Cronologia

Rangel prometeu que o navio ia tirar a bandeira portuguesa. O que aconteceu depois?

15 de outubro 2024 - 14:08

Segundo o ministro, foi a 27 de setembro que o dono do cargueiro informou o Governo que ia retirar a bandeira. Mas ela continuou hasteada no navio que transporta explosivos para o genocídio, enquanto este se agrava todos os dias.

PARTILHAR
Paulo Rangel

"Eu não durmo sossegado quando há uma deputada que representa o povo português que me acusa de ser o barqueiro do genocídio”, afirmou Paulo Rangel no dia 3 de outubro, dias depois de ter comunicado à imprensa que o proprietário do cargueiro Kathrin, impedido de atracar em portos de vários países por transportar explosivos com destino aos militares israelitas, tinha comunicado ao Governo que iria retirar o pavilhão português.

O processo estaria resolvido em poucos dias, prometeu o ministro. Mas os dias passaram e hoje o navio continua a hastear a bandeira portuguesa ao largo de Malta, enquanto decorrem campanhas nos vários países que são destinos possíveis do cargueiro para o impedir de ali descarregar o material explosivo.

Desde o dia em que o Governo disse que o dono do navio ia retirar a bandeira portuguesa e assim retirar o país da lista de cúmplices com o genocídio e crimes de guerra cometidos por Israel, uma possibilidade forte devido às decisões do Tribunal Internacional de Justiça, a situação no Médio Oriente agravou-se ainda mais com a escalada dos ataques ao Líbano, como mostra este resumo feito a partir da cobertura da Al Jazeera na região.

28 de setembro

Logo no dia seguinte à comunicação do dono do Kathrin que o governo diz ter recebido, Israel bombardeou o sul do Líbano e um bairro em Beirute onde matou centenas de pessoas, entre elas o seu principal alvo: Hassan Nasrsallah, o líder do Hezbollah e o maior aliado do regime de Teerão no Líbano.

29 de setembro

Sucedem-se as reações à morte do líder do Hezbollah e as análises sobre o impacto que esse ataque terá na estabilidade da região. Bombardeamentos israelitas no Líbano prosseguem e fazem 105 mortos e 359 feridos. A França anuncia a morte de dois cidadãos seus e o ministro da saúde libanês diz que catorze médicos foram mortos dese o início dos ataques. Estes estendem-se também ao Iémen, atingindo a infraestrutura de energia e aeroportuária. Em Gaza, o balanço ao final deste domingo apontava para 28 palestinianos mortos

30 de setembro

Prosseguem os bombardeamentos no Líbano, matando pelo menos 95 pessoas e ferindo 172, com Israel a anunciar o início de uma operação terrestre no sul deste país. Os houthis iemenitas prometem vingança pelos ataques sofridos na véspera e que mataram cinco pessoas. Em Gaza os ataques também não páram com 32 pessoas mortas pelas tropas israelitas, 11 das quais num prédio atingido no campo de refugiados de Nuseirat.

1 de outubro

O Irão respondeu à morte do seu principal aliado libanês com o lançamento de 200 mísseis que provocaram danos em bases militares de Israel, tendo a maioria sido destruída antes de chegar ao solo. Israel voltou a bombardear campos de refugiados palestinianos no Líbano e a Síria, matando dezenas de civis, entre os quais um apresentador de televisão em Damasco. No mesmo dia, um bombardeamento israelita em Gaza fez 31 mortos.

2 de outubro

Foi notícia o ataque a um orfanato na cidade de Gaza, que matou várias mulheres e crianças ali refugiadas. Outros 51 civis morreram durante os ataques aéreos e terrestres na Faixa de Gaza neste dia em que o governo de Israel decidiu declarar António Guterres persona non grata.

3 de outubro

Intensificaram-se os ataques à capital libanesa, enquanto no sul as tropas israelitas encontraram mais resistência do que pensavam. Na Cisjordânia, o ataque de Israel ao campo de refugiados de Tulkarem fez 18 mortos. Em Portugal, Paulo Rangel diz que não é "barqueiro das bombas do genocídio" dos palestinianos, recusando "lições de direitos humanos" do Bloco de Esquerda. Ao mesmo tempo, invocou motivos de agenda para não receber a Enviada Especial da ONU aos Territórios Paestinianos Ocupados, Francesca Albanese, de visita a Portugal.

4 de outubro

É o dia com bombardeamentos mais fortes sobre Beirute até então e o governo libanês anunciou que os ataques de Israel já tinham provocado dois mil mortos no seu país, incluindo 127 crianças e 261 mulheres. Incursão de militares israelitas na zona leste de Khan Tounis mata 15 pessoas. Um drone lançado pela Resistência Islâmica no Iraque atinge base israelita nos Montes Golã e mata dois soldados

5 de outubro

Pelo menos mais 25 pessoas morreram em novos ataques aéreos no Líbano e a força de paz da ONU, a UNIFIL, fez saber que as tropas israelitas tinham exigido que saíssem de algumas das posições. Em Gaza, os palestinianos junto ao Corredor de Netzarim são avisados que terão de voltar a sair do local, enquanto no campo de refugiados de Nuseirat os ataques israelitas fazem mais 12 mortos.

6 de outubro

Netanyahu considera uma “vergonha” o apelo do presidente francês para a suspensão da venda de armas a Israel. Este domingo foi de grandes manifestações em todo o mundo a exigir o fim do genocídio e sanções a Israel. Numa mesquita em Gaza, 26 pessoas foram mortas em mais um ataque, com Telavive a emitir ordens de evacuação, desta vez para a população do norte de Gaza. No campo de refugiados de Jabalia, a incursão israelita mata 19 pessoas, incluindo o jornalista palestiniano Hassan Mahad, elevando a 175 o número de jornalistas feridos.

7 de outubro

No dia que assinala o primeiro ano desde os ataques do Hamas no sul de Israel, Hezbollah e Hamas voltam a disparar rockets para o outro lado da fronteira, os israelitas voltam a bombardear o norte e centro de Gaza e ouvem-se apelos em vigílias e protestos por um cessar-fogo. Mas o genocídio prossegue num ano em que Israel matou um em cada 55 cidadãos de Gaza, incluindo 903 famílias inteiras.

8 de outubro

A carnificina prossegue e António Guterres afirma que “o pesadelo de Gaza está a entrar num atroz e abominável segundo ano” e insurgia-se contra as leis em debate no Parlamento de Israel para impedir a continuação do trabalho da agência da ONU para os refugiados palestinianos, considerando a eventual aprovação como uma “violação das obrigações de Israel face ao direito internacional”. Criticou também as novas ordens de evacuação dando o exemplo das famílias do campo de refugiados de Jabalia, no norte de Gaza, que receberam ordens de evacuação em outubro, dezembro, maio e em outubro deste ano. “A conclusão é clara: há algo de fundamentalmente errado na forma como esta guerra está a ser conduzida”, alertou Guterres, pois “nenhum lugar é seguro em Gaza e ninguém está e segurança”.

9 de outubro

Biden volta a prometer apoio militar a Netanyahu numa chamada telefónica em que Kamala Harris também participa. A Bolívia decidiu juntar-se ao processo de genocídio iniciado pela África do Sul no TIJ. Milhares de libaneses procuram refúgio após ficarem com a casa destruída pelos bombardeamentos diários em redor de Beirute. Após um encontro com a embaixadora da Palestina em Lisboa, Mariana Mortágua diz que o ministro Rangel coloca o país ao nível de uma “república das bananas” ao não ter ainda retirado a bandeira ao cargueiro Kathrin.

10 de outubro

Israel mata mais 22 libaneses no centro de Beirute e  deixa 117 feridos. As tropas de paz da ONU queixam-seque os soldados israelitas abriram fogo contra elas deixando dois soldados feridos. Em Gaza o exército israelita reconhece a morte de três soldados no norte e os ataques aéreos matam 63 palestinianos. Mais um operador de câmara da Al Jazeera, Fadi al-Wahidi, é baleado no pescoço enquanto filmava em Jabalia. Um inquérito da Comissão de Direitos Humanos da ONU acusa Israel de cometer crimes de guerra e crimes contra a humanidade de extermínio ao visar diretamente hospitais e pessoal médico em Gaza e no tratamento de prisioneiros e reféns.

11 de outubro

Enquanto o mundo discute os ataques às forças da ONU no Líbano, prossegue o cerco ao campo de refugiados de Jabalia, no norte de Gaza. Médicos Sem Fronteiras dizem que ninguém pode entrar ou sair do território alvo de bombardeamentos. Das 43 vítimas mortais dos ataques israelitas nesta sexta-feira, quase metade foram em Jabalia. Os EUA anunciam sanções ao setor petrolífero do Irão em resposta aos mísseis lançados sobre Israel no início do mês.

12 de outubro

O massacre no norte de Gaza continua, com o Ministério da Saúde a dar conta de mais duzentos mortos desde o início do cerco há oito dias. Uma bomba lançada pela aviação israelita destruiu um edifício de quatro andares habitado, matando pelo menos 22 pessoas no campo de Jabalia. A ONU diz que não entra ajuda alimentar no norte de Gaza desde o dia 1, com o encerramento das principais passagens. No Líbano prosseguem os bombardeamentos e as forças da ONU recusam-se a abandonar as suas posições, apesar de já contarem com cinco feridos pelas tropas israelitas e de verem as suas instalações alvo de bombardeamentos. O ministro dos Negócios Estrangeiros de Israel promete manter Guterres persona non grata apesar da oposição manifestada por cem países membros da ONU. A UE diz-se “muito preocupada” com a eventual proibição da atividade da agência da ONU para os refugiados palestinianos por parte de Israel.

13 de outubro

O exército israelita diz que quatro soldados morreram e sete ficaram gravemente feridos num ataque com um drone do Hezbollah a uma posição militar no norte de Israel, que deixou 60 feridos. No centro de Gaza, um tanque israelita disparou sobre uma escola que albergava refugiados no campo de Nuseirat, matando 18 pessoas. No Líbano, as forças da ONU relatam que dois tanques israelitas destruíram a entrada principal e invadiram uma das suas bases. Os israelitas respondem que os tanques entraram na base após ter ficado debaixo de fogo do Hezbollah. Guterres diz que os ataques à UNIFIL “podem constituir crimes de guerra” e reitera que os capacetes azuis não vão sair do sul do Líbano. O líder do grupo de sobreviventes dos ataques nucleares de Hiroshima e Nagasaki agora agraciado com o Nobel da Paz diz que o prémio devia ter ido para os que lutam contra a guerra em Gaza e comparou o sofrimento das crianças de Gaza com o que aconteceu no seu país sob as bombas dos EUA na II Guerra Mundial.

14 de outubro

Os ataques aéreos israelitas no norte do Líbano mataram pelo menos 18 pessoas, a maioria civis segundo a Cruz Vermelha libanesa. Embaixada dos EUA apela aos seus cidadãos para saírem de imediato do país e a Alemanha considera “inaceitável” o ataque aos capacetes azuis. Em Gaza, prossegue o cerco no norte e há 400 mil pessoas sitiadas e sem acesso a comida, água e outros bens essenciais. Apesar das ordens de evacuação, há relatos de snipers israelitas a disparar contra pessoas que tentam fugir, além de ataques às “zonas humanitárias seguras”, assim designadas pelas tropas de Israel. Este foi também o dia em que correram mundo as imagens de pessoas a arder após a aviação israelita ter alvejado tendas com deslocados no pátio do hospital dos Mártires de Al-Aqsa no centro de Gaza.

15 de outubro

O Gabinete do Alto Comissário para os Direitos Humanos da ONU diz que as ordens israelitas de evacuação já abrange 20% do território libanês, com mais de 1,2 milhões de pessoas a abandonarem as suas casas. UNICEF fala de uma “geração perdida”, com mais de 400 mil crianças deslocadas nas últimas semanas. No norte do Líbano 21 pessoas morreram num bombardeamento à cidade de Aitou, de maioria cristã. Em Gaza, a aviação de Israel prossegue a destruição dos edifícios do campo de refugiados de Jabalia, mas também no sul, em Khan Younis, com os bombardeamentos a matarem mais de uma dezena de pessoas em suas casa, numa altura em que a maior parte dos centros de evacuação foram destruídos ou estão gravemente debilitados. O vice-líder do Hezbollah diz que a única saída para a guerra é um cessar-fogo em Gaza. Giorgia Meloni critica os ataques israelitas às forças de manutenção de paz e pede garantias de segurança para os mil militares italianos destacados no Líbano.

Entretanto, ao largo de Malta, o cargueiro Kathrin continuou a hastear a bandeira portuguesa, indiferente às promessas do ministro Rangel e à qualidade do sono do governante português nos últimos quinze dias.

Atualização: Esta terça-feira, ao final do dia, o Governo anunciou que o registo do Kathrin na Madeira foi finalmente cancelado.