Andreia Galvão:
Parte da comunidade que luta por justiça climática juntou-se na cidade de Glasgow nas primeiras semanas de Novembro para pensar o que significa justiça climática. A sensação de poder ter presenciado um momento tão determinante com a resposta à inação da COP26 foi, de certa forma, inexplicável.
Após vários serões de conversas, a apresentação de relatórios científicos e as conversas informais que tive oportunidade de travar com diversos ativistas tornou mais palpável a realidade que já todos conhecíamos: a crise climática assume contornos cada vez mais incontornáveis e as metas que são propostas além de insuficientes não apresentam os mecanismos adequados para a sua medição.
A COP26 só não se apresenta como uma desilusão para o movimento social porque a sua insuficiência de resultados já era expectável. Tendo em conta o cenário que enfrentamos temporalmente para resolver a crise, consigo facilmente afirmar que o malabarismo político feito na cimeira oficial me deixou zangada, pelos incessantes crimes contra a Humanidade que são propostos.
O discurso que me ficou mais impresso na memória foi o de um ativista indiano que disse que uma vez tinha falado com um dirigente político sobre o imperialismo inerente ao caos climático, ao qual lhe foi respondido “tens toda a razão, mas ninguém quer saber”. O nosso trabalho é fazer com que o mundo, a sociedade queira saber da causa mais importante das nossas vidas, garantindo o nosso compromisso não só com a possibilidade de intervir na conversa social sobre política mas para garantir que vencemos esta luta antes que seja tarde demais. A convicção com que foi enunciado o propósito que levou a que tantas pessoas continuassem a tentar participar nas decisões e conversas políticas com um consenso claro de que o sistema que nos está a empurrar para o caos climático tem nome e que o capitalismo é, além de irresponsável, insustentável - para as pessoas e para o planeta.
Miguel Martins:
Os últimos dias foram de aprendizagem, de definição de estratégia e, acima de tudo, de luta. Não apenas a luta por justiça climática, mas por todas as lutas, nos mais diversos pontos do mundo. Participei em várias sessões em que aprofundamos temas, discutimos ideias e trocamos experiências. Saí à rua junto de vários movimentos sociais e sindicatos para exigir melhores condições de vida, assim como justiça social e climática. Conheci novas pessoas, desde jovens ativistas ou trabalhadores, mas também membros das comunidades indígenas O que têm em comum? Todos travam lutas, nos mais variados contextos. E apesar de todas as adversidades, não desistem de lutar.
Em paralelo, decorria a COP-26, onde os líderes mundiais e os seus representantes negociavam à porta fechada com o setor privado sobre quais os compromissos que os países assumirão no combate contra as alterações climáticas. Sem qualquer surpresa, a COP-26, como tem sido prática, excluiu o movimento social por justiça climática. O Acordo assinado em Glasgow está a ser divulgado pelos principais poluidores como uma vitória, ainda que pequena, para a luta climática. Na verdade, o que foi assinado é uma mão cheia de nada: os principais aspetos do Acordo de Paris foram incumpridos e as populações do Sul Global, os principais afetados pelos impactos das alterações climáticas, continuam sem receber apoios suficientes. A principal conclusão desta COP é que os países mais ricos e poluidores podem continuar as más práticas, enquanto as populações mais vulneráveis continuam desprotegidas e em risco. Em suma, a COP-26 foi mais do mesmo: a manutenção do sistema e dos interesses financeiros, enquanto as pessoas e as comunidades que mais são (e continuarão a ser) afetadas pelas alterações climáticas são excluídas da discussão.
Apesar de todo este cenário, não desistimos: resistimos e lutamos. A mobilização na Marcha Mundial por Justiça Climática (em centenas de locais por todo o mundo), na Cimeira dos Povos e nas várias ações de protesto que decorreram por toda a Glasgow, mostram a força do movimento social por justiça climática - um movimento sem fronteiras, que interliga as mais variadas lutas, travadas por pessoas de todas as idades e origens.
Esta semana foi uma semana de luta e organização, pela construção de uma alternativa ao sistema, em que as pessoas e o planeta sejam o centro das prioridades, não os lucros. Não aceitamos "blá, blá, blá": queremos justiça climática e social, e vamos continuar esta luta!