A autorização para pesquisa e prospeção de depósitos minerais nas freguesias de Alfarelos, Ega, Figueiró do Campo, Granja do Ulmeiro e Vila Nova de Anços, publicada em julho passado no Diário da República, alarmou a população de Soure, que alerta para os efeitos de uma tal exploração na contaminação das águas e do ar, pondo em causa a saúde pública e a qualidade de vida das populações, ameaçando igualmente o principal produto da região, o arroz carolino do Baixo Mondego, que obteve a classificação de Indicação Geográfica Protegida da União Europeia em 2015.
Esta terça-feira, Mariana Mortágua e Miguel Cardina, cabeça do Bloco pelo distrito de Coimbra às legislativas de 10 de março, participaram numa sessão pública cna Junta de Freguesia de Figueiró do Campo com a presença do movimento que contesta esta autorização. A coordenadora do Bloco classificou-a como "mais um negócio em que se vende o ambiente, o território, minérios que deviam manter-se no chão e que nunca ser explorados porque não trazem qualquer vantagem para a população".
O projeto é fazer ali "uma mina a céu aberto numa área de 600 campos de futebol", em que "o minério vai diretamente para uma empresa espanhola, não cria nenhum posto de trabalho em Portugal, não traz nenhuma vantagem para Portugal e vai deixar nesta região um rasto de destruição", resumiu a coordenadora do Bloco de Esquerda. A concretizar-se, aquela extração de caulinos, uma argila usada em indústrias como cerâmica, papel, tintas e plásticos, "vai destruir as culturas locais, a cultura de arroz, poluir o Mondego e todos os veios de água a provavelmente trazer problemas respiratórios de de saúde pública", prosseguiu.
Para Mariana Mortágua, Portugal já devia ter aprendido "que não podemos vender o nosso território, aquilo que temos de mais precioso, passar por cima de autarquias, da vontade das populações, em nome do favorecimento de meia dúzia de empresas estrangeiras que não deixam aqui ficar nada e só querem sugar os nossos recursos e ultrapassar todas as regras ambientais".
"Não pode haver uma economia sustentável sem respeito pela população e pelo ambiente. E por isso estamos aqui para assumir o nosso compromisso para que se trave a exploração de caulinos no concelho de Soure, como antes estivemos com a população da serra da Argemela para que se trave a exploração de lítio", afirmou a coordenadora bloquista aos jornalistas, considerando que "em Portugal reina a hipocrisia total em relação ao ambiente", com o Governo a dizer que tem uma política verde, mas que no final de contas "só serve para megacentros de energia renovável que dão muito dinheiro a ganhar a algumas empresas".
"Mas depois constroem-se resorts de luxo em zona protegida, há estufas e produções de abacate ou olival intensivo que esgotam os recursos de água e destroem a agricultura tradicional, como estamos a ver no Algarve, autorizam-se minas a céu aberto em zonas protegidas e perto de leitos de água que colocam as populações em risco".
Considerando que "toda a política ambiental deste Governo é uma promessa de negócio", Mariana Mortágua defende que é preciso travar esta forma de fazer política. "Portugal não está à venda. Seremos sempre um país pobre se não nos dermos ao respeito e se não soubermos respeitar o nosso povo, o nosso território, o ambiente e quem aqui vive", prosseguiu.
Mariana Mortágua questionou ainda a forma como estas prospeções tiveram luz verde contra a vontade do município e das populações, afirmando que "há um bloco central de interesses económicos, formado pelo PS com toda a direita, que favorece este tipo de negociatas que destrói o ambiente".
"Nem o PS nem toda a direita - PSD, IL, Chega - moveram uma palha para travar estes projetos. Pelo contrário, têm estado sempre a favor deste tipo de projetos de destruição ambiental em nome de milhões que depois vão para multinacionais", criticou a coordenadora do Bloco, insistindo que "é preciso acabar com o Simplex ambiental e os projetos PIN que permitem passar por cima de todas as leis. E nos casos em que a lei foi ultrapassada, e preciso travar essas explorações".
Exploração ameaça produção de arroz carolino e pista de remo usada em provas internacionais
Por seu lado, Jorge Góis, porta-voz do movimento contra a exploração de caulinos em Soure, disse aos jornalistas que o grupo nasceu quando "descobrimos em Diário da República o contrato entre a Direção Geral de Energia e Geologia (DGEG) com a empresa requerente". O ativista acusou a a DGEG de começar a ser "um Estado dentro do Estado", sem preocupação com as populações e os impactos junto dela e para o ambiente.
"Estamos numa zona que é de agricultura do arroz carolino, que é um símbolo nacional, e estamos prestes a destruir este desenvolvimento local que temos e é muito importante para esta região", lamentou Jorge Góis, apelando a que o projeto de exploração, ainda na fase de prospeção e pesquisa, possa ser travado.
Na região encontra-se também uma pista de remo que "é considerada uma das melhores da Europa e acolhe competições europeias e mundiais", com atletas a treinar ali diariamente. Caso a exploração avance, "torna-se inviável a prática do desporto com as micropoeiras que vão existir no ar", alerta.