Negócios das cantinas escolares: os alunos ficam a perder

22 de novembro 2019 - 17:18

Segundo a SIC, as escolas privadas vendem refeições muito mais caras do que aquilo que pagam. E, tanto no ensino público como no privado, o baixo preço pago às concessionárias por cada refeição levanta suspeitas sobre a sua qualidade. O Bloco defendeu em várias ocasiões a gestão pública das cantinas escolares.

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Cantina escolar.
Cantina escolar. Foto de Cheshire East Council/Flickr.

As refeições escolares são um negócio. E, como é óbvio, as empresas privadas que são concessionárias deste serviço têm lucros com ele. Uma reportagem emitida esta quinta-feira pela SIC vem mostrar que também as escolas privadas ficam a ganhar, cobrando muito mais aos pais pelas refeições escolares do que aquilo que pagam às empresas que as produzem.

Segundo os números avançados pela estação televisiva, há escolas que vendem refeições escolares por quase dez euros, cobrando à empresa que as faz pouco mais de um. Sendo que, em média, um colégio privado paga entre 1,5 euros e 1,8 por cada refeição, que o fator trabalho custa 30%, cinco cêntimos, que se despende 20 cêntimos em consumíveis, como guardanapos ou produtos de limpeza, sobram 80 cêntimos a um euro divididos entre lucros e comida que tem de incluir sopa, prato principal e sobremesa.

As empresas que prestam este tipo de serviço aos colégios privados, confirmam estes valores, mas não prestaram declarações ao canal. Nem as escolas privadas que lucram com o esquema.

A SIC alega que o Estado também cobra mais aos alunos do que aquilo que custa cada refeição. Cada refeição custa 1,46 aos alunos. Só que, esclarece Manuela Arroios Faria, Diretora-Geral dos Estabelecimentos Escolares, há muitos alunos carenciados a pagar 0,73 e outros que não pagam, isto para além dos “custos associados” como água e eletricidade. O preço final “é perfeitamente justo e equilibrado”, assegura.

O que é facto é o que valor pago às empresas que fazem as refeições é baixo e que o setor não deixa por isso de ser lucrativo, o que a Diretora-Geral explica pela existência de uma “economia de escala muito grande” destas empresas que produzem dois milhões e meio por semana.

Visão diferente tem a Bastonária da Ordem dos Nutricionistas, Alexandra Bento. Se não se impressiona com os preços no caso das escolas privadas por achar que está “no âmbito dos pais decidirem o que querem ou não pagar pelas refeições”, sobre o ensino público questiona a possibilidade de fazer uma “refeição equilibrada por esse valor”.

E às declarações que pretendem tranquilizar as famílias acerca da qualidade nutricional das refeições servidas nas escolas contrapõe que apenas há dois nutricionistas no Ministério da Educação: um nos serviços centrais, o outro na região de Coimbra.

O baixo preço pago resulta em refeições pré-feitas, produtos congelados e legumes desidratados, denuncia-se. O concurso público internacional para a concessão das refeições escolares tinha, aliás, como critério único o preço mais baixo. Excluindo o Algarve, onde as refeições continuam a ser preparadas por funcionários das escolas, nas outras regiões os valores por refeição variam do mais baixo, o Norte, com 1,18 euros, atribuído à Uniself, até aos 1,47 do Centro, passando pelos 1,25 de Lisboa e Vale do Tejo e os 1,26 do Alentejo.

Bloco defende gestão pública das cantinas escolares

O deputado do Bloco, José Soeiro, em artigo de opinião, concluía destes números que “está-se mesmo a ver o que acontece: os ingredientes não podem ser bons, a quantidade não pode ser aceitável e os salários pagos a quem cozinha são os mais baixos possíveis. Os resultados são maus para toda a gente: para as crianças e jovens, para as escolas e para os trabalhadores. E criam um verdadeiro problema de saúde pública.”

Para além disso acrescentava: “a decisão política que impediu as escolas de contratar cozinheiras e que transformou as cantinas num negócio lucrativo, em que grandes empresas competem pelo menor preço, foi um desastre e está a sair-nos muito cara no essencial: a qualidade e o bem-estar. Que haja nas nossas escolas crianças que passam fome ou a quem se dá comida que nenhum de nós comeria é inaceitável e é um perigo. Já é tempo de falarmos seriamente dele e de fazermos alguma coisa sobre isto.”

O Bloco apresentou na legislatura passada um projeto de lei no sentido de recuperar a gestão pública das cantinas escolares, considerando que “a política de concessão dos refeitórios escolares à iniciativa privada tem-se revelado desastrosa”. Isto porque “a qualidade da alimentação fornecida aos estudantes baixou de forma dramática” e o “controlo sobre a quantidade e a qualidade dos alimentos se revelou muito difícil se não mesmo impossível de concretizar de forma continuada”.

Lisboa: a diferença nas refeições escolares

O vereador do Bloco na Câmara de Lisboa, Manuel Grilo, salienta a diferença que se nota na cidade relativamente ao quadro geral das refeições escolares no país. Em Lisboa, a mudança "garantiu o fim do catering em cuvetes de plástico, a confecção local e diária em todas as escolas" das refeições.

Para além disso, introduziu-se a possibilidade dos pais celebrarem o aniversário dos filhos almoçando nas cantinas,  o que, acrescenta, "promove ao mesmo tempo a fiscalização e a confiança nas refeições escolares".

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