Turquia

Milhares nas ruas de Istambul querem salvar cães vadios da morte

29 de julho 2024 - 18:29

Uma manifestação de grandes dimensões demonstrou oposição à lei que Erdogan pretende impor e que permitirá o massacre de cães errantes em várias circunstâncias. As autarquias da oposição dizem que não vão aplicar a lei desafiando a possibilidade de pena de prisão até dois anos por o fazerem.

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Manifestação em defesa dos cães vadios em Istambul.
Manifestação em defesa dos cães vadios em Istambul. Foto @domdyer70/X.

Milhares de pessoas protestaram este domingo em Istambul contra o projeto de lei avançado pelo regime de Erdogan e que poderá culminar no massacre de milhões de cães vadios. Este foi o maior dos protestos que têm decorrido quase diariamente desde que se soube da proposta que começou a ser discutida neste domingo e será votada no parlamento nos próximos dias.

De acordo com o Governo, trata-se de resolver “problema sanitário” e de “regular” os muitos animais abandonados que vivem nas cidades da Turquia. O próprio Erdogan justificou a lei dizendo que “o nosso povo quer ruas seguras”.

Calcula-se que haja quatro milhões de cães sem dono no país. Muitos são alimentados por comunidades de vizinhos. A nova legislação mandata as autarquias para recolher os animais e colocá-los em abrigos. Mas uma das cláusulas diz que os cães que tenham dores, estejam doentes em estado terminal, coloquem em risco seres humanos ou sejam agressivos seriam “eutanasiados”, isto é mortos.

Com orçamentos municipais à míngua e sem recursos, teme-se que isto seja uma luz verde para acabar com o problema através da solução mais barata, a morte. É precisamente o que pensam as organizações de defesa dos animais e muitos elementos da oposição a Erdogan. Atualmente, há apenas 322 abrigos que com capacidade para 105.000 cães, segundo a Reuters, e não se espera nenhum investimento massivo para solucionar a questão.

Os opositores dizem, aliás, que a lei em vigor há uns vinte anos já teria uma solução mais humana, obrigando as Câmaras Municipais a esterilizar e vacinar todos os animais errantes e depois a deixá-los nos bairros onde vivem. Só que nunca foi aplicada.

Pelo contrário, a nova lei vem já com uma ameaça: dois anos de prisão para os presidentes de Câmara que se recusem aplicá-lo. O desafio está assim lançado porque a oposição, nomeadamente o CHP, Partido Republicano do Povo, que foi o mais votado nas últimas eleições autárquicas, já disse que não vai colocá-la em prática. Deniz Yucel, porta-voz do partido declarou, segundo o Balkan Insight que “na mente deles, pensam que vão manchar as nossas mãoes com sangue… mas nenhuma das nossas autarquias vai implementá-la”.

A advogada Tugba Gürsoy, responsável pelos direitos dos animais em Ancara, afirma à RFI que a forma como a lei está feita abre caminho para um “massacre” que pode atingir centenas de milhares de cães. A letra da lei fala em “comportamento prejudicial” sem o definir e ela questiona-se “um cão que ladra muito será julgado assim? E quais doenças são contagiosas? Vamos matar cães com sarna, micose ou constipação? Vamos matar um cão que já mordeu uma vez? Esta lei está repleta de imprecisões que deixam uma enorme margem de manobra às autarquias”, denuncia.

À mesma cadeia informativa francesa noutra reportagem anterior, Sebnem Ebinç, responsável da Federação para a Proteção dos Animais defende que “se ideia fosse organizar uma captura em massa de cães, podíamos também aplicar a lei atual e esterilizá-los todos, em vez de matá-los- Se as autoridades arregaçarem as mangas para finalmente fazer cumprir a lei, tenham a certeza de que nós, defensores da causa animal, ajudaremos a esterilizar todos estes cães que alimentamos nos nossos bairros”.