Alimentação em risco devido à perda de biodiversidade

22 de fevereiro 2019 - 16:11

“O futuro da nossa comida e do ambiente está sob ameaça séria”. O aviso vem do maior estudo realizado até agora sobre como a perda de biodiversidade afetará a alimentação humana.

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Foto de Meryabad/Flickr

O relatório da FAO, Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura, analisa a relação entre o sistema alimentar humano e a biodiversidade. São 576 páginas daquele que se apresenta como o “primeiro grande estudo a fornecer uma imagem completa do estado da biodiversidade especificamente ligada à alimentação e à agricultura”, juntando 91 relatórios nacionais com 27 de organismos internacionais e contando com as contribuições de 175 autores.

A conclusão deste estudo aprofundado é que “a biodiversidade que sustenta os nossos sistemas alimentares, a todos os níveis, está em declínio no mundo inteiro e ameaça o futuro da nossa alimentação bem como o nosso ambiente”.

63% das plantas, 30% dos invertebrados e vertebrados (11% dos pássaros e 5% dos peixes) e 10% dos micro-organismos essenciais para a produção alimentar estão em declínio acentuado. 30% dos stocks de peixes são sobre-explorados e um terço das espécies de peixes de águas doces estão ameaçadas. E, em duas décadas, aproximadamente 20% da superfície da Terra que está coberta com vegetação tornou-se menos produtiva.

Os dados preocupantes multiplicam-se num relatório que mostra como muitas das espécies ameaçadas estão indiretamente envolvidas na produção alimentar. Como os pássaros que comem as pragas que atacam colheitas. Ou as espécies polinizadoras de três quartos das colheitas mundiais: as abelhas e outros insetos, mas também vertebrados como morcegos e pássaros. Em causa está também a perda de diversidade dos solos, onde pequenos organismos são auxiliares das culturas, numerosos dentre eles não estarão ainda sequer identificados ou a sua função estudada.

Como principais causas aponta-se a destruição e degradação de habitats, a sobre-exploração de recursos aquíferos, a alteração de uso dos solos (com o abate de árvores em florestas para aumentar explorações agrícolas e o avanço das cidades, fábricas e estradas) e a poluição. O modelo agrícola atual, que é considerado insustentável, sobre-explorador dos solos e dependente de agro-químicos agressivos, e o tipo de produção industrial dominante, ultra-poluidor, estão entre os co-responsáveis pelos problemas. Num futuro próximo, o aumento das espécies invasoras e o aquecimento global vão piorar ainda mais esta situação.

Estes problemas ainda não se notam à mesa. Tem até havido uma subida atual da produção de alimentos. Porém, esta está dependente de monoculturas que se tornam cada vez mais dominantes: dois terços das colheitas são de apenas nove espécies (cana de açúcar, milho, trigo, arroz, batata, soja, óleo de palma, beterraba doce e mandioca). As restantes seis mil espécies cultivadas estão em declínio o que torna todo o sistema alimentar mais vulnerável a riscos.

O mesmo fenómeno de redução da diversidade se passa na pecuária: 7745 espécies locais de gado persistem, 26% das quais em risco de extinção e o estado de risco de 67% é desconhecido. Apenas 7% não estão em risco.

O diretor da FAO, Graziano da Silva, escreve na introdução deste estudo que “o futuro da nossa comida e do ambiente está sob ameaça séria” e que “as fundações do nosso sistema alimentar estão a ser minadas”. E é o próprio que classifica a investigação como uma “leitura sombria”.

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