O governo do Bangladesh está a usar a força para reprimir violentamente os protestos que surgiram depois da reinstituíção do sistema de cotas para empregos públicos, que atribui 30% dos lugares a filhos e netos de quem lutou pela independência do país.
Nos últimos dias, estudantes das universidade públicas e privadas têm-se manifestado, após de, no dia 5 de junho, o Tribunal Superior ter reinstituído as cotas em empregos públicos para quem é descendente dos “lutadores pela liberdade”. No Bangladesh, há mais de 1,9 milhões de empregos na função pública.
O movimento, conhecido como “Estudantes contra a discriminação”, juntou milhares de estudantes das Universidades de Dhaka e de Chittagong em assentadas contra o sistema de cotas. Os manifestantes, que se declaram apartidários, dizem apenas querer um sistema mais igual à partida. Fahim Faruki, um estudante de relações internacionais, explicou à Al Jazeera que os protestos se organizaram no Facebook e que são inorgânicos.
A principal reivindicação dos manifestantes é que a cota de 30% para descendentes de “lutadores da liberdade” seja abolida, mas os manifestantes apoiam a manutenção de cotas para minorias étnicas e pessoas com deficiência. “O nosso protesto não é contra o sistema de cotas, quer antes a reforma do sistema”, disse Faruki à Al Jazeera.
Na quarta-feira, os estudantes da Universidade de Dhaka bloquearam grandes infraestruturas rodoviárias e a esquadra da polícia em Shahbagh, uma das praças mais conhecidas de Dhaka. Os confrontos começaram no bairro de Uttara, quando centenas de manifestantes foram perseguidos pela polícia por bloquearem a estrada. Há também relatos do uso de gás lacrimogéneo e bastões contra os estudantes, que ripostaram atirando pedras.
Entre a confusão dos confrontos, o edifício da televisão estatal BTV sofreu um incêndio na quinta-feira, enquanto várias pessoas ainda lá estavam dentro. O escalamento do conflito entre polícia e estudantes levou também a um aumento de vítimas mortais, entre os quais um aluno do 11º ano e um jornalista.
Entretanto, o Governo cortou acesso à internet e às telecomunicações e proibiu também as manifestações públicas, aumentando a repressão numa tentativa de desorganizar e desmobilizar os manifestantes.
Repressão com uso de força ilegal
A Amnistia Internacional já reagiu com uma análise da situação, confirmando o “uso ilegal de força pela polícia contra os estudantes”, indicando ainda que estes padrões de violência contra manifestantes acontecem há vários anos e são alegadamente cometidos por membros da Liga Chatra Bangladesh, um grupo com ligações ao partido da primeira-ministra, Sheikh Hasina.
Os representantes do protesto recusaram negociações com o governo enquanto a violência continuar. Um dos líderes do movimento, Asif Mahmud, escreveu no Facebook que “de um lado há balas, do outro um apelo ao diálogo” e que “não nos podemos sentar para dialogar enquanto estamos sobre o sangue dos nossos irmãos”.
A primeira-ministra começou a hostilizar os manifestantes usando o termo “razakar” para os descrever, um termo que era usado para marcar os bangladeshianos que colaboraram com o Paquistão durante a guerra pela independência, em 1971.
A polícia bangladeshiana anunciou a detenção de um dos principais opositores do partido da primeira-ministra, Ruhul Kabir Rizvi Ahmed, do Partido Nacionalista do Bangladesh
Os manifestantes continuam desligados da internet enquanto os protestos se mantêm durante esta sexta-feira, mas as agências de notícias dão conta de pelo menos 75 mortos, números prestados por fontes hospitalares. Apesar das medidas de repressão, a contestação prossegue por todo o país. Os mais recentes relatos indicam que os manifestantes assaltaram uma prisão no centro do país.
O alto-comissário da ONU para os direitos humanos condenou esta sexta-feira a repressão e os ataques contra os manifestantes estudantis.