Mariana defendeu o SNS, Montenegro os negócios das PPP

06 de fevereiro 2024 - 23:32

No debate entre Bloco e AD, Mariana Mortágua mostrou como a grande proposta da direita para a saúde são cheques cirurgia que nada resolveram. Na habitação, acusou Montenegro de apresentar "uma política de especulação”. Defendeu a subida dos salários e criticou a proposta das borlas fiscais do PSD à banca, grande distribuição e energia.

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Debate entre Mariana Mortágua e Luís Montenegro

O primeiro debate eleitoral destas eleições legislativas com a presença do Bloco de Esquerda aconteceu na noite desta terça-feira. Num frente a frente com Luís Montenegro, que não apresentou o seu programa eleitoral antes de ir aos debates na televisão, Mariana Mortágua confrontou o líder da direita com as suas apostas no privado contra o público.

Açores, saúde, habitação e salários foram os temas lançados para cima da mesa pela moderadora. Sobre o primeiro, a dirigente bloquista começou por destacar que o Bloco se mantém como a quarta força política da Região Autónoma e foi “a principal oposição a um governo de direita que teve consequências devastadores para os Açores com aumento da pobreza, com aumento do número de lugares distribuídos” que foi um “recorde face aos anteriores governos”.

Na questão da saúde, a porta-voz do Bloco contrapôs que o partido “defende soluções” enquanto que “o PSD defende o agravamento dos problemas”. Lembrou a este propósito que Portugal já tem “um enorme peso do setor privado na saúde” e “é por isso que pagamos uma das saúdes mais caras da Europa” e acusou o PSD de querer “uma saúde mais cara e pior para as pessoas”.

Apesar de a coligação da direita não ter ainda apresentado o programa eleitoral, a “grande proposta” que tem para o setor é o cheque cirurgia. Este, recordou “existe há dez anos e as filas de espera só aumentaram”. Para além disso, “88% das pessoas” rejeitam-no.

Mariana Mortágua trouxe ainda outro dado: “a maior parte das queixas são do portal de queixas da saúde” são por atrasos no privado. Assim, “se todos os doentes fossem enviados para o privado”, este “não teria resposta” ou então “para resolver o problema das filas de espera” recorreria a médicos do SNS. Assim, “o Estado estaria a pagar ao privado” para este “retirar médicos do SNS” fazendo com que aí aumentassem as filas de espera.

Quando o líder do PSD tentou colar o Bloco à governação do PS, a coordenadora bloquista invocou o conflito que o partido teve com o PS sobre o tema. Do lado da direita, a “única solução” confirmada pelas respostas de Luís Montenegro “é que as pessoas recorram mais ao privado”. O Bloco pretende, por seu turno, contratar mais médicos para o SNS e “a única forma é o regime de exclusividade” destes profissionais.

Questionada sobre as Parcerias Público-Privado na Saúde, a porta-voz do Bloco lembrou que o Tribunal de Contas já deixou escrito que "as PPP tinham uma performance pior ou igual ao sistema público com muito mais custo”. Exemplificou com os casos da PPP de Cascais, na qual o Grupo Lusíadas foi acusado de “reportar de forma fraudulenta a gravidade das doenças para receber mais financiamento”, da de Vila Franca de Xira que “pagou multa porque internava os doentes em casas de banho e refeitórios”, da de Amadora-Sintra onde o Grupo Mello “faturava exames complementares de diagnóstico e receitas médicas que nunca foram realizadas”, tendo o Tribunal de Contas considerado que se tratava de “uma burla”. Montenegro, por sua vez, defendeu o modelo e os resultados dos grandes grupos económicos que o sustentam.

Ainda sobre este tema, a dirigente do Bloco trouxe à baila as propostas do partido sobre incentivos aos profissionais da área, para reduzir horas extra e para dar autonomia aos hospitais.

"Não há coisa mais extremista e radical do que uma renda de 1.500 euros por um T1 em Lisboa"

De seguida, foi levantada a questão da habitação na qual o Bloco voltou a começar por um exemplo da governação de direita, desta feita a da Região Autónoma da Madeira. Aí, “os dados são brutais”: “40% de aumento dos preços” da habitação no último ano no Funchal que tem “toda a marca de governação do PSD”.

Mariana Mortágua acrescentou que Portugal é “o terceiro país do mundo com os preços mais caros da habitação” e que “tudo o que o PSD tem para apresentar é uma política de especulação, de selva no arrendamento”, com Montenegro a propor mais incentivos aos construtores e promotores imobiliários privados e a acusar a coordenadora bloquista de querer "uma nova Cuba ou Venezuela" por causa daa proposta de limitar o preço máximo das rendas. "Não há coisa mais extremista e radical do que uma renda de 1.500 euros por um T1 em Lisboa", respondeu-lhe Mariana.

Em alternativa, o Bloco defende “regras para aumentos das rendas”, o que existe em “metade dos países da OCDE” e “13 países da União Europeia”, o que é “do mais elementar bom senso”, assim como baixar os juros dos empréstimos. O partido propõe que a Caixa Geral de Depósitos baixe a sua taxa de juro ou de spread em 1,5% em todos os créditos, uma proposta “realizável” e que “cabe nas contas da Caixa”.

Com Montenegro a repetir a mesma manobra de tentar encostar o Bloco ao PS, responsabilizando-o assim pela crise na habitação, Mariana Mortágua retorquiu expondo as responsabilidades do PSD na crise habitacional nomeadamente na sua lei das rendas que “expulsou os idosos” e “esvaziou as cidades” e no envio de “uma equipa de ministros à Rússia para reunir com a oligarquia de Putin para vender vistos gold”. A este propósito sublinhou que foi a direita que votou com o PS nos vistos gold e benefícios fiscais a residentes não habituais. A conclusão da dirigente bloquista é, assim, que “para Luís Montenegro, o Estado só serve para uma coisa: é para garantir lucros do privado e lucros da especulação”.

O último tema foram os salários e impostos. Com o Bloco a defender um aumento salarial porque “o salário deve pagar imposto e segurança social” e a “democracia construiu-se neste sistema” e Mariana Mortágua a acusar o PSD a não ter “nenhuma proposta para aumentar salários”, mas apenas uma proposta parecida com a da confederação patronal que é um “engodo” em que “se está a abdicar de uma receita fiscal e quando vamos a ver o aumento salarial não existe, é facultativo” e a empresa só paga esse prémio isento de contribuições se quiser.

Mariana Mortágua criticou ainda a proposta da AD de uma redução de IRC que praticamente só se aplica à banca, grande distribuição e energia. Num país em que “5% da população tem metade da riqueza”, a coordenadora bloquista diz que a direita quer agravar a desigualdade, e relembrou a máxima de Luís Montenegro nos tempos da troika: “a economia está melhor, as pessoas estão pior”. E contrapôs que o Bloco quer “uma economia justa, em que quem tem mais lucros dá um contributo”.