Sem que esteja a merecer grande destaque noticioso e diretos alarmistas constantes nas televisões, a situação nos serviços de urgência dos hospitais do país está a agravar-se. No passado fim-de-semana estiveram encerradas 13 urgências, seis no sábado e sete no domingo, e durante esta semana mais 16 fecharão. Entre eles os serviços de Ginecologia-Obstetrícia e Pediatria dos hospitais Amadora-Sintra, Barreiro, Vila Franca de Xira, Loures, Santarém e Garcia de Orta.
Os dados são do Serviço Nacional de Saúde mas foram compilados esta terça-feira pelo Diário de Notícias que noticia as denúncias dos médicos de que “quando março terminar e a maioria dos médicos atingir o limite de horas anuais imposto pela lei (150 horas), a situação ainda vai piorar mais”.
O jornal falou com os dois maiores sindicatos do setor e com um movimento de médicos sobre esta situação. A presidente da FNAM, Joana Bordalo e Sá, esclarece que a partir deste momento “tudo vai piorar, porque as urgências funcionam à custa do trabalho extraordinário dos médicos. E não há dúvida que a esmagadora maioria da classe atinge o limite de horas anuais no fim de março ou início de abril”.
Já os encerramentos deste fim-de-semana, têm “mesmo a ver com a falta de profissionais em geral nas áreas da Obstetrícia e Pediatria” e com a inação do governo de Luís Montenegro que “em 11 meses de governação, não conseguiu fazer nada, nem um acordo satisfatório, para ter mais médicos no SNS”.
A dirigente sindical vinca que a falta de médicos se faz sentir não apenas nas urgências mas também “em todos os serviços hospitalares, consultas e cirurgias, e nos centros de saúde”.
Também por isso, em comunicado divulgado esta segunda-feira, a federação sindical anunciou o prolongamento até 11 de maio da greve às horas extraordinárias nos centros de saúde. O objetivo principal é “impedir a banalização do trabalho suplementar nos Cuidados de Saúde Primários” e exigir “que se inicie e/ou acelere o processo de contratualização dos CSP nas ULS para 2025” porque “é através deste processo que se melhora o acesso dos utentes aos CSP com consultas presenciais, reforço da vigilância de doentes crónicos, resposta à doença aguda, garantia dos programas de vacinação, de rastreio, de diagnóstico precoce, da saúde materno-infantil, planeamento familiar e dos adultos”.
“Encerramentos são espelho da falta de vontade política e de competência deste Ministério”
O texto critica ainda a ministra Ana Paula Martins que, “num Ministério demissionário”, anuncia a intenção de transferir 174 centros para a gestão privada, “e deixa mais de 1,6 milhões de utentes sem médico de família”.
Joana Bordalo e Sá indica ainda que o Ministério não teve “um plano estratégico para trazer mais médicos para o SNS” e remata que “estes encerramentos não são mais do que o espelho da falta de vontade política e de competência deste Ministério em negociar”.
O secretário-geral do Sindicato Independente dos Médicos, Nuno Rodrigues, confirma estas situações e que “a partir de agora só vai piorar”. Ao contrário da FNAM, este sindicato assinou um acordo com o Governo que justifica como se tendo traduzido “em melhores condições remuneratórias e de trabalho para os médicos” e apresenta como solução possível para o encerramentos das urgências as “urgências metropolitanas” que já existem na região norte, garantindo que “os colegas estão satisfeitos e os utentes também” e que isso deve ser feito a par com uma valorização dos médicos do SNS.
O Movimento dos Médicos em Luta, um grupo que lançou o apelo há dois anos para os clínicos não fazerem mais horas extraordinárias para além das 150, afirma ao DN que, desta feita, os médicos não precisarão de nenhuma convocatória deste tipo para deixarem de fazer horas extra. Helena Terleira, uma das suas fundadoras, diz que “o desânimo é tão grande que os médicos continuam a sair do SNS” e que outros assim que podem deixam de fazer horas extras.
Esta médica fala em serviços a trabalhar nos limites, no arrastar de falta de condições para fixar mais profissionais no SNS e na destruição de “alguma esperança que ainda havia”, causada pelo anúncio do “regresso das Parceiras Público Privadas e o facto de os farmacêuticos poderem a vir a avaliar situações clínicas e a prescrever medicamentos”.