Governante da troika, fanática da austeridade, autora de negócios ruinosos, predadora do Estado e da Segurança Social, saída do governo para o maior fundo abutre que parasitou a economia portuguesa naqueles anos. Já não se lembrava de Maria Luís Albuquerque? Vale a pena recordar o percurso, entre política e negócios, da nova comissária europeia indicada por Luís Montenegro.
Licenciou-se em universidade privada, na Lusíada de Lisboa, em 1991, e tornou-se mestre no Instituto Superior de Economia e Gestão já quase no final da década. Maria Luís Albuquerque foi fazendo a sua carreira pela economia na Direcção-Geral do Tesouro e Finanças e no Gabinete de Estudos e Prospectiva Económica, mas também na Rede Ferroviária Nacional e chegou a coordenar um núcleo no Instituto de Gestão da Tesouraria e do Crédito Público.
Foi cabeça de lista do PSD em Setúbal, em 2011. Acabou por ser puxada para a pasta de Ministra de Estado e das Finanças por Passos Coelho, em 2013, substituindo Vítor Gaspar e continuando a política deste, impondo a austeridade e aumentando as desigualdades económicas e sociais do país.
Foi sob Maria Luís Albuquerque que foram concluídas as ruinosas privatizações da Rede Elétrica Nacional, da EGF, da EDP e da ANA, um processo de desmantelamento das empresas públicas que já tinha sido começado com Guterres (Albuquerque já tinha desempenhado funções de assessoria ao Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças deste primeiro-ministro em 2001).
Um caso de porta giratória
Depois de contribuir para o aprofundamento da crise económica vivida em Portugal, à saída do governo Albuquerque foi contratada em 2016 pela Arrow Global, o fundo abutre que na altura liderava a compra de crédito malparado em Portugal. Na porta-giratória, a ex-Ministra da austeridade era contratada por uma das empresas que mais lucrava com a desgraça da economia e das famílias endividadas. O fundo Arrow negociava com os depojos do Banif falido e lucrava com o processo que Maria Luís Albuquerque tinha aplicado na resolução do banco.
Face a essa atitude, o Bloco de Esquerda voltou a propor nesse ano a alteração ao regime de titulares de cargos públicos, dedicada particularmente a Maria Luís Albuquerque.
Aliada da Alemanha em defesa da austeridade europeia
Em 2015, pediu a Wolgang Schäuble, então ministro das Finanças da Alemanha, para não ceder nas negociações do Eurogrupo sobre a Grécia, que se encontrava em crise.
Albuquerque tentou desmentir a notícia, mas o ministro das Finanças grego da altura, Yanis Varoufakis, não deixou de lamentar que os governantes portugueses tenham sido “mais alemães do que a Alemanha” na defesa da política de austeridade europeia.
Mais recentemente, Maria Luís Albuquerque apresentou o livro Um Século de Escombros do deputado do Chega Gabriel Mithá Ribeiro, livro esse que tem dedicatória a Donald Trump, Jair Bolsonaro, à Nova Direita Europeia e ao povo de Israel. Na apresentação a economista dramatizou um "espírito inquisitorial em que as pessoas são vigiadas e denunciadas" cuja culpa atirou para cima "da esquerda portuguesa".
Com a sua indicação para comissária europeia, Maria Luís Albuquerque regressa a funções onde contribuirá para o desinvestimento no Estado social, bem como para a longa lista de governantes promíscuos com os negócios que passaram pela Comissão Europeia.
Em declarações à imprensa, o líder do grupo parlamentar do Bloco de Esquerda, Fabian Figueiredo, lembrou que a ex-Ministra foi uma "agente da troika no Governo" que "justificou cortes salariais, cortes das pensões, a desconstrução do Estado Social" e que "legitimou a visão política do centro europeu, que achava que a crise das dívidas soberanas se resolveria empobrecendo as pessoas".