O secretário-geral da ONU esteve esta terça-feira na Colômbia para intervir na COP16, a cimeira dedicada à biodiversidade no planeta, que se vê mais ameaçada a cada ano que passa. E reforçou a mensagem de que “fazer as pazes com a natureza é a tarefa definitiva do século XXI”, pois a atual guerra à natureza em que “a cada dia perdemos mais espécies” e “a cada minuto despejamos um camião do lixo de resíduos plásticos nos nossos oceanos, rios e lagos”, prosseguiu Guterres, é “uma guerra onde não pode haver vencedores”.
Nesta crise “existencial”, prosseguiu, “nenhum país, rico ou pobre, é imune à devastação provocada pelas alterações climáticas, à perda de biodiversidade, à degradação da terra e à contaminação”. E os motores desta destruição estão nos “modelos económicos obsoletos que alimentam padrões insustentáveis de produção e consumo” e que são “multiplicados pelas desigualdades - em riqueza e poder”. E assim o planeta se aproxima cada vez mais de pontos de inflexão que significam “mais fome, deslocamentos e até conflitos armados”, avisou Guterres.
Para inverter a situação é preciso converter em ações as promessas feitas na cimeira de há dois anos em Montreal. Guterres afirmou que isso passa por cada país apresentar os seus planos detalhados de políticas alinhadas com os objetivos então traçados, pelo reforço da monitorização e transparência no cumprimento desses objetivos, pelo cumprimento das promessas de financiamento do fundo - que era de 200 mil milhões de dólares anuais até 2030 e para já apenas soma compromissos no valor que pouco ultrapassa os 400 milhões - e pelo envolvimento das comunidades locais, populações indígenas e afrodescendentes, que têm ficado à margem da política ambiental global. Afinal, sublinhou Guterres, “a paz com a natureza significa a paz com aqueles que a protegem”.

Pela positiva, o secretário-geral da ONU destacou os progressos feitos para travar a desflorestação no Brasil, Colômbia, Indonésia e Malásia, o aumento das áreas protegidas na Bacia do Congo ou a lei europeia de Restauro da Natureza, mas reconheceu a dificuldade em mobilizar todos os países para uma cooperação global acelerada que possibilite a defesa contra os incêndios florestais, as cheias, os fenómenos meteorológicos extremos e as pandemias.
Gustavo Petro: “Quisemos que o povo tomasse a COP”
Nesta abertura do segmento de alto nível da COP16 discursou também o presidente colombiano Gustavo Petro, para destacar a forte participação da sociedade civil nos trabalhos desta COP, superando as previsões dos organizadores ao juntar mais de 40 mil pessoas na “zona verde” ao longo da primeira semana de debates e iniciativas culturais. Mas também na “zona azul”, onde estão as delegações dos Estados-membro da COP, os 23 mil participantes credenciados ultrapassaram o número esperado, que era no máximo 14 mil pessoas. “Aqui em Cali estamos rodeados de alegria e calor humano. Quisemos que fosse aqui, quisemos que o povo tomasse a COP; porque os povos do mundo têm que tomar as decisões para uma revolução mundial, que na verdade é o que precisamos”, afirmou o chefe de Estado anfitrião.

O presidente da Colômbia destacou a diferença desta cimeira para os habituais locais escolhidos neste tip de iniciativas, em zonas isoladas, nessas “COP sem povos, onde a burocracia e os que fazem política se reúnem para tomar decisões em nome dos restantes”, o que considera ser a “antidemocracia” e o “medo de que a humanidade tome as rédeas do seu planeta, para salvar a vida do planeta”. Pelo contrário, “aqui [em Cali] estão os sábios indígenas que nos falam sem terem passado peas universidades do mundo; estão os povos camponeses que sabem que sem o seu alimento morreríamos; está o povo da festa, da salsa, da alegria e da cultura à nossa volta”, prosseguiu Petro, pedindo aos delegados internacionais que retribuam esta generosidade não apenas a este povo, mas à humanidade inteira, e aos organizadores das COP para que elas passem a ter lugar mais vezes em regiões com biodiversidade e com participação cidadã, como acontecerá também na cimeira do clima COP 30, que terá lugar na cidade brasileira de Belém do Pará no próximo ano.