mãos da Amazon. Todo o processo de retalho na plataforma da empresa está dependente da própria empresa, que chantageia os fornecedores e rouba produtos.
Já a Alphabet, dona da Google, detém o motor de pesquisa, o sistema operativo de smartphones Android, o Youtube, o navegador Chrome. “Estamos a falar de empresas que são quase monopólios”, disse a dirigente bloquista. “Como é que a Google faz dinheiro? A maioria das suas receitas vem da publicidade. A Google oferece um motor de busca gratuito para roubar os vossos dados e para vender aos publicitários”.
Desde o login em diferentes websites às pesquisas ou aos dispositivos Android com contas digitais, é assim que a Google vai ficando com os milhares de milhões de indicadores de dados de cada pessoa, para depois vender anúncios num mercado em leilão, que também é dominado pela Google.
A Meta é dona do Facebook, do Instagram e do Facebook, mas também de várias outras empresas que compra “à nascença”. “Porque é que a Meta vos disponibiliza redes sociais de graça? A razão é a mesma da Google. O Facebook fica com os vossos dados, vende os vossos dados e ganha dinheiro com isso”, explicou Mariana Mortágua.
Como é que estes tecno-oligarcas que detêm estas empresas estão ligados à política? A coordenadora do Bloco de Esquerda começou por falar da tomada de posse de Donald Trump enquanto presidente dos Estados Unidos da América, onde estiveram presentes quase todos os donos das redes sociais e das plataformas digitais.
“Logo a seguir à eleição de Donald Trump estes tecno-oligarcas deram um milhão, cada um, ao fundo inaugural de Donald Trump”, disse a dirigente bloquista. E a partir daí seguiu-se uma ofensiva. Zuckerberg começou por defender Trump na televisão. Elon Musk foi nomeado ministro, Bezos censurou conteúdos no Washington Post para proteger Trump. A Google cedeu à agenda de extrema-direita de Trump, renomeando o Golfo do México para Golfo da América e eliminando eventos LGBTQI+ do seu calendário.
Propostas para o combate
Ao controlar infraestruturas, estes tecno-oligarcas têm peso sobre a soberania dos Estados por todo o mundo. “A soberania digital importa”, disse Mariana Mortágua. E por isso o Bloco quer mais transparência algorítmica e soberania digital “e o Estado tem um papel nisso”.
“A chave móvel digital é um brilhante exemplo daquilo que é um ótimo serviço público digital” e isso pode ser replicado em e-mails, motores de pesquisa ou outras ferramentas digitais. Para além disso, é preciso regular as redes sociais com desativação do scroll infinito e do autoplay, e também a desativação da recolha de dados fundamentais e ainda a garantia de interoperabilidade entre as redes sociais. “As redes sociais não vão acabar, mas precisam de ser espaços regulados”, garantiu a coordenadora bloquista.
Para quebrar os monopólios, o Bloco de Esquerda fala na necessidade da separação de atividades digitais e garantir a concorrência e alternativas viáveis. “Mas há uma coisa que podemos fazer já: podemos taxar os oligarcas. Portugal pode taxar Musk e os restantes”, disse Mariana Mortágua, que lembrou que o dinheiro destas empresas é feito em Portugal, porque recolhem os dados dos portugueses.
“Os Estados Unidos não estão assim tão longe, os grandes tecno-oligarcas não estão assim tão longe. E isso quer dizer que também podemos lutar contra eles. Achar que são problemas de outro país é errado”, concluiu Mariana Mortágua. “Há coisas que podemos fazer em Portugal. A taxa Musk é apenas o começo”.