André Freire morreu esta quarta-feira aos 63 anos. Segundo a notícia avançada pela RTP, onde ainda há poucos dias comentava a atualidade política, a morte deveu-se a uma infeção no pós-operatório de uma cirurgia a um ombro no Hospital da Luz, sendo ainda transferido para o Hospital de São Francisco Xavier, onde acabou por morrer.
Além de professor Catedrático do Departamento de Ciência Política do ISCTE - Instituto Universitário de Lisboa e investigador integrado no Centro de Investigação e Estudos de Sociologia (CIES-Iscte), André Freire dirigia o Departamento de Ciência Política do ISCTE desde 2015 e o Observatório da Democracia e Representação Política. Numa nota de pesar, o CIES-Iscte destaca o “legado de excelência e inspiração para todos os que tiveram o privilégio de trabalhar” ao lado de André Freire, que “foi mentor de várias gerações de estudantes e investigadores, partilhando generosamente o seu vasto conhecimento e fomentando o pensamento crítico e rigor académico”.
“As suas pesquisas, publicações e intervenções públicas permanecerão como referência nos estudos de Ciência Política, especialmente em temas como sistemas eleitorais, partidos políticos e comportamento eleitoral, áreas em que atuou com profundidade e originalidade”, acrescenta o CIES-Iscte.
André Freire era colunista em jornais como o Público e o Jornal de Letras e participava em programas de comentário político na RTP. Autor de mais de três dezenas de livros e mais de uma centena de artigos científicos, André Freire sempre acompanhou a carreira académica de um percurso de intervenção cívica em defesa da democracia.
Não por acaso, o seu nome consta de vários manifestos surgidos de impulsos cívicos sobre temas que lhe eram caros. Entre eles, em 2011 contra o Orçamento para o ano seguinte e a austeridade da troika e em defesa da democracia e dos serviços públicos, em 2012 em defesa do serviço público de televisão ou no abraço à Casa da Música, em 2014 contra a violência da praxe, em 2015 contra a chantagem de Bruxelas ao povo grego, em 2016 pelo direito a morrer com dignidade, pela libertação dos jovens ativistas angolanos presos ou contra a prospeção de petróleo na costa portuguesa, em 2017 a reclamar justiça para a Palestina, em 2019 em defesa da realização de eleições primárias em todos os partidos para a escolha de candidatos ou pela abertura de um Museu da Resistência e Liberdade no Porto, ou em julho deste ano a favor de uma reforma do sistema eleitoral para evitar os “votos desperdiçados” nos círculos que elegem poucos deputados. Também o protesto contra a repressão ao referendo à independência na Catalunha o mobilizou, participando em iniciativas de 2017, na altura do referendo, e depois a favor da amnistia dos dirigentes políticos e governantes catalães condenados e presos por organizarem a consulta.
A defesa da união das esquerdas no sistema político português foi também uma preocupação constante que o levou a apoiar e participar ativamente em iniciativas como o Congresso Democrático das Alternativas durante o governo de Passos Coelho. Foi assim com agrado que viu os partidos da esquerda entenderem-se em 2015 para viabilizar um Governo contrário às políticas austeritárias da direita. Dois anos depois viria a escrever um livro intitulado “Para lá da ’Geringonça’. O governo de esquerdas em Portugal e na Europa” com prefácio do então primeiro-ministro António Costa, sobre essa experiência. Nas eleições seguintes, em 2019, declarou publicamente o seu apelo ao voto no Bloco de Esquerda, e nas presidenciais de 2021 em Marisa Matias. Com o chumbo do Orçamento para 2022, André Freire voltou a apelar aos partidos da esquerda para que firmassem um compromisso político para uma maioria parlamentar, um desejo frustrado pela conquista da maioria absoluta do PS. Nas legislativas de março deste ano, voltou a apoiar a candidatura do Bloco.
O Bloco de Esquerda e o Esquerda.net endereçam sentidas condolências à família e amigos de André Freire.